
Desde 2004, em uma nova linha de trabalho, o professor busca metabólicos secundários bioativos a partir de invertebrados marinhos do litoral catarinense. Fotos: Camila Peixer / Bolsista de Jornalismo na Agecom
Na Universidade Federal de Santa Catarina desde 2001, o professor Eloir Paulo Schenkel desenvolve um trabalho destacado na área de Química de Produtos Naturais, o que lhe valeu a indicação dos pares do Centro de Ciências da Saúde para receber o Prêmio Destaque Pesquisador UFSC 2011. Docente do Departamento de Ciências Farmacêuticas e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Farmácia da UFSC, ele ministra disciplinas relacionadas ao desenvolvimento, análise e utilização de medicamentos.
Seu currículo inclui pesquisas importantes com plantas como o timbó, a marcela, o taiuiá e a erva-mate. Pela relevância dos estudos realizados, concorreu ao IV Prêmio Jovem Cientista em 1984 (ano em que o tema previsto para premiação foi a Química de Produtos Naturais), tendo recebido o segundo lugar na categoria Graduados. Em 2004, deu início a uma nova linha de trabalho, buscando metabólicos secundários bioativos a partir de invertebrados marinhos do litoral catarinense, pesquisando algas, corais e esponjas com a participação de docentes e alunos das áreas da Farmácia e da Biologia.
O modelo de trabalho nessa linha de pesquisa é o da busca de compostos bioativos guiada por ensaios de atividade biológica (biomonitoramento). Isto significa que a metodologia e as técnicas a serem utilizadas para o isolamento e a elucidação estrutural dos compostos são as mesmas, independentemente do tipo do bioensaio. A obtenção de substâncias com atividades antiinfecciosas (antiherpéticas, antitumorais, antifúngicas e antibacterianas) poderá ser o resultado prático dessa prospecção, cujos efeitos devem vir no longo prazo, como tudo o que diz respeito à pesquisa de novos fármacos. “Desenvolver medicamentos é sempre um processo multidisciplinar complexo”, alerta Schenkel.
Durante o doutorado, concluído em 1980, o professor investigou a composição química de uma planta conhecida como timbó, utilizada por populações indígenas da região sul do Brasil como ictiotóxica – ou seja, capaz de causar o entorpecimento de peixes, facilitando o seu aprisionamento em grandes quantidades. Após o doutorado, ingressou na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e continuou a desenvolver pesquisas com plantas tóxicas, mas também com plantas medicinais muito conhecidas na região, como a marcela e o taiuiá, ambas marcadas por um amargor característico. Destaca-se, também, o conjunto de trabalhos realizados com a erva-mate, uma espécie vegetal de grande relevância econômica e social no sul Brasil, em vista do cultivo em pequenas propriedades.
Atenção aos fitoterápicos

O pesquisador também contribui para a formação de pesquisadores na área de assistência farmacêutica, com a orientação de trabalhos focados na questão da utilização de medicamentos em farmácias hospitalares
Nas décadas de 80 e 90, Eloir Schenkel orientou trabalhos de investigação, quase sempre vinculados com a formação de estudantes de mestrado em temas ligados à Química de Produtos Naturais, mas também em assuntos relacionados à utilização de medicamentos. Foi coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da UFRGS, no período 1993-1995, e entre 1980 e 2000 orientou a formação de 20 estudantes de mestrado e seis estudantes de doutorado.
Em 2001, passou a atuar no Departamento de Ciências Farmacêuticas e no Programa de Pós-Graduação em Farmácia da UFSC, mantendo as linhas de pesquisa anteriores, em trabalhos com plantas de ampla utilização – como o maracujá, de uso alimentar – e também com matérias primas para o desenvolvimento de fitoterápicos, medicamentos que contêm em sua composição exclusivamente matérias-primas vegetais.
Em outra linha de pesquisa, são realizadas modificações estruturais em cucurbitacinas, substâncias que têm propriedades antiinflamatórias e antitumorais, originalmente obtidas de plantas de uso tradicional. “É preciso conhecer a estrutura dos componentes responsáveis pelas atividades atribuídas à planta para modificar a sua estrutura, buscando otimizar as suas propriedades, no sentido de melhorar a ação terapêutica”, afirma o professor.
Nesse período ele também contribuiu para a formação de pesquisadores na área de assistência farmacêutica, com a orientação de trabalhos focados na questão da utilização de medicamentos em farmácias hospitalares.
Fármacos em uso
Em relação às pesquisas marinhas, Eloir Schenkel diz que elas se justificam também pelo fato de o Brasil ter a segunda maior costa do mundo, atrás apenas da Austrália. Esse trabalho envolve, entre outros, os pesquisadores Alberto Lindner, Bárbara Segal, Mário Steindel, Paulo Horta, Flávio Henrique Reginatto e Miriam Falkenberg, membros do Departamento de Ciências Farmacêuticas do Centro de Ciências da Saúde.
Membro da equipe do professor Schenkel, Everson Miguel Bianco diz que Santa Catarina está no limite da distribuição das águas quentes que vêm do Caribe e das águas frias originárias do sul do continente americano. Muitos peixes, algas, esponjas e corais se reproduzem e vivem aqui por causa dessa confluência favorável. Os corais (octocorais), especificamente, aparecem em águas mais rasas e se multiplicam com facilidade no litoral catarinense.
“As esponjas são animais invertebrados que eventualmente possuem atividades farmacológicas”, explica a pesquisadora e pós-doutoranda Maria Tereza Rojo de Oliveira, que atua na equipe do professor Schenkel. Maria Tereza informa que já existem cinco fármacos produzidos com base em organismos marinhos e que os Estados Unidos, a Austrália, o Japão e a Espanha são os países onde as pesquisas estão mais avançadas, especialmente em relação ao tratamento do câncer. O laboratório espanhol Pharmamar, que trabalha com biotecnologia marinha, desenvolveu o Aplidin, que tem atividade antitumoral, a partir dessas matérias-primas.
Área com potencial
Estima-se que cerca de 80% dos fármacos em uso atualmente são produtos naturais ou que foram inspirados pela natureza. Se eles há muito contribuem para a indústria farmacêutica, os organismos marinhos passaram a ser investigados de maneira mais efetiva apenas recentemente. Os avanços das técnicas de mergulho, assim como a evolução dos equipamentos, ajudaram nessa empreitada. Ainda assim, na última década os organismos marinhos passaram a ser investigados com vistas ao desenvolvimento de fármacos. “A natureza fornece modelos”, diz Simone Quintana de Oliveira, também integrante da equipe de Eloir Schenkel. Historicamente, entre os primeiros fármacos feitos a partir de moléculas de origem marinha estão a Zidovudina, que ficou conhecida como AZT, para o combate à Aids, e o Aciclovir, que usado no tratamento do herpes.
Em Santa Catarina, as coletas dos organismos marinhos foram realizadas principalmente nas ilhas do Xavier e do Campeche, com o apoio de mergulhadores profissionais, que foram a até 20 metros de profundidade para recolher pequenas amostras de material. Os resultados iniciais mostraram-se interessantes e estão em fase de publicação. Como o conhecimento sobre a área ainda é incipiente e vai se acumulando, será preciso, no futuro, investir em recursos humanos e no intercâmbio com outras universidades. Em 2011, a UFSC e várias instituições de ensino superior obtiveram a aprovação do projeto Rede Nacional de Pesquisa em Biodiversidade Marinha (Sisbiota-Mar), sob coordenação do professor Sergio Floeter, do Centro de Ciências Biológicas, para aumentar o conhecimento sobre a biodiversidade marinha brasileira.
Uso correto de medicamentos
Formado em Farmácia, em 1971, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde também fez o mestrado em Ciências Farmacêuticas, Eloir Schenkel é um dos primeiros profissionais com mestrado em Farmácia no Brasil. Na época eram poucos os doutorados nessa área no Brasil. Por isso, logo após a conclusão do mestrado, Eloir procurou fazer o doutorado no exterior, na Universidade de Muenster, na Alemanha, realizado no período 1975-1980.
A par da qualidade da formação científica, a questão social do acesso da população a medicamentos de qualidade, bem como a formação dos alunos com essa preocupação, são uma constante: “Estamos formando alunos que precisam ter consciência crítica”, adverte Schenkel. “Medicamentos são importantes e são utilizados em mais de 90% dos tratamentos, mas o seu uso às vezes ocorre em situações em que não são necessários. A universidade lida com o conhecimento existente e também com linhas de investigação buscando novos conhecimentos. Neste contexto, além da investigação de novos produtos e processos, é necessário formar profissionais para melhorar a assistência à saúde e estimular o uso correto dos remédios”.
Um dos legados do trabalho que realizou até agora foi a coordenação da organização do livro “Cuidados com os medicamentos”, que ainda é referência nesta área e serviu de base para a cartilha “O que devemos saber sobre medicamentos”, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), voltada para conscientização e orientação ao cidadão sobre o uso dos remédios.
O professor Schenkel também é organizador, junto com colegas da área farmacêutica (C. M. O. Simões, G. Gosmann, J. C. P. Mello, L. A. Mentz e P. R. Petrovick), do livro “Farmacognosia: da Planta ao Medicamento”, publicado pelas editoras da UFSC e da UFRGS e que teve em 2011 a sua sexta reimpressão.
Apoios importantes
A equipe de Eloir Schenkel na Farmácia é composta por oito pessoas, incluindo dois doutorandos que trabalham apenas com organismos marinhos, e mantém intercâmbios com grupos de pesquisa da Universidade de Buenos Aires (UBA) e da Universidade Nacional da Colômbia (UNALl), estabelecidos com o apoio de programas do CNPq (Prosul) e Capes. Para as suas pesquisas, diz que foram importantes esses apoios das agências citadas e também o da Fapesc, pela concessão de bolsas de doutorado e apoio a projetos específicos, como no caso do projeto “Avaliação das atividades antiviral, antibacteriana, antifúngica, antiprotozoária e citotóxica de metabólitos de invertebrados marinhos e algas do litoral sul-americano”, que recebeu recursos do edital Chamada Pública Biodiversidade nº. 9/2009.
Ao longo da carreira, o professor Schenkel ocupou, entre outras, as funções de coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da UFRGS (1993-1995), membro do conselho editorial da Editora da mesma universidade (1997-2001), membro titular da Comissão de Assessoramento Técnico-Científico de Medicamentos do Ministério da Saúde, Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária (2003-08.2004), membro (coordenador) da Comissão de Especialistas de Ensino de Farmácia (2000-2002), representante da área de Farmácia junto à Capes (2001-2004), membro do Comitê de Medicina e Farmácia/CNPq (2002-2005; 2008-2011), membro do Comitê de Farmácia/CNPq, editor associado do periódico Latin American Journal of Pharmacy (anteriormente Acta Farmacéutica Bonaerense) (2000-2010) e vice-presidente da Associação Brasileira de Ciências Farmacêuticas (ABCF) (2009-2011).
Mais informações com o professor Eloir Paulo Schenkel: eloirschenkel@gmail.com / (48) 3721-5076
Por Paulo Clovis / Jornalista da Agecom
Saiba Mais:
O prêmio Destaque Pesquisador:
O reconhecimento de docentes com elevada contribuição às atividades de ensino, pesquisa e extensão com o Prêmio Destaque Pesquisador iniciou em 2010, como uma das ações do cinquentenário da Universidade.
Em 2011, cada um dos centros de ensino da universidade foi novamente convidado a indicar um professor. A Pró-Reitoria de Pesquisa e Extensão sugeriu aos centros de ensino que fizessem sua seleção partindo de critérios próprios, mas também levando em conta o impacto ou o potencial de impacto das pesquisas realizadas pelo pesquisador, publicações em veículos de reconhecida excelência, a formação de recursos humanos na pós-graduação e o reflexo dos estudos no reconhecimento da UFSC como centro de excelência na área.
O objetivo é intensificar a divulgação da produção científica e tecnológica da instituição, mostrando à sociedade quem são as pessoas que fazem com que a UFSC figure entre as mais produtivas universidades brasileiras.
Professores homenageados com o Prêmio Pesquisador UFSC 2011:
Alckmar Luiz dos Santos / Centro de Comunicação e Expressão
Aloísio Nelmo Klein / Centro Tecnológico
Edio Luiz Petrosk / Centro de Desportos
Eloir Paulo Schenkel / Centro de Ciências da Saúde
José Rubens Morato Leite / Centro de Ciências Jurídicas
Miguel Pedro Guerra / Centro de Ciências Agrárias
Newton Carneiro Affonso da Costa Junior / Centro Sócio-Econômico
Reinaldo Naoto Takahashi / Centro de Ciências Biológicas (CCB)
Ruth Emília Nogueira / Centro de Filosofia e Ciências Humanas
Ruy Exel Filho / Centro de Ciências Físicas e Matemáticas
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Mais informações sobre o Prêmio Destaqe Pesquisador UFSC/2011:
– Débora Peres Menezes / Pró-Reitora de Pesquisa e Extensão / debora@reitoria.ufsc.br / 3721-9716
– Jorge Campagnolo / Diretor de Projetos de Pesquisa / campagnolo@reitoria.ufsc.br / 3721-9437