Pesquisa da UFSC sobre entomologia forense identifica dados que podem ajudar a desvendar crimes

25/03/2013 17:21

A aluna do Curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Larissa Brunese Juk, realizou um estudo inédito sobre a decomposição de animais que pode contribuir para desenvolver a ciência forense no Estado. Em seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), defendido junto ao Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia (MIP), Larissa passou 62 dias acompanhando a deterioração de um cadáver de porco e, ao longo desse tempo, catalogou os insetos presentes na decomposição. Os resultados da pesquisa estabelecem características importantes para a Entomologia Forense na região, dados que podem ser utilizados para desvendar casos como assassinatos. O MIP já tem outros seis trabalhos semelhantes em andamento, que agregam experiências diversificadas, como o de cadáveres de animais colocados sobre dunas e submersos.

De acordo com a pesquisadora, a prática da Entomologia Forense pode contribuir, por exemplo, para estimar o intervalo pós-morte – chamado de IPM – em um assassinato. Pelo método tradicional, a vítima é analisada nos seguintes aspectos: temperatura interna do corpo, estímulo elétrico no tecido muscular, grau de rigor mortis e mudanças físicas nos olhos, mas após 72 horas todos esses recursos se tornam inexistentes ou imprecisos. Ou seja, a ciência é eficaz quando o corpo está exposto em um período maior de tempo, mesmo tendo sofrido alterações, seja pelo ambiente, ou pelo agressor. Na Entomologia, além do IPM, ainda são envolvidos métodos como a identificação de perfis genéticos, amostras de DNA, exames toxicológicos, entre outros, todos viáveis sem a necessidade de analisar a vítima.

A pesquisa

A estudante Larissa Brunese Juk passou 62 dias acompanhando a deterioração de um cadáver de porco e catalogando os insetos presentes no processo. Foto: divulgação.

Um suíno de aproximadamente 10 quilos foi colocado sobre um compensado de madeira forrado de serragem em uma gaiola de metal (foto), numa área de restinga na Estação Ecológica de Carijós, no bairro Ratones, em Florianópolis. O corpo foi analisado durante 62 dias e foram realizadas 29 coletas de insetos e medição de fatores ambientais, como a temperatura do solo, cadáver, ar, a umidade relativa, entre outros. A tela impede a entrada de animais maiores, como aves de rapina e roedores, que podem interferir nos resultados.

A aluna acompanhou a presença de insetos adultos e larvas que foram atraídas pela carcaça do suíno entre o outono e o inverno de 2012. Ela coletou ao todo 532 espécimes, sendo 528 (99,75%) insetos, como moscas, besouros, formigas e quatro (0,75%) aranhas. A pesquisa prova que o número de larvas de besouros – que começa reduzido – supera as larvas de moscas em determinado período da fase de decomposição. O fato é explicado por que a carne seca que sobra próxima ao fim desse período só pode ser digerida pelas larvas de besouros, que possuem estrutura bucal eficiente para esse tipo de alimento. Ou seja, o número alto de larvas de besouros no cadáver significa que o tempo de exposição ao ambiente foi maior.

O estudo não pode ser realizado com seres humanos por questões éticas e legais, e teve que ser autorizado pelo Ibama. Por ter estrutura corporal semelhante ao dos seres humanos, o porco foi escolhido para servir como cobaia. Segundo Larissa, os resultados não perdem credibilidade porque a anatomia interna, tamanho da cavidade torácica, quantidade de pêlos, proporção similar dos membros fazem do suíno um dos melhores animais para simular um cadáver humano. Além disso, os porcos oferecem maior volume de substrato e, assim, permitem que o acompanhamento das fases de decomposição seja duradouro, já que não são totalmente consumidos pelos primeiros insetos.

Larissa diz que sempre se interessou pela área criminal. A inspiração, claro, veio do cinema e da televisão. Conta que tem o desejo de trabalhar na polícia, mas é um plano para o futuro. A iniciativa contou com o apoio do professor Carlos José de Carvalho Pinto, orientador do TCC, que lembra que a Entomologia Forense não se trata apenas de crime, mas de auxílio às ciências legais como um todo.

Parcerias

Em seu trabalho de conclusão de curso, Larissa levantou dados que caracterizam a Entomologia Forense na região de Florianópolis. Foto: Murici Balbinot.

A pesquisa despertou o interesse do Instituto Geral de Perícias (IGP), de Florianópolis. Após o início do TCC de Larissa, o professor Carlos Pinto foi ao IGP para tentar consolidar uma possível parceria. Com o apoio dos peritos, o professor começou a elaborar um termo de cooperação entre UFSC e IGP que deve ser assinado até o final deste semestre. O documento prevê que em casos de vítimas já putrefatas, o perito faria o recolhimento das larvas e encaminharia ao laboratório no MIP. Após análises, um banco de dados seria formado e em alguns anos, UFSC e IGP construiriam um padrão de fauna em corpos em decomposição na região. “No futuro, o IGP irá analisar os resultados do professor Carlos e quando reconhecer que os dados são seguros e precisos, será possível utilizá-los nas perícias”, explica o perito criminal Pedro Bonnassis.

O acordo beneficia ambos, já que o laboratório ganha material de estudo e o IGP, os resultados. Segundo Pedro, a cooperação é positiva, mas renderá frutos a longo prazo. “Em alguns casos, a perícia tem sido contestada pelos acusados e, por isso, precisa se desenvolver. A UFSC tem estrutura e recursos melhores que o IGP para realizar pesquisas na área. A partir do momento que o professor, por exemplo, conseguir estimar o tempo de morte, já irá ajudar bastante”.

O trabalho conjunto entre polícia e universidade já acontece com sucesso em Brasília. A Polícia Civil brasiliense mantém um acordo com a Universidade de Brasília (UnB), no qual os laboratórios são utilizados para auxílio da perícia. A Unicamp também já realizou experiências manipulando drogas em cobaias para estudar casos de vítimas de envenenamento e overdose. Os traços tóxicos podem se apresentar nos insetos, principalmente nas larvas, acrescenta Larissa.

Mais informações:
Larissa Brunese Juk: larijuk@yahoo.com.br
Professor Carlos Pinto: carlospinto@ccb.ufsc.br

Murici Balbinot / Estagiário de Jornalismo na Agecom/UFSC
muricibalbinot@gmail.com

Fotos: Divulgação e Murici Balbinot.

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