Em meados de 2017, uma questão em sala de aula incomodou o professor do Departamento de Sociologia e Ciência Política da UFSC Raúl Burgos: o que sabemos sobre a China? Mesmo com a emergência da China no cenário internacional, eram poucas conexões, isoladas, envolvendo o país asiático na UFSC. Com esta insatisfação latente, ele conversou com o professor Vladimir Pomar, estudioso do país asiático, que reclamou: “Há quinze anos estou tentando que alguém preste atenção a este ponto”. A partir disto começaram os contatos que resultaram na fundação do Instituto de Estudos sobre a China da UFSC (Ichin), em 4 de dezembro de 2019, cujos objetivos são desenvolver estudos sobre a China e promover relacionamentos de intercâmbio e cooperação da UFSC com as universidades chinesas.
Nesta sexta-feira, 29 de setembro, o Ichin promove a palestra “Made by China 2025: Implicações na Indústria Agropecuária, Emprego e Salários no Brasil”, apresentada por Vladimir Milton Pomar, juntamente com o lançamento de seu livro “O Sucesso da China Socialista”. O evento irá lembrar os 74 anos da fundação da Republica Popular da China e será realizado às 16h, no mini auditório do Bloco E, localizado no Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFH). De acordo com Pomar, será “uma apresentação sucinta do que é a China hoje e da necessidade do Brasil se apressar na definição de uma estratégia nacional para lidar com a China e constituir um núcleo operacional de gente que entenda do país”. 
Pomar lista as vantagens de trabalhar em parceria com instituições chinesas: “Estar no país que é hoje uma das cinco maiores potências mundiais (econômica, comercial, científica, tecnológica e em inovação). Por isso, ter a oportunidade de conviver na China com pesquisadores de dezenas de países e acesso ao que há de mais moderno, em todas as áreas. Além disso, de dispor de recursos financeiros que talvez no Brasil não sejam possíveis”. Ele cita o diferencial do relacionamento: “Se as instituições chinesa e brasileira já têm um histórico de ações conjuntas, as coisas podem andar em maior velocidade e com muito mais perspectivas”.
Interdisciplinaridade
Antes mesmo da fundação do Ichin, as primeiras reuniões para formatar a organização interdisciplinar ocorreram e resultaram numa entidade com estatuto e regimento interno estabelecidos. O Ichin tem definidas diversas coordenadorias, incluindo pesquisa, assuntos estudantis, parcerias institucionais e cultura e língua chinesa. O coordenador geral é Raúl Burgos enquanto o vice é o professor do Departamento de Engenharia Mecânica Daniel Martins.
A diversidade e a multiplicidade de pontos de vista observados no Ichin são propositais, explica Burgos: “O interesse é extremamente aberto. Nós fundamos o Ichin, com o intuito de que na UFSC possamos reverter uma tendência histórica de não prestar atenção não apenas à China, o nosso foco, mas à Ásia como um todo. Queremos entender a China”. A aceitação de diferentes pontos de vista sobre o país é inerente ao Ichin, e no chamamento de interessados “vieram diversas perspectivas, algumas mais simpáticas à experiência chinesa, outras com um pé atrás, mas querendo investigar”, comenta o coordenador do Ichin. “O interesse é estudar, não é sustentar uma ou outra posição pré-concebida. Sempre que se estuda rigorosamente, com contraste de fatos e evidências, você encontra diversíssimas visões sobre a China, algumas muito críticas, mas o que ninguém nega é a importância estratégica dos estudos sobre esse país. Você pode ter a opinião que quiser, mas não deixar de lado o papel que a China tem no mundo hoje. Ela caminha para ser a primeira potência mundial em termos econômicos, e já é em alguns critérios”, relata Burgos.
Salto em pesquisas
O coordenador do Ichin destaca a curva de ascensão chinesa em termos acadêmicos e científicos: “É um avanço em escala logarítmica. A China é uma potência do mundo em papers e patentes. Não se freia mais, não dá para voltar mais ao ponto anterior”. Ele comenta que o tempo da China como fonte de bugigangas de baixa qualidade e mão-de-obra barata “já era. Foi muito veloz o processo de transformação em qualidade. O volume de estudantes e pesquisadores, especialistas chineses que se formaram em outros países e voltaram, a criação de institutos de pesquisa e tecnologia é quase impossível de mensurar. São em torno de três mil universidades na China, várias entre as melhores do mundo há muito tempo”.
Um exemplo da potência tecnológica e financeira da China citado por Burgos é o desenvolvimento de chips. “É impossível fazer que se pare a evolução de tecnologia. Porque quando vetam o ingresso de chips (americanos na China), os chineses colocam cem institutos a pesquisar e trazem técnicos do mundo inteiro, oferecendo altíssimos salários para pesquisar cada passo desta tecnologia. Fazem de uma proibição o impulso para o desenvolvimento”, analisa Burgos. Por exemplo, no final de agosto, a empresa Huawei lançou o telefone Mate 60 Pro, smartphone top de linha, que utiliza um chip feito com processo de 7 nm, da empresa SMIC.
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