Um projeto em desenvolvimento na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) tem como foco mapear os impactos da pandemia de Covid-19 nas normas jurídicas brasileiras, estritamente aquelas referentes aos direitos fundamentais. Idealizada e coordenada pela professora Grazielly Alessandra Baggenstoss, do Departamento de Direito do Centro de Ciências Jurídicas (CCJ), a pesquisa tem como proposta examinar os projetos de alterações de lei e suas fundamentações que pretendam alterar os direitos fundamentais durante o período de enfrentamento ao novo coronavírus.
Intitulada A pandemia do covid-19: mapeamento dos primeiros impactos sociais no contexto brasileiro e regional-sul, a pesquisa é realizada pelo Lilith: Núcleo de Pesquisas em Direito e Feminismos e tem previsão para ser desenvolvida em um ano. Segundo Grazielly, o projeto pretende realizar a coleta de dados sobre os impactos das alterações ocorridas no meio social, especialmente com os grupos vulnerabilizados. “Assim, observamos a eficácia, na comunidade, da norma jurídica que foi alterada”, afirmou.
A professora ressalta que, desde 2016, o Núcleo de Pesquisas debruça-se a investigar o tensionamento entre o que está estabelecido na legislação e o que acontece na realidade, especialmente a partir de narrativas da comunidade, como a verificação sobre eficácia das políticas públicas para as mulheres. Em meados de março deste ano, após anúncio do estado pandêmico e da suspensão das aulas presenciais na UFSC, Grazielly iniciou o levantamento sobre os direitos fundamentais atingidos por essas alterações e sobre as decisões políticas de proteção às comunidades vulneráveis.
De acordo com a docente, essa primeira etapa da pesquisa foi de cunho individual. “Os dados foram coletados de fontes estatais e midiáticas, de pesquisas que já vinham sendo realizadas e de manifestações de pessoas de determinadas comunidades vulneráveis. No mesmo intento, questionei-me em como explicar tais alterações para o corpo discente do Direito. Assim, pensei em articular a pesquisa com algumas definições básicas de Teoria Política para a minha turma dessa disciplina, de primeira fase, e associar com outros temas desenvolvidos em outras disciplinas, para aproveitamento também pelas minhas outras turmas”, explicou.
Após o primeiro mês de produção de conteúdo pela coleta de dados, o resultado dessa iniciativa foi a publicação do relatório inicial de pesquisa. Apresentado ao Lilith, o projeto inspirou outras pesquisadoras a aprofundarem determinados direitos fundamentais trabalhados no material. Assim, tornou-se uma pesquisa coletiva, envolvendo pesquisadoras no Núcleo, vinculadas à UFSC, e profissionais externos também, que estão alinhados metodologicamente à pesquisa. O Núcleo trabalha atualmente com seis temáticas relacionadas a direitos fundamentais nesse contexto: Direito de Trabalho de Exceção; Violência contra Mulheres; Atuação do Ministério Público do Trabalho; Maternidade; LGTBQI+ e Direitos Reprodutivos.
De modo geral, o trabalho segue um padrão de procedimento de (a) alinhamento metodológico, condizente com planejamento no sentido da pesquisa coletiva, estruturação dos procedimentos da pesquisa, especialmente formas de coleta de dados (as possibilidades dentro do contexto da pandemia) e de discussão dos resultados; (b) etapa de revisão bibliográfica; (c) realização da coleta de dados; e (d) discussão dos resultados. A professora ressalta, entretanto, que a pesquisa coletiva desdobra-se em temáticas e, dependendo da categoria trabalhada e das possibilidades e procedimentos, apresenta tempo e etapas diversas.
Grazielly Baggenstoss destaca que o projeto tem o condão principal de apresentar as vulnerabilidades ressaltadas no contexto pandêmico, tendo em vista que o âmbito jurídico existe para subsidiar a vida digna em sociedade. “Ou seja: o Direito, assim como o próprio Estado, possui natureza instrumental, cuja finalidade é o bem viver da comunidade. Nesse sentido, direcionada ao Estado brasileiro, os resultados das pesquisas são fundamentais fontes de como melhorar as políticas públicas; e, direcionada à comunidade, são relevantes na apresentação de seus direitos básicos e das possibilidades de reivindicação na seara política e judicial”, finaliza a professora.
Maykon Oliveira/Jornalista da Agecom/UFSC