UFSC lidera rede inédita internacional para melhorar saúde das ostras

07/07/2025 15:43
Ostra da espécie Magallana gigas

Por meio de dois projetos internacionais, rede de pesquisa vai investigar saúde das ostras cultivadas em Florianópolis e identificar possíveis causas de mortalidade (Foto: Divulgação/CCB/UFSC)

Uma rede inédita que envolve pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), no Brasil, e de instituições da França e do Chile está dando início a um grande projeto que visa incrementar a saúde das ostras. O objetivo será identificar patógenos potencialmente envolvidos nas mortalidades desses animais no verão. Dessa forma, será mais fácil definir estratégias preventivas para o cultivo, alinhadas ao conceito de Saúde Única.

Na UFSC, a rede vai envolver 13 pesquisadores de departamentos de ensino do Centro de Ciências Biológicas (CCB), do Centro de Ciências Agrárias (CCA) e do Centro de Ciências da Saúde (CCS), com colaboração de uma pesquisadora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). A parceria engloba ainda as universidades de Montpellier e de Perpignan, o Ifremer (instituição de pesquisa francesa dedicada ao conhecimento dos oceanos) e o Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), na França; e a Pontificia Universidad Católica de Valparaíso (PUCV), a Universidad Católica del Norte (UCN) e o Centro de Estudios Avanzados en Zonas Áridas (Ceaza), no Chile. No total, serão cerca de 30 pesquisadores envolvidos com as atividades nos três países. Além deles, a rede também vai contar com a participação de pós-doutorandos e alunos de mestrado e doutorado de cinco programas de pós-graduação da UFSC: Aquicultura, Biotecnologia e Biociências, Bioquímica, Farmácia e Ciências dos Alimentos.

EcoHealth4Sea

Parte dos pesquisadores que vão integrar a rede de pesquisa, durante lançamento da iniciativa, em maio, em Florianópolis (Foto: Divulgação/CCB/UFSC)

As atividades serão organizadas no eixo de dois projetos internacionais de pesquisa: o EcoHealth4Sea – Consórcio Internacional em Saúde Única Aplicada a Ecossistemas Costeiros, financiado pelo CNRS, e o Sentinels – Saúde Ecológica em Ambientes Marinhos Costeiros Utilizados para o Cultivo de Ostras, financiado pelo Programa Capes/Cofecub, que incentiva pesquisas conjuntas entre Brasil e França. A UFSC vai abrigar a sede brasileira da iniciativa, em um laboratório internacional que será estruturado no Centro de Ciências Biológicas (CCB). A pesquisa conta ainda com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc). O projeto DiagnOSTRA foi aprovado na Chamada Pública 21/2024 – Programa de Pesquisa Universal, viabilizando a aquisição de materiais de consumo e equipamentos.

Saúde Única

O professor Rafael Diego da Rosa, do CCB, atua com pesquisas em imunogenética de ostras e é um dos articuladores da parceria. Segundo ele, a aquicultura é uma atividade econômica altamente impactada por patógenos emergentes ou em circulação no ambiente marinho, como vírus e bactérias, e isso afeta a saúde não só dos animais cultivados, mas também das populações humanas que dependem desses ambientes.

A noção de Saúde Única aplicada a ecossistemas costeiros implica observar as condições de saúde de todo o cenário, não apenas de humanos ou de outras espécies isoladas. “A ostra é um organismo sentinela. Como ela filtra a água em grandes quantidades, acaba concentrando tudo o que está na água. Então estudar a ostra também é estudar a saúde da água, do ecossistema marinho de forma mais ampla”, explica.

Sementes de ostras da espécie Magallana gigas, produzidas no Laboratório de Moluscos Marinhos da UFSC

Sementes de ostras da espécie Magallana gigas são produzidas no Laboratório de Moluscos Marinhos da UFSC (Foto: Divulgação/CCB/UFSC)

Segundo Rafael, não são totalmente claras as causas da alta mortalidade de moluscos durante os meses mais quentes do ano – fenômeno equivalente ao que já foi estudado em outros países produtores. Desde o início do cultivo de ostras da espécie japonesa Magallana gigas (anteriormente descrita como Crassostrea gigas) em Santa Catarina, na década de 1990 – por meio do Laboratório de Moluscos Marinhos da UFSC -, os meses de verão tendem a registrar alto índice de mortalidade, causando a perda de até 50% da produção, segundo dados da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri-SC). Isso pode ser provocado pela predação dos moluscos por outros animais, mas também por fatores como infecções por patógenos, poluição ou falta de resistência a fatores ambientais, como temperatura e variações na salinidade e no pH da água.

Investigação

A partir dessas questões, os pesquisadores da UFSC vão desenvolver nos próximos anos uma série de coletas e análises de ostras cultivadas nas baías Norte e Sul, em Florianópolis, visando entender se as causas da mortalidade desses moluscos são equivalentes ao que já foi pesquisado pelos pares do estudo na Europa. Lá, as pesquisas mostram que a principal causa da mortalidade de ostras no verão são infecções polimicrobianas conhecidas como “Pacific Oyster Mortality Syndrome” (POMS), tendo as bactérias do gênero Vibrio e o herpesvírus de ostra OsHV-1 como os principais agentes etiológicos.

Dessa forma, a rede vai operar com intercâmbio de informações para verificar fenômenos comuns e vislumbrar soluções para garantir a saúde das ostras, evitando prejuízos e propagação de patógenos que afetem outros organismos. “Como se tratam de locais muito distantes e com condições ambientais diferentes, é possível que aqui tenha um cenário distinto, com a mortalidade ocorrendo por outros fatores infecciosos como vírus e bactérias diferentes dos encontrados na Europa, ou algum aspecto relacionado às mudanças climáticas”, considera o professor Rafael.

Panorama da produção

Cultivo de moluscos no Ribeirão da Ilha, Florianópolis, SC, baía sul

Amostras de ostras serão coletadas nos cultivos situados nas baías Norte e Sul, como os do Ribeirão da Ilha (Foto: Divulgação/CCB/UFSC)

O Brasil passou a ser o 13º maior produtor global de aquicultura em 2024 – atividade que engloba cultivo de moluscos, peixes, crustáceos e algas, entre outras espécies comerciais. Em 2022, a produção mundial de pesca e aquicultura atingiu um recorde na produção aquícola de animais aquáticos, superando pela primeira vez a pesca de captura, segundo dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Para a entidade, a produção de alimentos via aquicultura vem sendo reconhecida como uma das soluções para melhorar a segurança alimentar e nutricional das populações, mitigar a pobreza e impulsionar o desenvolvimento socioeconômico, em especial nas comunidades costeiras. O setor empregou cerca de 61 milhões de pessoas em 2022, segundo a FAO.

O estado de Santa Catarina é o principal produtor de ostras, vieiras e mexilhões do Brasil, responsável por 93,2% da produção nacional em 2023, segundo dados da Epagri. A maior concentração de cultivos de ostras fica nos municípios de Florianópolis, Palhoça e São José. Em 2023, o estado produziu 1.731 toneladas do molusco, sendo 98,5% da espécie Magallana gigas – o restante corresponde à produção de ostras nativas, como a Crassostrea gasar.

Ana Paula Lückman | ana.paula.luckman@ufsc.br
Jornalista da Agecom | UFSC

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