Como as fake news ganham tanta atenção? Professor da UFSC explica

16/10/2023 19:53

Preconceito interfere sobre quem é visto como bom informante; minorias sociais sofrem “injustiças epistêmicas”

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Distinguir notícias verdadeiras de falsas é uma tarefa quase “sherlockiana”, afirma Alexandre Meyer Luz. Ilustração: Rafaela Souza.

“Não dá para ser Sherlock Holmes o tempo inteiro”. O famoso personagem da literatura britânica é uma metáfora utilizada por Alexandre Meyer Luz, professor de Filosofia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), para se referir ao ser humano ideal: aquele que sabe avaliar a qualidade de uma informação.

Diferenciar fake news de notícias verdadeiras tornou-se uma competência quase “sherlockiana”. Mas o cidadão comum não tem o mesmo tempo de um detetive para investigar a origem de todas as histórias que recebe diariamente por aplicativos de mensagem. Segundo Meyer, outro tipo de ingrediente explica por que concedemos mais ou menos crédito a alguns informantes. São os pressupostos de confiança, o que inclui desde as relações com parentes próximos (pais, por exemplo) até mecanismos sociais (como os preconceitos de racismo, machismo e LGBTfobia).

Meyer é professor na área de Epistemologia, ramo da Filosofia dedicado aos estudos sobre a produção do conhecimento. Sua pesquisa adiciona complexidade aos modelos epistêmicos reduzidos à figura do indivíduo racional e que não é atravessado por emoções. “Na Filosofia, sempre fazemos algum grau de abstração”, afirma. “Mas quando queremos pensar sobre assuntos muitos ‘encarnados’, como fake news e educação, a abstração não pode criar modelos que não respeitam como as pessoas de fato pensam”. 
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Conferência da Semana Acadêmica de Letras aborda os discursos da intolerância

09/06/2017 20:09

Professora Diana Luz Pessoa de Barros. Foto: Ítalo Padilha/Agecom/UFSC.

“Neste momento, no Brasil, temos exemplos e exemplos e exemplos para falar de discursos da intolerância.” Foi com esse enunciado que Diana Luz Pessoa de Barros, professora de Linguística da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), abriu a conferência “O discurso da intolerância: questões de intolerância e política, intolerância e internet, intolerância e ensino”, que ocorreu na tarde de quinta-feira, 8 de junho, durante a XI Semana de Letras da UFSC.

Diana iniciou a palestra contextualizando o paradoxo em que vivem os estudiosos da área de Letras: de um lado, o poder da língua e da linguagem é reconhecido; do outro, os cursos de Letras são, em geral, desprestigiados e considerados menos importantes do que outras áreas acadêmicas. Em seguida, a professora abordou o papel que os pesquisadores da linguagem, e em especial do discurso, têm no tratamento das intolerâncias: “Dentro da universidade temos, em primeiro lugar, a obrigação de produzir conhecimento sobre essas questões. O saber sobre a dominação da linguagem e sobre a construção discursiva da intolerância e do preconceito é uma forma, entre outras, de atenuá-los e de contribuir para a aceitação e a inclusão social.”

Foto: Ítalo Padilha/Agecom/UFSC.

Sua perspectiva de reflexão é a semiótica discursiva de língua francesa, linha de análise que compreende que é na língua em uso, no campo dos discursos, que a dominação ocorre, que o poder se manifesta. “E é lá também que ele pode ser contestado”, explicou. Para fundamentar suas reflexões, a professora recorreu a três autores: o francês Roland Barthes; o russo Mikhail Bakthin; e o moçambicano Mia Couto. “Eles compreendem que é tarefa do estudioso do discurso, e das humanidades em geral, não emudecer  o homem, mas, ao contrário, dar-lhe voz. Para isso, é preciso, com os meios desenvolvidos pelas diferentes teorias do discurso, mostrar as formas, as estratégias, os procedimentos que fazem de um texto, mesmo dialogicamente constituído, discursos monofônicos. No desmascaramento dessas estratégias, outras vozes se farão ouvir. E esse saber contribuirá para a promoção da igualdade linguística e social.”

Os discursos a serem “desmascarados” seriam, sobretudo, aqueles considerados discriminatórios, preconceituosos, intolerantes, de exclusão e de incitação à violência. Diana acrescenta que também é papel dos pesquisadores desenvolver procedimentos de construção de discursos contrários: “Temos que mostrar o que são esses discursos de aceitação, intervenção e inclusão social, como eles se constroem.” Para ilustrar seus argumentos, citou diversos exemplos de textos preconceituosos publicados em jornais, revistas, páginas na internet e redes sociais. Destacaram-se os depoimentos dos deputados federais Marco Feliciano e Jair Bolsonaro, que explicitavam preconceitos raciais e de gênero. “Há políticos que fazem da intolerância a sua plataforma.”

Foto: Ítalo Padilha/Agecom/UFSC.

A professora também ressaltou o caráter passional dos discursos intolerantes. “São sempre sujeitos apaixonados. Predominam, nesses discursos, dois tipos de paixões. As malevolentes, de antipatia, raiva, ódio, xenofobia, medo do diferente e dos danos que ele pode causar. A malevolência é considerada uma espécie de caminho para que as coisas sejam postas nos seus ‘devidos lugares’.” As outras paixões, segundo a pesquisadora, seriam as benevolentes. “O sujeito do ódio em relação ao estrangeiro, ao diferente, aos maus usuários da língua, é também o sujeito do ‘amor à pátria’, amor à língua, ao grupo étnico, aos de sua cor, aos de sua religião. Os textos intolerantes são também aqueles do nacionalismo exacerbado. Ou seja: complementam-se as paixões malevolentes do ódio em relação ao diferente e as paixões benevolentes do amor aos iguais.”

Além das questões relativas ao preconceito e à intolerância em relação aos usos da linguagem, a professora abordou a variedade linguística, a oralidade, o plurilinguismo (ou multilinguismo). A aceitação das “várias línguas portuguesas”, por exemplo – da cidade e do campo, dos falantes cultos e dos iletrados, do nordeste e do sudeste etc –, evitariam preconceitos e intolerâncias em relação à linguagem e ao diferente em geral. “Promovê-las à igualdade seria o luxo da liberdade. A diversidade e a pluralidade, o multiculturalismo e de multilinguismo, são condições imprescindíveis ao desenvolvimento da civilização. Um homem plural deve estar munido de um idioma plural.”

Diana começou a pesquisar a intolerância nos discursos quando integrou o Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos (Diversitas), coordenando um projeto de pesquisa sobre intolerância e preconceito linguístico. “Minha proposta é que os discursos intolerantes são principalmente discursos que julgam os sujeitos considerados maus cumpridores de certos contratos sociais. Por exemplo, o contrato de ‘branqueamento da sociedade’, ou o da ‘pureza da língua’, da ‘heterossexualidade’ e por aí afora. Esses sujeitos são, portanto, reconhecidos como maus atores sociais, maus cidadãos, maus usuários da língua. Eles não são só julgados cognitivamente, mas são também punidos, com a perda de direitos, de emprego e até mesmo com a morte.”

O problema da intolerância, portanto, é que ela vai além da “etapa passional do preconceito”. A intolerância aparece nas ações discriminatórias. “O sujeito intolerante passa para a ação e age contra o outro, contra aquele que ele odeia.” A professora citou uma frase que conheceu quando vistou o museu “Memoria y Tolerancia“, na Cidade do México: “Todos temos preconceitos, mas nem todos discriminamos.” Ou seja, se não podemos ser impedidos de ter preconceitos, podemos — e devemos — ser impedidos de discriminar, de desrespeitar, de matar.

Mais informações sobre a XI Semana Acadêmica de Letras na página do evento e no Facebook.

Daniela Caniçali/Jornalista da Agecom/UFSC

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Aluno e professora do CCE denunciam caso de discriminação à reitoria

22/04/2014 19:08

Aluno da UFSC denuncia pixação antissemita, homofóbica e com ameaça de morte. (Foto: Henrique Almeida/Agecom/UFSC)

Durante reunião no gabinete da reitoria na tarde desta terça-feira, 22 de abril, chegou ao conhecimento da vice-reitora Lucia Helena Martins Pacheco um caso de homofobia e discriminação religiosa na UFSC. O estudante de Letras – Língua Portuguesa, Gabriel Eigenmann Carvalho, encontrou uma pichação de conteúdo antissemita e homofóbico na porta de um dos banheiros masculinos do Centro de Comunicação e Expressão (CCE). Gabriel identificou-se como a vítima da ofensa, pois, segundo ele, não há outros estudantes judeus homossexuais que estudem nos mesmos curso e turno (diurno) citados na mensagem.

O acadêmico percebeu a pichação há cerca de duas semanas; não há assinatura, e, até o momento, quem escreveu as mensagens não foi identificado – na porta do banheiro já existia um texto de conteúdo antissemita escrito há mais de um ano.

Depois de ler a pichação, Gabriel – que é membro do Coletivo LGBT Gozze! – comunicou o Departamento de Línguas e Letras Vernáculas (DLLV) e entrou em contato com a reitoria; primeiro por meio do coletivo e, depois, por intermédio da Associação Israelita Catarinense (AIC), da qual participa.
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