Pesquisadora indígena da UFSC é pioneira em Arqueologia no âmbito da pós-graduação
A tarde do dia 17 de junho marcou uma ocasião especial na Terra Indígena Laklãnõ Xokleng de Ibirama, localizada no interior do Vale do Itajaí, em Santa Catarina. Projeções nas casas e na escola da aldeia permitiram a familiares e amigos assistirem à defesa de mestrado da acadêmica Walderes Coctá Priprá, pelo Programa de Pós-Graduação em História (PPGH) na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
A apresentação foi realizada de forma remota devido à pandemia de Covid-19, diante de uma sala lotada: 63 pessoas on-line durante a defesa. A aluna teve sua dissertação aprovada sem alterações pela banca, composta pelas professoras Fabíola Andrea Silva, da Universidade de São Paulo (USP) e Luisa Tombini Wittman, da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), além de Evelyn Zea, do Departamento de Antropologia da UFSC como suplente.
Walderes é a segunda indígena a defender um mestrado no PPGH (a estudante Delta Maria de Souza Maia, do povo Wapixana da Serra da Moça, de Roraima, concluiu em 2001), mas a primeira a obter a conquista após a implantação da política de ações afirmativas na Universidade. O caminho até o título foi árduo para a mãe de três filhos que iniciou os estudos no ensino superior visando auxiliar na educação da aldeia.
Antes de se tornar uma estudante da UFSC, Walderes cursou Letras Português/Espanhol em uma instituição próxima a Ibirama. “Na época, a gente estava com falta de professores dentro da terra indígena e foi até um pedido da própria liderança que a gente fizesse algum curso de graduação para poder assumir como professor dentro da terra indígena, nas nossas escolas”, recorda.
Já a segunda graduação foi cursada na UFSC: Licenciatura Intercultural Indígena do Sul da Mata Atlântica, com ênfase em Humanidade. Ela finalizou o curso em 2015 com a linha de pesquisa direcionada à questão do direito indígena. Finalizada esta etapa, a acadêmica desejou dar continuidade aos estudos na área da História e iniciou no programa de pós-graduação em 2017.
Pioneirismo em Arqueologia
Em arqueologia, tema que aborda em sua dissertação, Walderes tornou-se pioneira também ao ser a primeira indígena a defender um título no âmbito da pós-graduação. De acordo com a pesquisadora, seu objeto de estudo surgiu após inúmeras rodas de conversas em sua aldeia. “Meu projeto de mestrado foi desenvolvido com o apoio das lideranças da minha comunidade, principalmente nossos anciões. Eles queriam muito que houvesse um registro da nossa história e do nosso povo”, afirmou.
Intitulada Lugares de acampamento e memória do povo Laklãnõ Xokleng, Santa Catarina, a dissertação de Walderes Coctá Priprá mapeou os locais de memória, os acampamentos mais antigos e também aqueles que surgiram logo após o contato com não-indígenas ocorrido em 1914, conhecido como “pacificação”. Atualmente o povo Laklãnõ Xokleng encontra-se em sua maioria em Santa Catarina, no Alto Vale do Rio Itajaí, cercado por pelos municípios José Boiteux, Doutor Pedrinho, Vitor Meirelles e Itaiópolis, locais onde a pesquisa foi realizada.
O trabalho teve como objetivo o registro dos lugares que ficaram na memória do povo Laklãnõ Xokleng através de fotos, entrevistas com os anciãos e sábios e visitas aos locais de acampamentos e cemitérios antigos do povo. Walderes ressaltou que este era um momento crucial para o levantamento, uma vez que quase não há registros da história antes do contato com os não-indígenas.
“É um ganho para minha própria comunidade, visto que muitos acreditam que nós, indígenas, não vamos conseguir. Muitos nos acham incapazes. Então, é uma forma também de mostrar que nós somos capazes sim e que temos muito ainda a aprender e ensinar nesse mundo dos não-indígenas”, disse Walderes.
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