Controle social, 30 horas e assédio moral foram principais temas do primeiro debate entre candidatos a reitor
O primeiro debate entre os candidatos a reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) foi promovido pelo Sindicato dos Trabalhadores da UFSC (Sintufsc) e teve como pauta as demandas dos técnicos-administrativos em Educação (TAEs). O evento ocorreu na sexta-feira, 16 de março, no auditório da Reitoria, que esteve lotado com apoiadores das três candidaturas. Com mediação do jornalista e apresentador da TV Floripa Silvio Smaniotto, o debate foi dividido em quatro blocos, sendo o primeiro para apresentação dos candidatos; o segundo para responderem a cinco perguntas que haviam sido previamente elaboradas e aprovadas em assembleia; o terceiro para responderem a dez perguntas do público presente; e o quarto para as considerações finais.
Ubaldo César Balthazar, atual reitor pró-tempore da universidade, foi o primeiro a se apresentar: “Nosso projeto é assumidamente um projeto de continuidade. Não poderíamos interromper um programa de ação que estava dando certo. Nosso projeto foi interrompido em setembro de 2017, por agentes externos à UFSC, provocando uma verdadeira tragédia na nossa universidade, um caos que nós esperamos que nunca mais se repita. A nossa candidatura significa, portanto, completar um projeto de gestão que em um ano e quatro meses já havia contemplado mais de 80% das ações previstas para quatro anos.”
A seguir, Edson De Pieri, atual diretor do Centro Tecnológico (CTC), afirmou que sua candidatura visa restabelecer o lugar de destaque da UFSC no cenário nacional. O candidato avalia que a instituição passa por sua maior crise institucional: “Essa crise nos leva a pensar por que chegamos a essa situação. Não tivemos até o momento nenhuma comissão que avaliasse e desse resposta ao que realmente ocorreu. A Universidade precisa saber que tem que dar respostas à sociedade que nos financia. Essa é a sua função social. Quando nos esquecemos desses preceitos constitucionais estamos virando as costas para sociedade.”
Irineu Manoel de Souza, atual diretor do Centro Socioeconômico (CSE), foi o último a se apresentar, destacando sua longa trajetória na instituição: “Ingressei na UFSC em 1974 como datilógrafo, passei pelos cargos de assistente administrativo, escriturário, técnico em assuntos educacionais, administrador e hoje sou professor. Conseguimos construir um programa, com a participação de mais de 100 pessoas, estruturado em princípios fundamentais para a universidade: o caráter público, a autonomia universitária, a transparência, a aproximação da universidade com a sociedade. Pretendemos fazer com que esses princípios sejam efetivamente adotados.”
Segundo bloco
A primeira pergunta aos candidatos abordou a proposta de implantação da jornada de trabalho de 30 horas — flexibilizando as atuais 40 horas da maioria dos técnicos e permitindo a ampliação do horário de atendimento de 8h diárias para 12h — e do controle social de assiduidade — dispensando assim a instalação de ponto eletrônico. Todos os candidatos se declararam a favor das duas propostas. A segunda questão tratou do assédio moral e suas implicações na saúde do trabalhador. Os três demonstraram igual preocupação com o problema e afirmaram estarem dispostos a combatê-lo. Apesar de diferenças pontuais nesses pontos, as divergências se expressaram em outras duas questões: Hospital Universitário (HU) e fundações de apoio.
O contrato do HU com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) foi o assunto da terceira questão, que suscitou posicionamentos diferentes dos candidatos. Para Ubaldo, a Ebserh é um “mal necessário”: “Participei da comissão que analisou o contrato de adesão à Ebserh como administradora do Hospital Universitário. Desde o início, nós nos colocamos contrários à vinda da Ebserh. Mas em determinado momento verificamos que era um mal necessário. É possível apontar vários pontos negativos na entrada de uma empresa administrando o HU, mas o contrato podia ser assinado, desde que houvesse um acompanhamento rigoroso do cumprimento das normas desse contrato por parte da empresa.”
A avaliação de De Pieri foi divergente. Para o candidato, a Ebserh teve seu contrato assinado com o Hospital Universitário da UFSC (HU) devido ao fato de ser insustentável a situação do HU. Segundo De Pieri, “o contrato, no entanto, tinha de ser bem feito. E o contrato não está sendo cumprido. Em grande parte, porque a UFSC foi uma das últimas universidades a aderir à Ebserh. Se paga o preço da discussão que defendia o financiamento do hospital sem a empresa.”
Irineu, por seu turno, avaliou que a comunidade universitária foi consultada. E em ampla maioria entendia que a Ebserh não resolveria o problema do HU. O candidato afirmou que desde 2011 foi contrário à adesão, por entender que não resolveria os problemas do hospital. Agora que há a adesão, Irineu defende que “como reitor, a Ebserh será chamada à Reitoria da UFSC para explicar o não cumprimento do contrato. Ou o reitor irá até Brasília. As Ebserh pelo Brasil estão mal, não é restrita à UFSC essa dificuldade. Em nossa gestão, a Direção do HU comporá o Conselho Universitário (CUn), para juntos propormos medidas para sanar os problemas do hospital.”
Outra questão polêmica foi referente às fundações de apoio. Para De Pieri, as fundações apenas executam o que ordenam os coordenadores dos projetos. E os coordenadores de projetos são do quadro da UFSC. Para o candidato, as fundações não têm como conhecer os problemas de gerenciamento da universidade. Nesse sentido, De Pieri defendeu uma política de transparência que permita cruzar dados entre as fundações de apoio e subsidiar a concessão de bolsas.
Irineu destacou que a prioridade na relação entre universidade e fundações de apoio é a transparência. Essa transparência, no entanto, deve extrapolar a relação com as fundações e tornar-se transparência para toda a sociedade. O candidato defende que a UFSC deve mostrar à comunidade todo o uso dos recursos da instituição. Irineu ressaltou que em seu programa propõe o orçamento participativo e que as fundações não doem recursos à universidade, tão somente os gerenciando, pois tratam-se de recursos públicos que também podem ser gerenciados pela UFSC.
Ubaldo apontou novamente que as fundações têm sua atuação restrita à gestão financeira. Desse modo, os coordenadores dos projetos de pesquisa e extensão seriam os responsáveis quanto ao uso dos recursos gerenciados pelas fundações de apoio. Nesse sentido, para o candidato, é indispensável o desenvolvimento de um rigoroso controle, a fim de evitar desvios de conduta na gestão de recursos públicos.
Terceiro bloco: candidatos respondem às questões da plateia
No terceiro bloco, os temas com maior manifestação do público foram, novamente, a jornada de 30h a todos os TAEs, as propostas de combate ao assédio moral e o controle social de assiduidade.
Ubaldo manifestou-se, mais uma vez, favorável à jornada de 30h, apontando aos processos em curso que encaminham a flexibilização da jornada. O candidato, no entanto, quando questionado sobre seu conhecimento acerca da minuta de resolução elaborada pela categoria para normatização da jornada flexibilizada, informou não ter conhecimento das propostas, mas que, o fará e encaminhará a debate público para apreciação junto ao Conselho Universitário, caso atenda aos quesitos legais.
Aliada à jornada flexibilizada, Ubaldo apontou para a negociação da reitoria com a categoria, o que significou a não instalação dos pontos eletrônicos biométricos, suscitando a criação de uma comissão para desenvolver o controle social de assiduidade. O candidato informou que, enquanto reitor pró-tempore, dialogou com os TAEs e se mostrou sensível a suas demandas e propostas.
De Pieri igualmente se mostrou favorável à flexibilização da jornada para 30h semanais aos TAEs. O candidato afirmou que conhece em parte a minuta de resolução proposta pela categoria e que se a proposta apresenta soluções dentro da legalidade, assumirá o compromisso em implantá-la. Quanto ao controle social, De Pieri disse que a proposta da categoria contempla formas mais adequadas de controle e que concorda com a demanda dos técnicos, dispondo-se, portanto, a instituir essa forma de controle.
Irineu declarou que conhece a proposta dos TAEs para a jornada de 30h e que esta mesma proposta está incorporada em seu programa de campanha. O candidato apontou que defende a pauta desde sua primeira candidatura, em 2011, e que seu compromisso com a proposta é notório. Irineu ressaltou que o controle social de assiduidade também está incorporado a seu programa de campanha.
Quanto ao assédio moral, todos os candidatos manifestaram novamente repúdio a tal prática. Os debatedores afirmaram conhecer casos nas três categorias e que buscam formas de coibí-lo. De Pieri afirmou que a universidade, sob sua gestão, deverá desenvolver uma cultura contrária ao assédio, com punição ao assediador e acolhimento ao assediado. Ressaltou ainda que a demora em punição e acolhimento são fatores que promovem o assédio.
Irineu afirmou que, se eleito, promoverá um amplo diagnóstico, a fim de formular uma política de prevenção à prática e de acolhimento e tratamento da vítima. Para que a política seja efetiva, no entanto, o candidato afirmou que a universidade precisa destinar recursos próprios a um programa específico, algo que as gestões passadas pecaram em realizar.
Ubaldo destacou que está em fase final a elaboração de uma minuta de Resolução. O objetivo é normatizar uma política de atendimento ao assediado e constranger o assédio na instituição.
No terceiro bloco, os candidatos ainda se manifestaram sobre o direito de greve, política de diversidades e direitos dos TAEs para capacitação, pesquisa e extensão. Todos os debatedores defenderam o direito constitucional à greve, desde que respeitados os ritos legais, e mostraram-se favoráveis à diversidade de gênero, credo e raça. Além disso, foram reiterados por todos os candidatos os direitos dos TAEs em coordenarem projetos de pesquisa e extensão, com alocação de horas para o desenvolvimento dos projetos, bem como manifestaram apoio à necessidade de acesso aos afastamentos para formação e capacitação.
Último bloco e avaliação dos candidatos
O debate foi encerrado com as considerações finais dos candidatos e uma exclusiva avaliação de cada um deles à equipe da Agência de Comunicação da UFSC (Agecom).
De Pieri considerou importante o debate e afirmou que este é o momento de promover uma mudança na universidade. Segundo ele, os candidatos apresentaram suas propostas, destacando suas diferenças. Dentre essas, De Pieri apontou para sua busca por uma gestão que “sofra menos interferência de grupos externos à universidade. Pois é isso que tem levado a universidade a sair daquela relação de respeito com a sociedade. Em síntese, foi um ótimo debate, com alto nível de discussões”.
Ubaldo também ressaltou o bom nível do debate. O candidato deu relevo a seu compromisso com uma gestão de decisões dialogadas e que visa deixar explícita sua responsabilidade em não fazer promessas que pode vir a não realizar.
Irineu acentuou o caráter coletivo das propostas de seu programa. O candidato compreende que o debate ressaltou a ruptura que seu programa representa e como se diferencia dos demais. Segundo Irineu, esse caráter dialogado e coletivo de seu programa pôde ser verificado “pelas manifestações da comunidade presente no debate e sua acolhida às propostas”.
Estão programados mais dois debates antes da consulta pública, que ocorre no dia 28 de março. Nesta terça-feira, 20 de março, às 18h30, será realizado o debate promovido pelo Coletivo Floripa contra o Estado de Exceção, em parceria com o Sintufsc e o Diretório Central dos Estudantes (DCE). O evento ocorre no hall da reitoria e tem como pauta “A luta pela autonomia da universidade no cenário de estado de exceção”.
Na quinta-feira, 22 de março, às 13h30, ocorre o debate organizado pela Comissão Eleitoral (Comeleufsc) no auditório Garapuvu, do Centro de Cultura e Eventos.
Mais informações sobre a consulta pública para o cargo de reitor na página da Comeleufsc.
Daniela Caniçali e Gabriel Martins/Agecom/UFSC