Direito da UFSC forma primeiro mestre indígena a ingressar com ações afirmativas
O estudante Jafé Ferreira de Souza, conhecido como Jafé Sateré-Mawé, tornou-se mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina nesta segunda-feira, 28 de julho, após defesa pública e aprovação da dissertação Sehay Koro: O pluralismo jurídico e as normas costumeiras penais do Povo Sateré-Mawé (Amazonas) enquanto ordenamento jurídico não estatal. A banca contou com a avaliação do secretário-executivo do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Luiz Henrique Eloy Amado, conhecido como Eloy Terena, indígena do povo Terena em Aquidauana (MS), doutor em Ciências Jurídicas e Sociais, dos professores Antonio Carlos Wolkmer e Arno Dal Ri Junior e da professora Camila Damasceno de Andrade. A orientação foi do professor Diego Nunes.
Jafé é o primeiro estudante indígena do Programa de Pós-Graduação em Direito a ingressar no mestrado por meio de ações afirmativas para indígenas. A dissertação é um aprofundamento do estudo desenvolvido pelo estudante no trabalho de conclusão do curso de Direito, apresentado na UFSC em dezembro de 2022. Ele também tem protagonismo na articulação da Associação dos Estudantes Indígenas da Universidade, sendo um dos fundadores desse coletivo.
O mestrado teve como tema o Direito Penal, investigando subjetividade e historicismo. “O trabalho discorre sobre como funciona o sistema penal indígena do povo Sateré-Mawé e também abre uma margem para os demais povos indígenas do Brasil”, explicou, fazendo menção ao fato de a conquista ser parte de um esforço coletivo. “A dinâmica da pesquisa traz à tona o conhecimento tradicional indígena do povo originário do Amazonas, do Brasil, para a academia. Na academia, encontra respaldo com outros autores e teóricos”, resume.
Segundo o pesquisador, a ideia foi dialogar com os sistemas penais iluministas do ponto de vista do direito ocidental. “A gente constrói balizas específicas para a administração de justiça, que pode ser usada nos tribunais, nas decisões, nas sentenças”, reforça. Além disso, o estudo também trabalha com o reconhecimento do pluralismo jurídico, aspecto reforçado pelo orientador. “Foi muito rico porque ele conseguiu trazer para nós não apenas as diferenças, as quais a gente já esperaria, mas também os possíveis pontos de contato, na perspectiva de diálogo”.
Graduado em Direito também pela UFSC, Jafé considera que a Universidade é, em sua trajetória, mais que uma instituição de ensino: “Ela é um território de luta, de resistência e de construção coletiva. Foi aqui que encontrei espaços para refletir criticamente sobre minha identidade, minha comunidade e os desafios que enfrentamos como povo indígena. Ao mesmo tempo, foi na UFSC que compreendi a potência do diálogo entre diferentes saberes, a importância de ocupar os espaços institucionais sem abrir mão daquilo que somos”, ressalta.
Agora mestre, mas já pensando na continuidade dos estudos, Jafé enfatiza também que a Universidade lhe proporcionou oportunidades concretas de formação, mas sobretudo a chance de “sonhar junto com outros parentes, indígenas de diferentes etnias, com histórias distintas, mas com o mesmo desejo de transformar a realidade. É nesse chão acadêmico que pude desenvolver uma pesquisa que fala de nós, para nós, e por nós, e que contribui para o fortalecimento das nossas lutas em defesa da vida, do território e da justiça”.
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