
Para minimizar os problemas na área da saúde, um convênio entre Brasil, Cuba e o próprio Haiti vem apoiando o fortalecimento da autoridade sanitária no país abalado pelo terremoto. Fotos cedidas pela equipe
País pobre, o Haiti teve seu quadro de penúria social agravado pelo terremoto de janeiro de 2010, que deixou mais de 200 mil mortos e destruiu grande parte da infraestrutura de serviços públicos. Para minimizar os problemas na área da saúde, um convênio tripartite envolvendo Brasil, Cuba e o próprio Haiti vem apoiando o fortalecimento da autoridade sanitária, desenvolvendo ações de cooperação que sejam sinérgicas ao Plano Nacional de Saúde do país, em fase de construção. Estas ações incluem a construção de hospitais, a organização de redes de atendimento e a formação de trabalhadores para os serviços públicos e atuação junto às comunidades. Ocorre ainda a reforma de laboratórios, a doação de ambulâncias e apoio em ações prioritárias, como campanhas de vacinação. No Brasil, a cooperação é coordenada pelo Ministério da Saúde, em parceria com a Fiocruz, Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
A participação da UFSC se dá por meio do Programa de Pós-graduação em Enfermagem, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu), que faz a gestão financeira do projeto Formação de Recursos Humanos na Atenção Primária à Saúde, já em aplicação no Haiti. Responsáveis pelo grupo da formação de agentes comunitários de saúde polivalentes, equipes da UFSC e de professores da Rede de Escolas Técnicas do SUS preparam os profissionais haitianos que atuam na formação e na inserção em serviço destes novos agentes, em ação direta nas comunidades onde os problemas se manifestam.
“Nosso trabalho é propor e construir coletivamente modelos de formação, elaborar, traduzir e validar ao contexto cultural todas as estratégias e recursos pedagógicos e, finalmente, acompanhar, apoiar e supervisionar o funcionamento dos cursos”, diz a professora Flávia Regina Souza Ramos, coordenadora do projeto. A meta é formar mil agentes comunitários de saúde polivalentes, em curso de 400 horas, já em andamento. Na primeira etapa, a equipe da UFSC tem dois professores e três consultores contratados. No momento, novos professores e pós-graduandos estão sendo agregados ao grupo.
Na Pós-graduação e Departamento de Enfermagem, o trabalho é encarado como uma atividade de extensão, sem prejuízo das demais atividades. “Esta ação é reconhecida por seu impacto e como uma das dimensões que integram a internacionalização e solidariedade que se espera de um programa de pós-graduação e, também, de um curso de graduação com a qualidade alcançada”, afirma a professora Flávia.
O programa tripartite prevê também a formação de 500 auxiliares de enfermagem, em curso de 1.200 horas, e de até 400 agentes de saúde ambiental, com 480 horas, ambos na fase de elaboração dos materiais. Uma tonelada e meia de material pedagógico está sendo enviada ao Haiti, apenas para primeiro curso, conta a professora. O primeiro dos três hospitais em construção – e onde os estudantes farão parte de seus estágios – deverá ficar pronto até o final de 2012. Outra ação está se desenvolvendo no combate a doenças preveníveis, com a nova fase da campanha de vacinação marcada para este segundo semestre. Na primeira etapa o Brasil teve uma atuação importante e a cobertura chegou a 95% da população de 0 a 9 anos.
Modelo bem sucedido – Com muitas doenças endêmicas e parasitárias, o Haiti ainda não conta com um sistema de vigilância epidemiológica, o que dificulta as ações na área de saúde. A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), instituição brasileira que promove a saúde, o conhecimento científico e o desenvolvimento social, atua em parceria com o Ministério da Saúde para fortalecer a autoridade sanitária naquele país, reestruturar o sistema de assistência à saúde e de vigilância epidemiológica. Outro grupo de trabalho, voltado para a área de organização dos serviços, está sob a responsabilidade da UFRGS. “As decisões finais cabem ao grupo gestor tripartite (Brasil/Cuba/Haiti) e as três instituições brasileiras conveniadas buscam uma articulação”, informa a professora Flávia Souza Ramos. “Não estamos fazendo ações pontuais e meramente caritativas, mas construindo competências e estruturas que serão incorporadas às políticas locais e geridas pelos haitianos”.
A presença do Brasil deve-se a uma antiga parceria com o Haiti (o Exército brasileiro ainda está naquele país) e ao sucesso do SUS, considerado modelo de sistema público de saúde. A participação de Cuba tem relação com a tradição na atenção primária e em projetos de cooperação com aquele país, inclusive formando grande parte dos médicos haitianos. “São ações ambiciosas”, afirma a professora, que agora cuida da renovação dos convênios com o Ministério da Saúde para prorrogar o programa por mais dois anos. Depois de formados, os novos trabalhadores deverão ser contratados pelo governo do Haiti, suprindo parte de sua carência em recursos humanos qualificados. Durante a formação o Brasil concede bolsas de estudo, no período de 12 a 18 meses, aos agentes envolvidos no programa.

Equipe do Projeto de Formação na inauguração do Espaço Zilda Arns; professora Flávia (terceira da esq p/ dir) e consultores do Projeto e do Ministério da Saúde
Espaço Zilda Arns – No dia 18 de julho, foi inaugurado em Porto Príncipe, capital do Haiti, o Espaço de Saúde Zilda Arns, onde são realizadas as reuniões técnicas do projeto, e que tem esse nome em homenagem à médica pediatra e sanitarista brasileira (nasceu em Forquilhinha, SC, em 1934) que morreu durante o terremoto de 2010. O evento teve a presença de autoridades dos governos brasileiro, cubano e haitiano, representantes das três IES conveniadas, além de familiares da homenageada e de representantes da Pastoral da Criança, organismo fundado pela médica em 1983 e que presta assistência a gestantes e crianças em todo o Brasil e em outros países em desenvolvimento.
“A situação social do Haiti é pior do que os brasileiros imaginam”, conta a professora Flávia Ramos. Além da pobreza extrema e da falta de infraestrutura em todas as áreas, a violência cresceu e a mortalidade infantil é muito alta. Há um índice elevado de amputados – sequela do terremoto – e de deficientes físicos. Por isso, um dos novos hospitais será um centro de reabilitação para atender a esse público específico.
Mesmo com todas essas dificuldades, os brasileiros se sentem bem trabalhando no Haiti: “É recompensador ajudar a reerguer o país, que recebe muita ajuda internacional de ONGs e de governos, porém quase sempre sem o caráter estruturante do nosso projeto”, diz Flávia.
Mais informações: (48) 3721-2217
Paulo Clóvis Schmitz / Jornalista da Agecom / UFSC
pcquilombo@gmail.com