Turismo impacta a alimentação de famílias rurais em Santa Catarina, diz estudo da UFSC

11/04/2024 15:50

Professor coordena pesquisa que fornece subsídios para políticas públicas sobre segurança alimentar

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Pesquisadores da UFSC estudam o impacto do encarecimento de alimentos na dieta de famílias do interior de Santa Catarina. Ilustração: Laura Araújo/NADC/UFSC

“Artesanal”, “típico” ou “gourmet”. Na tentativa de atrair consumidores, diferentes adjetivos contam histórias e agregam conteúdo simbólico aos alimentos, mas também aumentam seu preço. O custo pode ser elevado a ponto de torná-los inacessíveis até mesmo para quem tradicionalmente os produz. É o caso de Timbé do Sul, município do sul de Santa Catarina, cujos agricultores não conseguem reter para o consumo doméstico o próprio queijo produzido devido à alta demanda do setor turístico.

“A substituição da agricultura pelo turismo traz consequências importantes na dieta das famílias rurais”, explica Clécio Azevedo da Silva, professor do Departamento de Geociências da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e pesquisador sobre o tema dos regimes alimentares. “Elas acabam se tornando compradoras de alimentos [apesar de produzi-los]”.

Os resultados do estudo coordenado por Clécio fornecem subsídios para o fortalecimento de políticas públicas voltadas à alimentação, como a Política Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) – além de reforçar a necessidade de aplicá-las, já que não há um sistema de fiscalização sobre elas.

A criação de espaços de segurança alimentar e nutricional é especialmente importante para contextos mais propensos a vulnerabilidades, como os pequenos municípios, afirma a estudante Tainara de Souza, do curso de Graduação em Geografia da UFSC. Timbé do Sul é vizinha de Praia Grande, a “capital dos cânions” famosa pelo destino turístico dos geoparques. Situados na mesma região sul de Santa Catarina, somam pouco mais de 12 mil habitantes.
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UFSC vai mapear diversidade em museus brasileiros e propor novas políticas de documentação

29/11/2023 15:48

Política cultural é inédita no país e contribui para o acesso a patrimônios diversos; acordo com o Instituto Brasileiro de Museus deve ser fechado até final de 2023, diz coordenadora

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Acervo da exposição Franklin Cascaes – Artista no Museu de Arqueologia e Etnologia (MArquE/UFSC). Foto: Rafaela Souza.

Uma pesquisa de impacto nacional, com previsão de início a partir de 2024, resultará de parceria inédita entre a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). Sob coordenação das professoras Renata Padilha e Thainá Castro, do curso de Museologia, o projeto pretende desenvolver padrões para a documentação museológica nacional e diagnósticos sobre a diversidade étnica, racial e de gênero do acervo brasileiro. Trata-se de uma iniciativa pioneira no país, com duração de 18 meses.

O estudo atualiza e amplia o escopo de uma resolução normativa de 2014 do Ibram –  revogado em 2021, o documento estabelecia elementos para a descrição dos acervos museológicos. “Agora, vamos pensar formas de representação a nível nacional e com tipologias variadas”, explica Renata.
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Como as fake news ganham tanta atenção? Professor da UFSC explica

16/10/2023 19:53

Preconceito interfere sobre quem é visto como bom informante; minorias sociais sofrem “injustiças epistêmicas”

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Distinguir notícias verdadeiras de falsas é uma tarefa quase “sherlockiana”, afirma Alexandre Meyer Luz. Ilustração: Rafaela Souza.

“Não dá para ser Sherlock Holmes o tempo inteiro”. O famoso personagem da literatura britânica é uma metáfora utilizada por Alexandre Meyer Luz, professor de Filosofia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), para se referir ao ser humano ideal: aquele que sabe avaliar a qualidade de uma informação.

Diferenciar fake news de notícias verdadeiras tornou-se uma competência quase “sherlockiana”. Mas o cidadão comum não tem o mesmo tempo de um detetive para investigar a origem de todas as histórias que recebe diariamente por aplicativos de mensagem. Segundo Meyer, outro tipo de ingrediente explica por que concedemos mais ou menos crédito a alguns informantes. São os pressupostos de confiança, o que inclui desde as relações com parentes próximos (pais, por exemplo) até mecanismos sociais (como os preconceitos de racismo, machismo e LGBTfobia).

Meyer é professor na área de Epistemologia, ramo da Filosofia dedicado aos estudos sobre a produção do conhecimento. Sua pesquisa adiciona complexidade aos modelos epistêmicos reduzidos à figura do indivíduo racional e que não é atravessado por emoções. “Na Filosofia, sempre fazemos algum grau de abstração”, afirma. “Mas quando queremos pensar sobre assuntos muitos ‘encarnados’, como fake news e educação, a abstração não pode criar modelos que não respeitam como as pessoas de fato pensam”. 
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Que efeitos as queimadas em Santa Catarina têm sobre os peixes e a vida humana?

27/04/2023 16:18

Pesquisa desenvolvida no Laboratório de Biodiversidade Aquática da UFSC investiga o impacto do fogo e das cinzas na vida aquática e de seres humanos 

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Foto: Reuters/Amanda Perobelli

 

Somente em 2022, Santa Catarina teve 1.360 focos de incêndio ativos de fogo, sendo agosto o mês de maior incidência, segundo levantamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). No Brasil, as queimadas são um problema constante: entre 1986 e 2020, segundo dados do projeto MapBiomas, uma área de 1,67 milhões de km² do país sofreu com o fogo: esse tamanho é maior do que a extensão dos países da Noruega, Finlândia e Islândia junto.
Em dados locais, Santa Catarina também é bastante afetada. O Parque Estadual do Rio Vermelho, por exemplo, possui uma unidade de conservação de proteção integral, que sofreu constantemente com queimadas nos últimos anos. Em abril de 2020, um incêndio chegou a comprometer 240 hectares do parque.

Enquanto os efeitos do fogo e das cinzas residuais sobre o solo e os organismos terrestres começam a ser mais amplamente explorados, ainda é limitado o número de estudos que avaliam como a biodiversidade do ambiente aquático responde à ocorrência de fogo e à chegada das cinzas à água. “Ano após ano, o ser humano tem registrado números recordes de incêndios, em áreas queimadas cada vez maiores, e eu sempre penso: essa quantidade imensa de cinzas que é gerada uma hora vai chegar no ambiente aquático, seja por ação da chuva ou do vento”, explica o professor Bruno Renaly Souza Figueiredo, do departamento de Ecologia e Zoologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Aprovado no edital de chamada pública de 2021 da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (FAPESC), no programa de jovens projetos, o professor conseguiu os primeiros recursos para dar início à pesquisa: “Impacto do fogo e das cinzas sobre a biodiversidade na água doce: respostas dos peixes, dos anfíbios e dos microinvertebrados e macrófitas ao distúrbio”.

4 impactos das queimadas em Santa Catarina

As queimadas naturais ocorrem em áreas secas, predominantemente em clima árido ou semiárido. O estado de Santa Catarina está localizado em uma região historicamente chuvosa e úmida, entretanto, os períodos de estiagem no estado estão cada vez mais longos e com o registro de temperaturas cada vez mais elevadas. Como resultado a vegetação resseca, e o fogo tem mais chance de ocorrer e de se propagar, atingindo vastas áreas.

Aliado a isso, o ser humano tem provocado  uma maior quantidade de incêndios, de maneira deliberada ou acidental, tais como a queimada ilegal realizada para supressão da vegetação e limpeza de áreas, o fogo ateado na agricultura para facilitar a colheita ou na preparação do solo para a semeadura, e até mesmo após a queda de fios de transmissão de eletricidade alta tensão sobre a vegetação seca. Seja qual tenha sido a origem do fogo, ela terá consequências negativas para a biodiversidade dos ambientes terrestres e aquáticos, e mesmo para o ser humano.

1. O estado já registrou 124 focos ativos de fogo em 2023

Segundo os dados do INPE detectados por satélite, Santa Catarina registrou no total 124 focos ativos de fogo nos últimos três meses: 35 em janeiro e fevereiro, e 54 em março. Isso provavelmente se deve às mudanças climáticas que tem levado a estações secas mais longas e com o registro de temperaturas mais elevadas. Mas certamente, também está relacionada com o uso do fogo na agricultura: “É uma prática agrícola muito comum no Brasil, inclusive existe uma lei para proibi-la, mas ela ainda ocorre”, esclarece o professor Bruno Figueiredo. 

Os prejuízos das queimadas envolvem a retirada de nutrientes fundamentais do solo para o crescimento das plantas, desencadeamento de processo erosivo, aumento da liberação de dióxido de carbono e até mesmo a destruição de habitats naturais.

2. As cinzas do fogo prejudicam a biodiversidade aquática

 

O principal objetivo da pesquisa desenvolvida no Laboratório de Biodiversidade Aquática (LABIAQ) é investigar como as cinzas oriundas das queimadas afetam diretamente a biodiversidade em rios e riachos. As cinzas podem chegar até a água, principalmente por ação da chuva, que lava o solo e pode carrear as cinzas, e pelo vento.

O professor comenta que a cinza pode matar: “a literatura científica tem revelado que as cinzas são uma substância complexa constituída por componentes químicos, como os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos e metais pesados, com potencial mutagênico e cancerígeno, que compromete a potabilidade da água para consumo humano, leva a uma grande mortandade de peixes, e reduz as contribuições da natureza para as pessoas.” 

Ilustração que mostra o impacto das cinzas tanto na vegetação, quanto na biodiverside de águas continentais, realçando que organismos grandes, como peixes e mesmo a microbiota aquática pode ser extinta após a ocorrência de incêndios. Arte: Lorenzo Driessen Cigogini

3. Causa a morte de peixes – e o desaparecimento de espécies nativas

Resultados preliminares do estudo do professor Bruno mostram que, em experimentação laboratorial, as espécies nativas de peixes presentes em rios e riachos são mais impactadas que as espécies exóticas invasoras. Esse resultado indica que a chegada de cinzas na água após um incêndio provoca a morte dos peixes nativos, mas não impacta fortemente as espécies exóticas invasoras, ameaçando a conservação da biodiversidade nativa. 

O professor Bruno Renaly Souza Figueiredo é graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), e mestre e doutor pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). (Foto: Ana Quinto)

O professor explica que “geralmente, as espécies exóticas que são introduzidas nos rios e riachos do Brasil, são espécies nativas de outras regiões que possuem uma maior tolerância a alterações nas características ambientais”. O professor exemplifica que “a tilápia, por exemplo, é nativa do rio Nilo no Egito, e é muito resistente, e essa é uma das razões pela qual as pessoas a introduziram no Brasil”. Dessa maneira, como as espécies invasoras sobrevivem, elas começam a se reproduzir, e reduzem as chances das nativas retornarem ao ambiente.

4. As cinzas causam células tumorais nos peixes

“A gente verificou um resultado intrigante, que é o número de células com alterações genética em peixes expostos às cinzas. Para mim, isso acendeu uma luz de alerta importante: pois se as cinzas tem a capacidadede impactar os peixes, elas também pode fazer o mesmo com o ser humano que ingere uma água contaminada com partículas de cinzas ou ainda que se alimente de um peixe que viveu nessa água contaminada”, explica o professor Bruno. A acumulação de metais pesados e a presença de componentes mutagênicos, e potencialmente também cancerígenos, nos peixes tem impactos ainda incertos sobre os indivíduos que consomem esses animais contaminados. Futuras pesquisas no laboratório coordenado pelo prof. Bruno irá investigar esse tema.

A importância do estudo desenvolvido é fundamental para entender de que maneira as cinzas interferem na biodiversidade aquática e como esses fatores chegam até nós: “pode ser que os metais pesados nos tecidos dos peixes acabem também sendo acumulado por quem se alimenta dos peixes dessa região contaminada por cinzas”, esclarece.

Para expandir a pesquisa, é necessário financiamento

A primeira etapa da pesquisa será finalizada em novembro de 2023: o projeto, atualmente, conta com o trabalho de dois bolsistas de iniciação científica da UFSC, três estudantes extensionistas, um mestrando e dois doutorandos. As saídas de campo promovidas pelo grupo buscam capturar os organismos que vivem em rios e riachos do estado de Santa Catarina, para realizar os estudos experimentais que analisam a toxicidade das cinzas sobre a biodiversidade de água doce. Com três estudos planejados, o objetivo é analisar a ecotoxicidade nos peixes invertívoros (aqueles que se alimentam de invertebrados); nas espécies nativas e invasoras de girinos; e na dinâmica populacional de microinvertebrados. 

O grupo de pesquisa realizando estudo de campo para as abordagens experimentais (foto: Arquivo pessoal)

 

Além do caráter científico, a pesquisa possui pretende envolver também a comunidade escolar e a sociedade civil: “Além da divulgação dos resultados para órgãos ambientais, a gente vai fazer esse trabalho em escolas, para realizar uma educação ambiental sobre as consequências ambientais do uso do fogo e geração cinzas para a biodiversidade que vive na água e mesmo para o ser humano”.

Também está prevista a realização de um workshop específico para gestores públicos da área ambiental, para apresentação dos resultados das pesquisas que avaliaram os impactos das cinzas sobre a biodiversidade e os riscos potenciais à saúde humana. “No nosso projeto, temos servidores do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), até para termos essa conversa com o poder público e o órgão de proteção ambiental”.

Com a conclusão do edital da FAPESC, o grupo de pesquisa busca um novo aporte para continuar a realizar os trabalhos. Em uma segunda etapa, seria possível aprofundar os estudos por meio da aquisição de equipamentos apropriados para análises mais específicas. Atualmente, a pesquisa só tem conseguido êxito porque o laboratório de biodiversidade aquática da UFSC tem feito cooperação com outros laboratórios da UFSC, de outras Universidades Públicas do país (como UFPR, UFSCAR e UEM) e do exterior (como Universidade de Aveiro, em Portugal e Rhodes University, na África do Sul), viabilizando a condução da atual pesquisa.

Entretanto, é importante o fortalecimento do laboratório na UFSC, para que a equipe possa, de maneira independente, analisar os efeitos da presença de poluentes na água, como as cinzas para a potabilidade da água e os organismos que nela vivem: “no momento, a gente tem estudado as cinzas de queimadas, mas as cinzas podem ser geradas a partir de outros processos, como resíduo na produção de carvão, que é uma atividade localmente importante.” Assim, pesquisas podem ser realizadas para entender o principal dano relacionado as cinzas de carvão, com o objetivo de reduzir o impacto ambiental, aliando economia e ecologia.

Sobre o pesquisador

Bruno Renaly Souza Figueiredo é professor do Departamento de Ecologia e Zoologia (ECZ) da Universidade Federal de Santa Catarina. É graduado em Ciências Biológicas, e mestre e doutor pelo programa de Pós-graduação em Ecologia de ambientes aquáticos continentais. Suas pesquisas envolvem estudos de ecotoxicologia aquática, levantamento de biota aquática, dinâmica de cadeias tróficas, e mais. Contato: Bruno.figueiredo@ufsc.br.

 

 

 

Ana Beatriz Quinto | Estagiária de jornalismo / Núcleo de Apoio à Divulgação Científica

Rafaela Souza | Estagiária de design / Núcleo de Apoio à Divulgação Científica

Edição: Denise Becker | Núcleo de Apoio à Divulgação Científica (NADC-UFSC)

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Santa Catarina abriga espécie de árvore considerada “super rara” ainda pouco conhecida pela ciência

22/11/2022 11:21

Ecólogos da UFSC dizem que o Crinodendron brasiliense é uma espécie em perigo de extinção

 

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O fruto do Crinodendron brasiliense se parece com um pequeno abajur. Foto: Rafael Barbizan e Sophia Kusterko

 

Crinodendron brasiliense ou cinzeiro-pataguá é uma árvore considerada “super rara”, encontrada durante um estudo de campo numa pequena área localizada nas regiões montanhosas do Planalto Serrano Catarinense. “Estávamos fazendo a medição de árvores de um projeto de monitoramento no Parque Nacional de São Joaquim, onde acabamos encontrando 59 indivíduos da espécie, o que despertou a nossa atenção para investigá-la”, diz o ecólogo Eduardo Luís Hettwer Giehl.

Com esse objetivo em mente, Eduardo Giehl e Rafael Barbizan – pesquisadores no Departamento de Ecologia e Zoologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis, lideram um estudo inédito, cuja proposta de pesquisa envolve o monitoramento do cinzeiro-pataguá com o objetivo de realizar um levantamento mais abrangente dessa espécie de árvore ameaçada de extinção e restrita à região. 

A extinção de populações e espécies é algo que afeta o ecossistema e a biodiversidade. Para o professor Eduardo e a equipe de pesquisadores, a dor da perda de uma única espécie é imensa, maior ainda quando pouco se sabe sobre ela. “Para nós é um abalo muito grande perder uma espécie, queremos preservar todas e o cinzeiro-pataguá está numa situação bem delicada”, explica o ecólogo.
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Nem bicho, nem planta: o que nos ensina o conhecimento dos fungos

03/11/2022 10:01

Projeto da UFSC busca catalogar a primeira lista de fungos ameaçados de extinção do Brasil

 

Elisandro Ricardo Drechsler-Santos: “a funga da serra catarinense, inclusive do Parque Nacional de São Joaquim, tem várias espécies novas, endêmicas e algumas estão ameaçadas de extinção”. Foto: Camila Collato

 

Uma bela xícara de café acompanhada de um pãozinho fresco, queijos e, em seguida, um suco de frutas é capaz de tornar qualquer hora do dia gloriosa, concorda? Agradeça aos fungos por isso e muito mais: os fungos estão presentes em quase toda a produção de alimentos. São responsáveis pelo avanço da medicina para tratar doenças físicas e mentais. Sequestram naturalmente e liberam o carbono, além de favorecer distintos processamentos industriais. E há uma série de usos diários dos fungos ainda pobremente conhecidos.

Muitos acreditam equivocadamente que são plantas, mas também não são animais – os fungos são organismos com a sua forma própria de vida. A comunidade de animais de um determinado local é tratada como Fauna, a de plantas, como Flora. E existe ainda uma terceira classificação: a dos fungos, conhecida como Funga. Assim, Fauna, Flora e Funga formam os três grandes grupos de organismos eucariontes da natureza. Apesar de sua importância reconhecida para a manutenção dos ecossistemas, da biodiversidade, e até mesmo para a indústria farmacêutica, essa categoria de seres vivos é pouco explorada pela ciência. Nesse sentido, o objetivo do pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Elisandro Ricardo Drechsler dos Santos é criar um sistema de dados para catalogar, identificar e popularizar o conhecimento acerca da Funga.

Apenas 7% dos fungos são conhecidos pela ciência. Acredita-se que existam cerca de 1 a 5 milhões de espécies, no entanto, apenas 150 mil são catalogadas. Estudar e entender a Funga de um local é importante para a conservação não apenas das espécies de fungos, mas de todo o ecossistema. Essa é a missão do projeto MIND. Funga, coordenado pelo professor Ricardo. “A gente tem no Brasil aproximadamente 50 espécies que já foram avaliadas e a maioria delas são espécies ameaçadas de extinção. No entanto, não existe uma política ainda de reconhecimento disso”, explica o pesquisador. 

A ameaça de extinção

É comum ouvir-se falar sobre plantas e animais em ameaça de extinção. No entanto, pouco se conscientiza sobre o risco das espécies de fungos em perigo. Um dos objetivos do MIND. Funga é catalogar essas espécies na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN). 

O pesquisador é claro: os fungos são essenciais para a estabilidade climática (dado seu papel no sequestro de carbono no solo) e para preservar a saúde ecossistêmica. No entanto, os fungos têm sido negligenciados em políticas ambientais e de conservação. Um descuido com inúmeras consequências, afirma o cientista. “Quando os fungos são colocados em risco, colocam-se em risco os ecossistemas que dependem deles. Com isso, perdemos a chance de realizar avanços, encontrar soluções para problemas ambientais graves, como mudanças climáticas e degradação da terra”, afirma.

E complementa o raciocínio observando que não existe ainda uma lista vermelha nacional de fungos, ou seja, os fungos não são reconhecidos no nosso território. O pesquisador busca estudar a distribuição das espécies para aplicar os critérios da IUCN e classificá-las em níveis de ameaça. Além disso, com engajamento com outros micólogos e liquenólogos, em breve haverá uma proposta ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), para que essas espécies sejam oficializadas também em uma lista no âmbito nacional.

Esse processo de reconhecimento e inclusão das espécies ameaçadas de extinção na lista de alerta vermelho é importante, pois auxilia e chama atenção para criação de políticas públicas que visem à conservação da Funga e, por consequência, da biodiversidade. Como os fungos não são reconhecidos no território brasileiro, Elisandro acredita que seja necessário fazer uma ponte entre pesquisadores e governo, para que seja feito um trabalho em conjunto em prol da manutenção dessas espécies.

Por que os fungos devem ser conservados?

Os fungos são seres fundamentais para o funcionamento dos ecossistemas, pois junto com as bactérias heterotróficas são decompositores da matéria orgânica. Eles atuam como agentes recicladores da matéria, visto que ao fazerem o processo de decomposição devolvem os nutrientes para o solo e o gás carbônico para a atmosfera. Estes componentes serão reaproveitados pelas plantas, que eventualmente servirão de alimento para os animais herbívoros, reiniciando assim o ciclo da natureza. Os fungos podem ser descritos como o “elo” entre seres vivos e componentes não vivos do meio ambiente.

Outro motivo para que os fungos sejam conservados são os seus esporos. Elisandro explica que os esporos dos fungos são micropartículas liberadas no ar que auxiliam a formar as gotas de chuva. O pesquisador diz que “uma floresta preservada não só transpira umidade para formar nuvens, como também as partículas que estão no ambiente agregam essa umidade em forma de gota e fazem com que caia a chuva”. 

Além de sua importância para o equilíbrio ambiental, os fungos também podem ser explorados de maneira consciente pelos mais variados setores da indústria. Muitos alimentos, produtos e medicamentos utilizados no dia a dia dependem desses seres. Um exemplo clássico é a Penicilina, antibiótico descoberto a partir de fungos do gênero Penicillium.

Taxonomia

A ciência de reconhecer e descrever espécies novas é chamada de taxonomia, uma ciência básica que fornece elementos essenciais para outras ciências posteriormente, que são as ciências aplicadas. “Mais do que nunca o cientista no mundo é reconhecido, e em nosso país existe atualmente essa urgência de a sociedade reconhecer as universidades. Porque é dentro das universidades, principalmente as públicas e federais, que acontece a pesquisa”, enfatiza Elisandro. 

Para o pesquisador, quando descrevemos uma nova espécie de fungo, estamos mostrando para a sociedade em geral que existe uma caixinha de surpresas biotecnológicas, surpresas medicinais e surpresas na alimentação que podem ser explorados pela ciência aplicada, e podem retornar para a população não só como produtos importantes para a sociedade, mas também do ponto de vista econômico-financeiro.

O aplicativo de identificação

Complementar à pesquisa de Elisandro, em fase de testes, está a criação de um aplicativo para smartphones que permite, através da captura de imagens, reconhecer as espécies de fungos. Para isso, foram reunidos especialistas em identificação de fungos e inteligência artificial da UFSC dedicados ao desenvolvimento de um sistema moderno de reconhecimento de macrofungos a partir de um banco de imagens e informações.

Esse aplicativo faz parte do programa Ciência Cidadã MIND. Funga, ou seja, conta com a participação de voluntários para auxiliar no registro das imagens que irão compor o banco de dados. Em uma primeira etapa, cidadãos residentes próximos à região das Matas Nebulares de Santa Catarina utilizaram outro aplicativo desenvolvido por uma das pesquisas do grupo para fotografar os fungos em seu ambiente natural e registrar dados como localização, substrato, data da imagem etc. Esses dados estão sendo utilizados inicialmente em um projeto piloto, como base para mapeamento e monitoramento dessas espécies de fungos, bem como para compor o banco de dados do aplicativo de reconhecimento de espécies.

Elisandro comenta que esse banco já conta com informações de mais de 500 espécies de fungos. “Eu estou falando de aproximadamente 20 mil imagens de fungos. Essa base de dados é utilizada para treinar uma rede neural convolucional (Convolutional Neural Network / CNN).  Essa rede neural, ela aprende sozinha com os padrões que encontra nas imagens. É isso que a gente chama de Inteligência Artificial”, diz o pesquisador. Essa parte da IA é desenvolvida em parceria com equipe do Prof. Aldo von Wangenheim do Research institute on Digital Convergence – INCoD, também da UFSC. 

O aplicativo chamado de MIND.Funga app servirá tanto para professores da rede básica e superior em práticas pedagógicas quanto para especialistas contribuírem para popularizar a diversidade das espécies de fungos. 

“Eu tenho um compromisso com a ciência, mas ao mesmo tempo eu tenho um compromisso com a sociedade. E isso me faz querer mostrar para as pessoas o que nosso grupo descobre. Por isso nós estamos desenvolvendo esse aplicativo, para popularizar o conhecimento”, conta o biólogo. O aplicativo está em desenvolvimento e logo uma versão preliminar deverá estar disponível para testes.

Em geral, os estudos para acessar a diversidade e conhecer as espécies costumam ser mais acessíveis, do ponto de vista financeiro. Para o andamento deste projeto específico, os recursos foram disponibilizados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc). Com isso, o pesquisador foi capaz de ir além do objetivo previsto inicialmente. “Eu consigo dar bolsa, eu consigo ir para campo, eu consigo fazer biologia molecular, eu consigo produzir livros” comenta Elisandro.

O pesquisador:

Elisandro Ricardo Drechsler dos Santos, de 43 anos de idade, é Professor Associado do Departamento de Botânica da UFSC, atuando como orientador no Mestrado Profissional PROFBio-UFSC e Mestrado e Doutorado no PPG em Biologia de Fungos, Algas e Plantas (PPGFAP) da UFSC. Pesquisador do CNPq, especialista membro do grupo “IUCN SSC Mushroom, Bracket, and Puffball Specialist Group” e coordenador do grupo de pesquisa MIND.Funga (mindfunga.ufsc.br). 

Entre em contato com o pesquisador

Prof. Elisandro Ricardo Drechsler-Santos
Laboratório de Micologia (MICOLAB)
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Centro de Ciências Biológicas (CCB)
Departamento. de Botânica
Telefone: +55 (48) 37212889
Celular: +55 (48) 996268188
E-mail: drechslersantos@yahoo.com.br
Florianópolis – 88040970 – Brasil

 

 

Maria Magnabosco / Estagiária de jornalismo / Núcleo de Apoio à Divulgação Científica / UFSC
Rafaela Souza / Estagiária de design / Núcleo de Apoio à Divulgação Científica / UFSC


Edição
Denise Becker / Núcleo de Apoio à  Divulgação Científica / UFSC

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Banco de fezes: pesquisador busca financiadores para montar laboratório que pode salvar vidas

17/10/2022 09:25

Cientista da UFSC explica como o armazenamento de amostras pode ser usado para tratar doenças e controlar infecções

  

A disbiose pode ser intestinal, vaginal, da pele e do pulmão. (Foto: Centro de Controle da Disbiose)

Fezes – sim, fezes – podem ser usadas para o tratamento de doenças, para controle de infecções e até para melhora em quadros do espectro autista.  O transplante da microbiota intestinal (TMI), mais conhecido como transplante de microbiota fecal (TMF), vem sendo aplicado como método eficaz em todo o mundo para tratar problemas causados por bactérias multirresistentes a antibióticos e muitas outras condições. Esse é o principal tema de pesquisa de Carlos Zárate-Bladés, professor e médico que criou o Centro de Controle da Disbiose e lidera uma equipe de pesquisadores no Centro de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 

Boliviano que mora em Florianópolis desde 2015, Zárate-Bladés comenta que a transferência de microrganismos de uma pessoa pode restabelecer o equilíbrio da microbiota intestinal. “O transplante de microbiota se consolidou para tratar uma infecção de repetição causada pela bactéria Clostridioides difficile, que provoca diarréia no paciente podendo evoluir para a inflamação do cólon. Esse patógeno é responsável por alta taxa de mortalidade em pacientes internados em hospitais; com o transplante, o sucesso da recuperação é superior a 90% para essa infecção em específico”, salienta o pesquisador.

A alteração da microbiota é chamada de disbiose, que pode ser intestinal, mas também vaginal, de pele, de pulmão e de qualquer outra mucosa do corpo. O desequilíbrio costuma provocar o aparecimento de doenças de diversos tipos, sendo a mais comum associada ao uso de antibióticos, mas também pode ser um problema consequente por uma outra doença de base.  

Outras alterações são atribuídas a pessoas com doenças inflamatórias intestinais como a colite ulcerativa e a doença de Crohn são condições que podem se beneficiar com esse tratamento. Assim, o objetivo do pesquisador Carlos Zárate-Bladés é desenvolver a técnica do Transplante da Microbiota Intestinal (TMI) no Hospital Universitário Polydoro Ernani de São Thiago, da Universidade Federal de Santa Catarina (HU-UFSC). Isso envolve investimentos para uma estrutura adequada, realização e manutenção da pesquisa. 

Devido à baixa incidência de efeitos colaterais, o transplante de fezes é recomendado pela Sociedade Americana de Doenças Infecciosas (IDAS) e pela Sociedade Europeia de Microbiologia Clínica e Doenças Infecciosas (ESCMID). O primeiro transplante de fezes no Brasil foi realizado no Hospital Israelita Albert Einstein, em 2013. Existe um banco de fezes no Hospital da Universidade Federal de Minas Gerais, que vem realizando de forma rotineira o transplante desde 2017. 
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Santa Catarina pode ser modelo para os outros estados no controle de bactérias do tipo MRSA

10/10/2022 08:50

Pesquisadora da UFSC está coordenando um projeto para estudar a Staphylococcus Aureus resistentes a Meticilina (MRSA)

 

A microbiologista Fabienne Ferreira estuda MRSA desde a sua graduação (Foto: Rafaella Whitaker)

 

A resistência das bactérias aos antibióticos é um grande desafio para a saúde pública no mundo. Uma dessas bactérias é Staphylococcus aureus resistentes à Meticilina, conhecida pela sigla MRSA. Apesar de serem organismos comensais, ou seja, que interagem com o ser humano sem causar doença, em algumas situações, o desequilíbrio da relação dessa bactéria com o hospedeiro pode ser prejudicial à saúde. O estudo conduzido por Fabienne Antunes Ferreira, microbiologista e pesquisadora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), busca entender essas interações entre o organismo humano e esses patógenos, mais especificamente no estado de Santa Catarina.

O objetivo do estudo é entender por que em Santa Catarina a incidência dessas bactérias resistentes a antibióticos parece ser menor em comparação com outros estados do país. No Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Paraná, cerca de 30 a 60% de Staphylococcus aureus são MRSA. No entanto, em Santa Catarina, essa taxa reportada foi de 2 a 8%. “Talvez, Santa Catarina possa ser um modelo futuro para inibir o crescimento dessas bactérias, já que aqui é naturalmente inibido de alguma forma”, explica a pesquisadora.
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