Apresentar discussões de gênero nos cursos de ciências da saúde foi uma das necessidades discutidas na abertura da 1ª Semana de Combate às Fobias de Gênero na Saúde, realizada na segunda-feira, 31 de agosto, no auditório da Pós-Graduação do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). O evento é uma parceria do Departamento de Saúde Pública, através do “Epicen@s: Núcleo de Estudos em Gênero e Saúde”, em conjunto com o grupo “Acontece – Arte e Política LGBT” e a Fundação Açoriana para o Controle da AIDS (Faça).
professor Murilo Moscheta, na abertura do evento. Foto: Henrique Almeida/Agecom/DGC/UFSC
Professor do Departamento de Saúde Pública da UFSC, Rodrigo Otavio Moretti-Pires afirmou na abertura da programação que a discussão sobre gênero é praticamente inexistente nos cursos. “Entende-se a saúde por uma perspectiva heterossexual compulsória, e isto não representa a realidade”.
A professora do Departamento de Pediatria e vice-diretora do CCS, Isabela de Carlos Back Giuliano, lembrou que “qualquer iniquidade em saúde é cruel e monstruosa; por preconceito, é ainda mais condenável” e destacou a importância do CCS ser espaço deste tipo de debate.
Palestrante convidado, o professor da Universidade Estadual de Maringá Murilo dos Santos Moscheta destacou o atendimento à população LGBTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) como “questão de responsabilidade” dos cursos de ciências da saúde.
“O discurso científico e as práticas de saúde contribuíram, a partir do século 19, para caracterizar a sexualidade fora das perspectivas heterossexual, monogâmica, familiar e reprodutiva como patológicas. É responsabilidade do campo da saúde reinventar estas práticas de desigualdade que a gente ajudou a construir” diz Moscheta.
Ele ressaltou que a discriminação mina as boas condições de vida. “O modo como vivemos contribui para determinar nossa saúde. Imagine quantos insultos e violências uma pessoa trans pode aguentar antes de sair da escola”. De acordo com Moscheta, o acesso e a utilização de serviços da saúde podem até agravar preconceitos e condições. “Para receber tratamento hormonal, uma pessoa trans precisa produzir uma narrativa sofrida de si mesma, que permita um diagnóstico de distúrbio, e provocar o agravamento do próprio mal-estar, e só a partir daí ser atendido”. O professor questiona o que sente um LGBTT ao procurar uma unidade básica de saúde: “Qual a conta de ser desrespeitado ou agredido? Ficar em casa e tomar um antibiótico recomendado por um amigo? E o medo de não ser chamado pelo nome social? Além de não ser compreendido, precisa explicar educar ou satisfazer a curiosidade perversa do profissional de saúde”.
Para Moscheta, os profissionais de saúde são formados em uma sociedade discriminatória, educados com um conjunto de preconceitos que serão reproduzidos no atendimento. “A discriminação pode perverter o cuidado e encontra amparo no pretenso discurso científico, como psicólogos que insistem em ‘curar homossexuais’. Há a impossibilidade de criar um vínculo com o sistema de saúde”.
Antes da palestra de Moscheta, os organizadores apresentaram um vídeo de estudantes de Nutrição, “Saúde pública e população LGBT”, produzido para a disciplina “Desenvolvimento da comunidade”.
Depois dos debates, houve apresentação da performance de Lui Castanho, sobre as expectativas da leitura do próprio corpo.
A 1ª Semana de Combate às Fobias de Gênero na Saúde segue até o dia 4 de setembro, no bloco H do Centro de Ciências da Saúde.
Caetano Machado/Jornalista da Agecom/DGC/UFSC
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