Uma perda de aproximadamente 13,70 km² – o equivalente a 27% da área total – atingiu os mangues da Baía da Babitonga entre 1985 até 2019. Essa foi uma das constatações da análise da cobertura do solo da região feita por uma equipe de pesquisa coordenada pela UFSC. O projeto BaySqueeze, financiado por edital do CNPq, também constatou que a perda foi mais acentuada nos anos de 1997 e 2017 e na região de Joinville, cidade mais populosa de Santa Catarina.
A pesquisa, coordenada pelo professor Antonio Klein, da Coordenadoria Especial de Oceanografia, teve como um dos objetivos desenvolver metodologias para prever e mitigar efeitos da subida do nível do mar na Baía da Babitonga, reconhecida pela grande riqueza de fauna e flora, com manguezais que representam 80% do total do ecossistema no estado. Segundo o estudo, o mangue é um dos responsáveis por atenuar a energia de ondas na costa e os efeitos da subida do nível do mar.
“Este estudo foi feito a partir de dados de mudança de cobertura o uso de solo disponibilizadas pelo MapBiomas e de evolução da linha de costa em 34 anos, com 30 metros de resolução espacial validadas localmente com imagens obtidas por drone”, contextualiza Klein. “Quanto à evolução do mangue foi possível observar que, no geral, há dois decréscimos em área, sendo o mais expressivo a partir do ano de 2015, influenciados principalmente pela região do Palmital e de Joinville”, explica. A fragmentação do mangue também foi maior nessa região, conforme os pesquisadores puderam constatar a partir do sensoriamento remoto, o que sugere a existência de uma relação entre a expansão urbana nas proximidades do mangue e a degradação.
A partir desses resultados, de acordo com ele, foi possível se pensar numa metodologia utilizando a ferramenta CASSIE, também desenvolvida pelo grupo e utilizada em diferentes países do mundo. “Inicia-se pela análise da evolução da linha de costa e variação da área do mangue e da urbanização, posteriormente estabelece-se os limites do mangue e se há uma variação deste no tempo”, pontua.
Essas análises e previsões são necessárias porque o manguezal precisa de espaço para movimentação para que seja possível seu recuo em direção ao continente em uma situação de subida do nível do mar. “Os resultados enaltecem a necessidade de garantir que a ocupação humana próxima das margens da Baía da Babitonga deve se realizar de forma a garantir que o ecossistema manguezal, área de proteção ambiental, seja conservado para possa garantir os seus importantes serviços ecossistêmicos”, registra um dos relatórios formulados pela equipe, assinado pelo pesquisador Luis Pedro Melo de Almeida, colaborador do projeto.
Segundo os resultados, se a expansão urbana for mantida na mesma velocidade e intensidade que o identificado pelas ferramentas, o manguezal pode sofrer uma importante pressão antrópica em menos de 100 anos, principalmente na cidade de Joinville. Os dados, no entanto, ainda não são considerados preocupantes, embora exijam cuidado. “Naturalmente, em cada ciclo de maré, os sedimentos são retrabalhados e redistribuídos a partir e nos canais que existem no mangue. Ele é dinâmico em diferentes escalas de tempo e espaço”, explica Klein.
Além disso, como a linha de vegetação é utilizada nas análises, é preciso ter atenção, pois alterações ocorridas ali influenciam esta variação. “Mas o resultado mais importante que vejo é que há ciclos naturais do tamanho e da fragmentação do mangue que podem estar sendo modificados pelo uso da baía. Isso precisa ser confirmado, não podemos afirmar, mas justifica manter um monitoramento destas variáveis”, conclui o professor.
CASSIE
A ferramenta para análise e mapeamento das regiões costeiras que processa imagens de satélite e define as linhas de costa via Computação em Nuvem – ou seja, sem necessidade de armazenamento no dispositivo – foi um dos resultados do projeto Bay Squeeze. Um artigo publicado no periódico Environmental Modelling and Software apresentou e detalhou o sistema, produzido com a parceria da Universidade do Vale do Itajaí e colaboração da Universidade Federal de Rio Grande, e do COLAB +ATLANTIC LVT, de Portugal. Seus resultados podem prever impactos comparando o passado e o presente e orientando políticas públicas de gestão costeira.
Denominado C.A.S.S.I.E. – Coastal Analysis System via Satellite Imagery Engine, o sistema automatiza um processo que até então dependia da digitalização de fotografias aéreas, com cálculos de sua resolução e comparação com as imagens de satélite disponíveis a uma determinada altitude. “Mais recentemente algumas aplicações comerciais foram desenvolvidas. E outro grupo desenvolveu um sistema que as imagens da área de interesse são baixadas no computador. O C.A.S.S.I.E. faz todo processamento e definição da linha de costa na ‘nuvem’, a partir de imagens de satélites disponíveis de forma gratuita via Google Enginee, em diferentes plataformas”, explica Klein.
O trabalho de análise das costas possibilita desde a avaliação do impacto da ação humana nas praias e mangues, por exemplo, até a compreensão dos efeitos naturais e processos de erosão e acreção – perda ou acréscimo de sedimentos, respectivamente. As chamadas linhas de costa marcam o limite entre água e terra e podem representar diagnósticos ambientais necessários para políticas públicas.
Amanda Miranda/Jornalista da Agecom/UFSC