Pesquisa mostra o crescimento e a contribuição do audiovisual para a economia de SC

18/05/2022 11:09

Atividades de produção e pós-produção cinematográfica, de vídeos, de programas de televisão e de publicidade são as mais representativas de SC. Foto: Osarugue Igbinoba/Unsplash

Um grupo de pesquisadores da UFSC divulgou na última terça-feira, 17 de maio, os resultados do estudo Retratos do audiovisual catarinense: economia e políticas públicas. Financiado pelo Prêmio Catarinense de Cinema, lançado pela Fundação Catarinense de Cultura (FCC), o projeto é um mapeamento do setor baseado em dados de até 2021. Além de trazer informações sobre trabalho e renda, perfil das empresas de produção audiovisual, cursos de ensino superior e TVs públicas, o material indica caminhos para o desenvolvimento e o fortalecimento de políticas públicas e para uma maior articulação entre mercado e universidade. 

“Esse é o primeiro estudo feito em Santa Catarina que reúne economistas e pessoas ligadas ao campo do cinema, do audiovisual, que juntaram esforços para desenvolver uma metodologia nova para auferir os dados econômicos e institucionais”, comenta o professor do curso de Cinema Alfredo Manevy. Além dele, estiveram envolvidos no projeto Eva Yamila da Silva Catela, professora do Departamento de Economia e Relações Internacionais, Hoyêdo Nunes Lins, docente dos programas de pós-graduação em Economia e em Relações Internacionais, e Caroline Mariga pesquisadora e realizadora audiovisual graduada em Cinema pela UFSC.

Em diálogo com diversos agentes e entidades do audiovisual do estado, a equipe levantou e analisou dados de instituições como a Agência Nacional do Cinema (Ancine) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Também foram considerados trabalhos preexistentes, como um realizado no âmbito da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc) e entrevistados produtores, distribuidores, professores e gestores. Tudo isso possibilitou a disponibilização de informações quantitativas e qualitativas sobre questões como geração de emprego, tipos de mão de obra, arrecadação de impostos, processos criativos e modelos de negócios, conquistas em políticas públicas, gargalos existentes e desafios para o futuro.

Crescimento e arrecadação 

O crescimento do setor na última década impressiona. O trabalho revela que, entre 2010 e 2019, aumentou 429% o número de agentes econômicos atuando no audiovisual catarinense – passando de 90 para 476 agentes no período. 40% deles estão localizados em Florianópolis. Os demais se distribuem, principalmente, entre Joinville, Blumenau, Itajaí, Chapecó e Balneário Camboriú. As atividades de produção e pós-produção cinematográfica, de vídeos e de programas de televisão e as relacionadas à publicidade são as mais representativas, com 43% do total de agentes.

A receita com Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) gerada pelo setor audiovisual do estado chegou a R$ 116,8 milhões em 2017 – um valor 2,5 vezes maior do que o de 2011. Desde 2017, entretanto, a arrecadação diminuiu, atingindo R$ 79,6 milhões em 2020. Isso pode ter ocorrido por efeito do crescimento do streaming e dos vídeos on demand, como alternativa à televisão por assinatura, e também como reflexo da crise econômica que impacta o país desde 2016. 

Apesar de o Brasil não contar com dados precisos sobre consumo de streaming, os dados sobre arrecadação catarinense com comunicação — que envolve comunicação móvel e consumo de banda larga — dão uma pista sobre o potencial do modelo de negócio: o montante gerado em impostos de ICMS relacionados ao consumo de internet foi de quase R$1,085 bilhão em 2020. Parte significativa dessa quantia resulta de consumo audiovisual via streaming – um dos principais usos de banda larga. Além disso, nos últimos dez anos, o audiovisual catarinense recebeu mais de R$ 100 milhões em recursos federais. 73% do valor foi destinado a Florianópolis. 

O relatório destaca, também, o papel das TVs públicas – como TV UFSC, TV Furb e TV Assembleia –, cada vez mais incentivadoras da produção local, por demandarem conteúdo na forma de filmes, documentários e séries. Por conta da presença dessas emissoras, o audiovisual catarinense recebeu mais de R$ 10 milhões da Ancine na última década. Alfredo pontua que, além de catalisadoras do investimento federal, essas emissoras articulam e qualificam “uma grade de programação que coloca o audiovisual catarinense na janela e no acesso ao público”.

Formação e mercado de trabalho

A publicação traz ainda informações sobre cursos universitários, formação de pessoas para trabalhar com games e perfis de profissionais demandados, além de abordar as recentes mudanças de modelo de negócio, que, segundo o professor, está “cada vez mais integrado, cada vez mais digital, no qual o consumo de games está atrelado a filmes e séries, e ele acontece cada vez mais on-line”.

Outro aspecto que chama a atenção é o fenômeno da pejotização, termo utilizado para descrever o ato de contratar trabalhadores por meio de um Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ). Entre 2009 e 2019, houve redução de um terço nos vínculos formais de trabalho na área. Por um lado, a flexibilização dos vínculos permite a manutenção de muitos empreendimentos, uma vez que a produção audiovisual se caracteriza por trabalhos e receitas geralmente sazonais. 

É importante salientar, porém, que essas condições podem representar aprofundamento da precariedade do trabalho, uma vez que não há garantias de direitos trabalhistas, e o direito à aposentadoria é fragilizado. Por isso, os pesquisadores recomendam “um observatório do mercado de trabalho audiovisual, e a promoção de um ambiente econômico mais saudável para os trabalhadores do audiovisual, por meio de estabilidade institucional de políticas públicas e linhas de fomento para o setor”.

Fundação Catarinense de Cultura 

O papel estratégico que a Fundação Catarinense de Cultura deve desempenhar no desenvolvimento do setor audiovisual é outro ponto discutido. Apesar de ter crescido em funções, a Fundação e o Museu da Imagem e do Som (MIS), gerido por ela e responsável por editais e ações de fomento ao audiovisual, não tiveram o mesmo aumento em estrutura.

“O grupo de servidores do MIS realiza o seu trabalho com reconhecida eficácia, atuando em áreas fundamentais, não obstante a insuficiência das condições existentes perante as novas demandas e os novos mecanismos. Recomenda-se uma ampliação da estrutura interna na FCC, com a criação de uma instância específica para a gestão da política audiovisual. No longo prazo, cabe discutir a criação de um organismo específico para a gestão e o fomento da política audiovisual. Um conselho consultivo, ligado à FCC, seria importante para institucionalizar a participação dos diversos elos e segmentos do setor na formulação de políticas públicas”, destaca o texto.

Desenvolvimento e políticas públicas

A pesquisa evidencia a importância econômica do audiovisual em Santa Catarina, e também reflete a relevância do setor para o país. Como ressalta Alfredo, contudo, “para esse mercado se desenvolver, é preciso um ecossistema, um contexto favorável de políticas públicas, em que o Estado seja um indutor do desenvolvimento desse setor, investindo, criando condições favoráveis, investindo na formação, investindo na preparação de profissionais, colocando recurso em filmes e séries, e também dando incentivos para infraestrutura. Em vários países do mundo, como Canadá, França, Estados Unidos, Inglaterra, o Estado investe nessa indústria cultural, e é por isso que esses países têm dianteira nesses mercados”.

Para o professor, os dados mostram o potencial de Santa Catarina, que, com os adequados investimentos e políticas públicas, tem capacidade para se transformar em referência nacional, e até internacional. “Agora a gente espera que o estudo contribua para que caia a ficha do governo estadual, das prefeituras, daqueles que pensam o rumo do Estado, do seu desenvolvimento, de que vale a pena investir em cultura.”

O investimento em cultura traz retornos para a economia e para a sociedade como um todo. “Se esse investimento for melhor estruturado, melhor desenvolvido, mantido regularmente, se for dada estabilidade a ele, e Santa Catarina estabelecer uma organização própria para desenvolver o audiovisual – como Rio de Janeiro e São Paulo têm a Spcine e a RioFilme –, imaginem o salto que pode ser feito em poucos anos. O Estado tem tudo para ser um grande gerador de emprego nessa área. Então a gente espera que o estudo sirva como guia para as políticas públicas dos próximos anos”, afirma Alfredo.

 

Camila Raposo/Jornalista da Agecom/UFSC

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