.
Assunto que atrai a atenção de professores e estudantes, especialistas e leigos, o uso pioneiro da aviação no conflito do Contestado foi tema de palestra feita na manhã desta sexta-feira, dia 1º., no auditório da reitoria da UFSC, pelo professor Cláudio Calaza, da Universidade da Força Aérea (Unifa), do Rio de Janeiro. Falando dentro da programação do Simpósio sobre o Centenário do Movimento do Contestado, ele fez um histórico das circunstâncias que levaram o Exército brasileiro a decidir pela utilização de aviões no trabalho de identificação das áreas ocupadas pelos revoltosos e, posteriormente, no ataque a esses focos, casos as operações se mostrassem viáveis.
Durante a exposição, ficou claro que o Exército não estava preparado para esse tipo de ação e que não conseguiu fazer um planejamento mínimo que garantisse o êxito da iniciativa. Por isso, a estratégia fracassou, resultando na morte do tenente Ricardo Kirk (o primeiro aviador brasileiro, com formação na França) durante sobrevoo da região conflagrada, na divisa de Santa Catarina com o Paraná. Essa questão também suscita diferentes leituras sobre as motivações dos comandantes militares, entre elas a de que o grande poderio militar da Argentina, na época uma das maiores forças da economia mundial, representava uma ameaça para os estados da região sul do Brasil.
Professor de história militar na Academia de Força Aérea, Calaza percebeu que depois do livreto “A aviação militar no Contestado – Réquiem para Ricardo Kirk”, lançado pelo historiador catarinense Nilson Thomé em 1986, nada mais foi publicado sobre o tema. Por isso, após concluir tese de doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ele concentrou suas forças na busca de novas fontes. Outra motivação foi o fato de saber que o Contestado sempre foi considerado um conflito bélico secundário pela historiografia brasileira.
O emprego de aviões militares nunca havia acontecido no continente sul-americano, mesmo que Chile e Argentina estivessem mais adiantados nesse campo. E foi incorporado à prática do Exército apenas três anos após as experiências realizadas na guerra ítalo-turca, no norte da Europa, em 1911. “Os motores ainda eram fracos e os aparelhos, frágeis, construídos com madeira, bambu, lona e fios de arame”, afirma Calaza.
O pesquisador carioca buscou o que chama de “elo perdido” para explicar a decisão dos militares na figura do tenente João Moraes de Niemayer, que veio para o sul do Brasil, de trem, ao lado do marechal Setembrino de Carvalho, responsável pela repressão ao levante do Contestado, em 1914. Influenciado por Niemayer, Setembrino requisitou aparelhos, Ricardo Kirk e o italiano Ernesto Darioli junto ao Aeroclube Brasileiro, no Rio. Eles vieram, montaram os aviões (transportados por via férrea) e começaram as operações de reconhecimento, até o acidente fatal, próximo a Porto União.
“Habituado a operações no Rio de Janeiro, o Exército não conhecia as adversidades de relevo e clima na região sul”, informa Cláudio Calaza. Aqui, havia campos de pouso apenas em Canoinhas e Rio Negro, que nunca foram aproveitados. Os próprios aviadores falavam da ‘imensidão verde de araucárias’ para caracterizar o terreno, e por isso se guiavam pelo curso dos rios e da estrada de ferro. Na busca pelo reduto de Santa Maria, Kirk chegou a sofrer um primeiro acidente, no qual sobreviveu, até morrer mais tarde, quando não conseguiu romper a serra da Taquara Verde”.
Versão militar – O encerramento do simpósio se deu com a conferência “A guerra, a memória, a história: os historiadores de farda e a escrita da história do Contestado”, a cargo do professor Rogério Rosa Rodrigues, da Udesc. Ele avaliou o legado de historiadores militares como Demerval Peixoto, Herculano D’Assumpção, José Pinto Soares, Ezequiel Antunes Oliveira, Antonio Alves Cerqueira e o catarinense José Viera da Rosa como espectadores do conflito e os registros que deixaram para as gerações seguintes.
As próximas etapas do simpósio serão realizadas na Universidade Federal de Pelotas (RS), entre os dias 29 e 31 de agosto, e na Universidade Federal da Fronteira Sul, em Chapecó, de 18 a 22 de outubro. A intenção dos organizadores é “debater o movimento nos aspectos que envolvem história, cultura, literatura, economia, memória e a sociedade da região atingida pelo movimento do Contestado”. O ano de 2012 marca o centenário do início do conflito, que teve duração de quatro anos.
Mais informações: simpsiocentenriocontestado1912-2012.blogspot.com.br e centenariocontestado@gmail.com.
Por Paulo Clóvis Schmitz/ Jornalista na Agecom