Projeto premiado do Colégio de Aplicação da UFSC transforma cães em aliados da educação
Atenção, essa história envolve ingredientes que você nem imagina que podem deixar o seu dia mais feliz: ‘doguinhos’, crianças, jovens e inclusão em um projeto premiado, reconhecido como destaque de iniciação científica pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Terapia e Educação mediada com cães: experiências e pesquisas de intervenções não presenciais foi desenvolvido durante um ano por Ana Luiza da Costa Batista, então estudante do Colégio de Aplicação, com orientação da professora Renata Gomes Camargo.
O projeto foi feito durante a pandemia de Covid-19, por uma necessidade muito clara: manter as atividades de Cinoterapia no Colégio de Aplicação mesmo com os desafios do distanciamento social e das atividades remotas. O Instagram foi visto como uma ferramenta em potencial para estreitar os laços rompidos por conta das medidas sanitárias de prevenção.
A professora Renata começou, em 2015, a incluir cães no contexto educacional e terapêutico das crianças dos anos iniciais com dificuldades de aprendizagem, em um projeto que logo se ampliou para toda a escola. Seu alinhamento tanto ao eixo de pesquisa quanto da extensão passou a envolver estudantes do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic) do Ensino Médio, que são remunerados para atuarem de forma ativa nas pesquisas de iniciação científica.
A Cinoterapia é uma das Intervenções Assistidas por Animais (IAA) que conta com a mediação de cães e tem como base a relação estabelecida entre humano e animal. Durante o isolamento causado pela pandemia de Covid-19, as atividades desenvolvidas no Colégio de Aplicação passaram por uma reformulação. Os cães Argos, Teo e Bartô continuaram a protagonizar o projeto, mas a equipe precisou usar a criatividade e o conhecimento para adaptá-lo.
Foi aí que entrou o espírito desbravador de Ana Luiza. A estudante que tem altas habilidades/superdotação e vai ingressar na faculdade de Engenharia Mecânica da UFSC no segundo semestre de 2023, estudou formas de melhorar o Instagram do projeto, utilizando-o como ferramenta digital para auxiliar na realização e compartilhamento de atividades e pesquisas promovidas pelo grupo.
O perfil @cinoterapiaufsc foi criado para “aproximar e ampliar a comunicação do projeto com a comunidade”. A ideia foi transformá-lo em um portal de ampla divulgação de conteúdo científico e experiências acadêmicas. “Sendo assim, tem-se a responsabilidade na produção desse conhecimento de forma padronizada, sistemática, resumida e consequentemente atrativa”, indicam as autoras, no resumo do projeto premiado pela UFSC em 2022.
Atividades estão sendo replanejadas
Desde 2015, os cães fazem parte do dia a dia do Colégio de Aplicação. Com a ajuda deles, atividades para aprendizagem, linguagem verbal, atenção e memória são trabalhadas junto a estudantes de todas as idades. O projeto é transdisciplinar e tem como foco pensar o “desenvolvimento da linguagem verbal (oralidade, leitura e escrita), na qualificação da atenção e memória, na promoção das interações e de aspectos emocionais, físicos e cognitivos”.
A professora Renata trouxe o projeto de uma experiência bem sucedida na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul, e atualmente se prepara para sua nova fase. “Nós fechamos um ciclo longo de atividades, que envolvem nosso projeto aqui na UFSC. Agora, estamos nessa fase de replanejar novas possíveis atividades, que possam envolver também públicos além do Aplicação”, explica.
Ela lembra, também, que essa primeira reestruturação do projeto, com sua adaptação para o ensino remoto, foi inédita, o que é visto como uma inovação na Cinoterapia. “Do meu conhecimento e dos pesquisadores com quem eu converso que trabalham com intervenções assistidas por animais, foi uma inovação. O nosso foi o único projeto que conseguiu fazer essas intervenções com os cães online, eles participavam na telinha”, conta.
Mesmo tendo finalizado sua participação com o encerramento do Ensino Médio, Ana Luiza lembra com entusiasmo de tudo o que aprendeu como bolsista de iniciação científica do projeto. O esforço para recriar um Instagram que nasceu como canal de contato com os pais e crianças, mas que se reconstruiu para uma plataforma de divulgação da Cinoterapia, é celebrado por ela como fruto de autonomia e trabalho em equipe. “Nosso desafio era potencializar as informações. Nesse processo, no início, levávamos horas para fazer um único post”, recorda. “A rede social era uma um canal muito coerente para o nosso objetivo e a gente cresceu bastante, inclusive atingindo conexões com outros projetos”, narra Ana Luiza.
A pesquisa da estudante parte do pressuposto de que a rede social é uma grande aliada na divulgação e na democratização do conhecimento científico e na necessidade de pensar o perfil do projeto Cinoterapia a partir dessa perspectiva. “E nós não buscamos números nesse processo. Nossa ideia era alcançar o público com mais qualidade, potencializando o trabalho com a qualidade que queríamos entregar”, conta a estudante.
Projeto rendeu também livro e artigo

Projeto de Ana Luiza e Renata foi premiado como referência de iniciação científica no Ensino Médio na UFSC. Foto: Divulgação.
Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana, a professora Renata lembra que, na Cinoterapia, o cão atua como mediador das atividades, mas também auxilia na interação entre os participantes, crianças e profissionais. Em encontros semanais, além do afeto mobilizado pela relação com os animais e seus tutores, são trabalhados diferentes aspectos – como audição, escrita, fala, etc.
A atuação de Renata e dos seus colegas também foi divulgada recentemente no livro Intervenções Assistidas por Animais com a Mediação de Cães: Práticas, Pesquisas e Afetos, fruto de uma parceria com pesquisadores da UFSM . Segundo a sinopse, a ideia é “suprir a demanda de um público de leitores interessados em terapias complementares e práticas pedagógicas que envolvam cães como coterapeutas e todos aqueles que buscam iniciar sua experiência na área”.
Em artigo publicado em 2021, em parceria com outras pesquisadoras, a professora descreveu uma série de atividades realizadas com os cães e como elas impactaram os estudantes participantes. Mediar a procura por uma pequena caixa escondida no pátio; escolher por meio de biscoitos a ordem de participação de cada estudante ao longo da atividade e expressar com latidos respostas a perguntas feitas pelos estudantes foram alguns dos processos desenvolvidos.
Estimular a linguagem oral, a leitura, a escrita, a atenção, o planejamento e a memória verbal, a expressividade e a atenção na leitura foram alguns dos resultados conquistados com a ajuda e a mediação dos animais. “Dentre outros benefícios, encontra-se ainda o aumento na autoestima e na qualidade das interações, intensificadas pela colaboração e participação efetiva das atividades com o cão. Desta forma, observou-se uma melhora predominantemente significativa na linguagem oral, emocional e educacional”, indicam as conclusões do estudo publicado na revista Distúrbios da Comunicação.
Amanda Miranda, jornalista da Agecom/UFSC