Pesquisa da UFSC ajuda a identificar riscos desconhecidos do vapor do “vape”

26/09/2025 09:45

A pesquisa de Bruna Espíndola vai ajudar a descobrir o que exatamente se esconde no vapor dos cigarros eletrônicos (Fotos: Gustavo Diehl)

Uma preocupação cada vez maior pelos efeitos na saúde humana, o cigarro eletrônico vem sendo estudado com abordagens inovadoras pela Universidade Federal de Santa Catarina. Uma pesquisa em andamento no Laboratório de Pesquisas Toxicológicas, sob coordenação da professora Camila Marchioni, vai desvendar uma das lacunas científicas sobre a composição do vapor, que é justamente o que tem contato direto com usuários pelas vias respiratórias.

A pesquisa de mestrado de Bruna Espíndola da Silva desenvolveu um método para capturar o vapor do cigarro, que em contato com a fibra de coco retém as substâncias de interesse. Com auxílio de solvente, as moléculas são retiradas da fibra de coco e levadas ao equipamento de cromatografia, que separa e identifica os componentes. Essa análise pode determinar o quanto separados e combinados estes compostos podem prejudicar a saúde humana. O estudo é realizado no  Programa de Pós-graduação em Farmacologia .

Hoje, as análises feitas pelo grupo tomam como base o que está presente no líquido que compõe o cigarro, que pode ser uma mistura de vários compostos, necessitando de ingredientes que possibilitem a vaporização. A nicotina e a cannabis são, também, comumente associadas a substâncias aromatizantes. O estudo pode contribuir para o desenvolvimento de políticas públicas para alertar sobre os riscos dos dispositivos à saúde.

A professora explica que a base do líquido é uma mistura de propilenoglicol e glicerina. É a partir desta mistura que os compostos são combinados, podendo resultar em uma ampla gama de produtos. De acordo com Camila, há uma complexidade química significativa nestes dispositivos, e mais de 2.000 substâncias já foram identificadas.

“O cigarro eletrônico não é permitido no Brasil, ele é um dispositivo proibido, que não pode ser comercializado, não pode ter propaganda. Então, quem está vendendo, está vendendo um produto ilícito, sem controle de qualidade e que pode ter qualquer substância ali dentro”, comenta.

Recentemente, os estudos realizados no laboratório em parceria com a Polícia Científica de Santa Catarina identificaram até mesmo anfetamina nos cigarros eletrônicos, em pelo menos dez amostras diferentes analisadas.

Consumo entre os jovens preocupa

Professora também trabalha com palestras de conscientização dos jovens

O olhar do grupo para o problema surgiu a partir de um projeto de extensão em que a equipe realiza palestras educativas em escolas públicas de Florianópolis. Os estudantes começaram a manifestar interesse no assunto.

A partir da resposta de 400 jovens do sexto até o terceiro ano do Ensino Médio, chegou-se a um número alarmante: pelo menos 30% já haviam experimentado ou eram usuários do cigarro. “Isso começou a nos preocupar. Porque os adolescentes estão usando muito. E a gente ia falar nas escolas e precisava falar com respaldo científico”, comenta.

Para levar dados precisos aos jovens, a equipe elaborou uma revisão de escopo nos principais periódicos disponíveis para descobrir o impacto dos cigarros eletrônicos na saúde de adolescentes entre 12 e 19 anos e identificou 58 relatos no mundo, a maior parte nos Estados Unidos, onde a Evali – Lesão Pulmonar Associada ao Uso de Cigarros Eletrônicos ou Vaporização- começou a se intensificar a partir de 2019.

Os achados clínicos demonstram um envolvimento respiratório significativo, muitas vezes precedido por sintomas gastrointestinais. Febre, falta de ar e tosse são os sintomas que mais apareceram entre os quadros estudados cientificamente no mundo todo. Náuseas, vômitos e oxigenação prejudicada também registram predominância. A professora considera preocupante o fato de esses danos englobarem sujeitos que consumiram os cigarros em média por um ano e sete meses.

“Em linhas gerais, o uso do cigarro eletrônico por jovens mostra um dano precocemente. Se a gente for comparar com cigarro convencional, se demora mais para a pessoa ter o pulmão comprometido”, explica. O comprometimento difuso do pulmão foi observado, nestes casos estudados na revisão, em mais de 65% dos exames de imagem.

Nos casos em que houve biópsia do pulmão, os médicos observaram um tipo de lesão chamado bronquiolite proliferativa com pneumonia em organização. Além da inflamação, foram notados sinais de endurecimento e cicatrização, além de um remodelamento estrutural do tecido pulmonar, o que pode indicar que o dano estava se tornando permanente.

Associação com cannabis

Laboratório tem parceria com análises da polícia científica

No artigo liderado pela professora, os casos estudados destacam o papel significativo da cannabis (THC) associada ao uso de cigarros eletrônicos, especialmente nos casos de lesão pulmonar grave. Em quase 70% dos casos, os jovens relatam uso concomitante.

Além disso, em 22 publicações que detalhavam a composição dos “vapes” consumidos, o óleo de THC foi a substância que mais apareceu – estava em mais de 80% dos dispositivos.

Puro, o óleo de cannabis não forma o aerossol necessário à vaporização, mas misturado com substâncias oleosas, como a vitamina E, ele adquire essa propriedade, analisada como um fator de risco. As hipóteses seriam de que essa mistura oleosa provocaria mais reações no pulmão.

A equipe liderada por Camila também realiza trabalhos em parceria com a Polícia Científica, em uma cooperação propiciada pela Rede Catarinense de Pesquisa em Ciências Forenses para aplicar as pesquisas toxicológicas da universidade na análise de materiais apreendidos, especialmente os cigarros eletrônicos. O foco central da colaboração é na análise dos dispositivos apreendidos pela polícia, com ênfase no que é inalado pelo usuário.

Amanda Miranda | amanda.souza.miranda@ufsc.br
Jornalista da Agecom | UFSC

Tags: Cannabiscigarro eletrônicoLaboratório de Pesquisas ToxicológicasnicotinapodsPrograma de Pós-Graduação em Farmacologiavape

Amostras de cigarros eletrônicos têm substância similar à anfetamina, alerta pesquisa

03/07/2024 10:49

Divulgação Polícia Científica

Um estudo preliminar divulgado a partir de uma parceria entre o Laboratório de Pesquisas Toxicológicas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e da Polícia Científica registrou a presença de octodrina em um grupo de dez amostras distintas de três marcas de cigarro eletrônico coletados na região de Joinville, Norte do Estado. Os dados também indicam a presença de derivados de glicerina, flavorizantes e nicotina nas amostras.

O material foi apresentado no Congresso Brasileiro de Toxicologia e é assinado pela professora do departamento de Patologia, Camila Marchioni, e por Gisele Chibinski Parabocz, Suellen Pericolo e Tiago Luis da Silva, da Polícia Científica. O estudo integra o escopo de um  Protocolo de Intenções assinado em abril entre as partes. “É um primeiro indicativo do que a rede tem a capacidade de promover. Estas análises ocorreram na Polícia Científica e contaram com nossa expertise técnica para a elaboração dos resultados”, explica a professora.

A pesquisadora lembra que os cigarros eletrônicos podem apresentar grupos de substâncias que circulam gerando riscos à saúde pública. Os dispositivos são amplamente comercializados, apesar de proibidos. “Por serem proibidos não há controle de qualidade. Isso faz com que possam existir mais substâncias além do que é reportado nos rótulos”, diz. No caso das amostras analisadas preliminarmente, chamou atenção a presença da octodrina pelo seu potencial de gerar quadros graves de intoxicação, dependência e abstinência. Suas propriedades são semelhantes às das anfetaminas, droga sintética que atua no sistema nervoso central.

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Tags: cigarro eletrônicoDepartamento de PatologiaLaboratório de Pesquisas ToxicológicasPolícia Científica

Professor da UFSC participa de evento sobre cigarros eletrônicos

21/07/2022 12:35

O professor Tadeu Lemos, do Departamento de Farmacologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), irá participar de uma webconferência sobre cigarros eletrônicos e os vaporizadores ou “vapes”, promovida pela Diretoria de Vigilância Epidemiológica (Dive), no dia 26 de agosto, das 14h às 16h. O evento poderá ser acessado através do link

A prevalência do tabagismo vem diminuindo no Brasil. Porém, novos modos de fumar tabaco surgiram e conquistaram novos adeptos, principalmente os mais jovens. A palestra Cigarros eletrônicos: um novo modismo?  tem como público-alvo os profissionais da saúde e irá discutir como surgiram estes novos equipamentos para fumar, do que são compostos, como são usados, de que forma influenciam comportamentos e suas consequências para a saúde individual e pública. 

Sobre o professor Tadeu Lemos

Tadeu Lemos atualmente é professor associado do Departamento de Farmacologia da UFSC, médico do ambulatório de dependência química do Núcleo de Psiquiatria do Hospital Universitário da UFSC, Preceptor da Residência Médica em Psiquiatria do IPq/SC. Atualmente é chefe do Departamento de Farmacologia da UFSC. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Saúde Mental, Dependência Química e Psicofarmacologia, atuando principalmente nos seguintes temas: ensino de graduação e pós-graduação, prevenção e tratamento das dependências químicas. 

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