Projeto pesquisa desenvolvimento de fármacos contra o Coronavírus a partir de plantas comestíveis
Desenvolver fármacos contra o SARS-CoV-2, a partir de híbridos sintéticos de plantas comestíveis: é com esta estratégia que um grupo de pesquisadores coordenados pelo professor Antonio Luiz Braga, do Departamento de Química da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), obteve apoio da Capes pelo Edital nº 11/2020 – Fármacos e Imunologia do Programa Emergencial Estratégico de Prevenção e Combate a Surtos, Endemias, Epidemias e Pandemias – um financiamento de R$ 100 mil e quatro bolsas de doutorado e seis de pós-doutorado. Além da UFSC, a Universidade Federal da Paraíba e a Universidade Federal do ABC estão envolvidas no projeto.
O alvo dos pesquisadores é o bloqueio da protease Mpro, principal enzima do novo coronavírus. A ideia é buscar em quatro plantas, ricas em flavonoides, compostos com potencial para inibir esta protease contra o SARS-CoV-2. Após a avaliação biológica, os mais ativos contra o novo coronavírus servirão de base para serem transformados em derivados híbridos com heterocíclicos bioativos ou porções de organoselênio, planejados e otimizados via computadores para combater o vírus. “São plantas simples, mas que têm alguns princípios ativos com propriedades de inibir as enzimas, mas que não bastam (sozinhas para debelar o SARS-CoV-2). Vamos conectar em laboratório esses produtos naturais com outras moléculas, compostos heterocíclicos ou de selênio, para levar a moléculas de maior complexidade estrutural, com atividade biológica aumentada”, explica o professor.
A estratégia é chamada de biodirigida, pois o desenvolvimento das moléculas se baseia numa enzima importante do vírus. “Um produto natural é uma mistura complexa de compostos orgânicos e estamos isolando cada um deles. Com eles separados, fazemos estudo in silico (simulação por computador) da triagem inicial de quais compostos melhor se encaixam na enzima para bloqueá-la ou inibi-la”, diz Braga.
Mesmo antes da aprovação, os estudos já estavam em andamento: “Já fizemos reações com alguns produtos naturais visando disponibilizar maior quantidade de moléculas bioativas. Também já estamos iniciando estudos via computador, através do colaborador da Federal da Paraíba, Marcus Scotti”, aponta Braga. Isso só foi possível, afirma o pesquisador, por conta do conhecimento “de longa data em compostos parecidos. Em função da pandemia, direcionamos nossa experiência para encontrar compostos que interagem com a enzima do vírus”.
Os testes in sílico utilizam um pool de computadores de alta performance para rodar os programas necessários. “A enzima do vírus é uma molécula complexa, uma proteína, e demanda muita memória. Precisa testar cada composto desses, ver como se adequa e interage com a enzima. A gente chama isso de modelagem molecular: como ele se aproxima e se encaixa nessa enzima, como uma chave e fechadura. Então nós temos que inibir essa enzima utilizada pelo vírus para entrar se replicar no nosso organismo”, conta o pesquisador.
Após a primeira rodada de simulações da UFPB, os pesquisadores da UFSC irão desenvolver uma coleção de compostos híbridos. “Com estas estruturas, vamos fazer híbridos, conectar com outras moléculas e compostos de selênio e gerar uma grande quantidade de novas moléculas para serem testadas”, acrescenta Braga. A expectativa é que, de 60 moléculas iniciais, serão produzidas de 600 a mil. O pesquisador colaborador da UFABC, Rodrigo Cunha, irá testar a interação destas moléculas num laboratório com a enzima do vírus. Braga chama a pesquisa de interativa, porque envolve o feedback dos colegas pesquisadores para o design das melhores moléculas: “A partir desses estudos, vamos continuar fazendo novas moléculas com base nos compostos chamado de líderes, os que melhor se mostraram para inibir a enzima”.
Em seguida, a ideia é fazer colaborações com laboratórios que possuem o vírus em si, não somente a enzima do vírus. “Imaginamos que em janeiro nós já tenhamos algumas moléculas para serem testadas nos próprios vírus e, ao mesmo tempo, fazendo estudos toxicológicos. Além de debelar o vírus, vamos ver quais delas também que não têm tanto efeitos colaterais”, observa Braga. Depois disso, será possível passar esta pesquisa para a indústria farmacêutica que pode fazer ensaios clínicos.
Braga destaca que a UFSC, além da coordenação, é responsável pelo extração e desenvolvimento das moléculas. Além dele (encarregado do subprojeto “Síntese de híbridos: Flavonoides-núcleos heterocíclicos contendo selênio, enxofre e nitrogênio ”), os professores Louis Pergaud Sandjo (encarregado do subprojeto “Obtenção de extrato e seleção bio-guiada dos extratos ativos; isolamento e identificação de produtos naturais a partir de extratos ativos”) e Francisco Fávaro de Assis (do subprojeto “Síntese de compostos ativos”) participam da pesquisa.
Na UFPB, Marcus Tullius Scotti está incumbido do subprojeto “Modelagem e triagem de derivados por estudo in silico com alvo de protease Mpro do SARS CoV-2”. Na UFABC, Rodrigo Luiz Oliveira Rodrigues Cunha é o encarregado do subprojeto “Avaliações biológicas in vitro dos compostos isolados e derivados sintéticos”.
O Programa de Pós-Graduação em Química da UFSC já abriu um edital para o desenvolvimento dos fármacos antivirais e suas formulações. “Nós precisamos de estudantes que irão desenvolver esses projetos sob nossa supervisão. Agora são quatro doutorandos e dois pós-doutorandos. Nos próximos anos teremos mais quatro pós-doutorandos”.
Caetano Machado/Jornalista da Agecom/UFSC