Estudo de professora da UFSC destaca modelos de publicação em periódicos científicos do Brasil e Espanha

29/04/2014 11:21

O modelo de publicação em acesso aberto (AA) vem sendo consolidado como um movimento internacional há mais de duas décadas. As duas principais opções para a publicação de resultados de pesquisa são denominadas a via verde (green road) e a via dourada (golden road). A primeira inclui o auto-arquivamento de manuscritos em repositórios institucionais ou temáticos, e a segunda inclui periódicos híbridos e exclusivamente de acesso aberto.Desde as Declarações de Budapest, Berlim e Bethesda em 2002-2003, houve um aumento imediato no número de periódicos em acesso aberto, tendendo nos dias de hoje à estabilização. Atualmente, o Directory of Open Access Journals(DOAJ) registra mais de 9.700 periódicos em 133 países.

A comunidade científica e a sociedade, principalmente em países em desenvolvimento, se beneficiam deste movimento, enquanto que os autores buscam visibilidade e impacto ao selecionar um periódico para publicar seus resultados de pesquisa. Ambos os objetivos podem ser contemplados por meio da via verde. Segundo Houghton e Swan, entretanto, os benefícios da via dourada ultrapassam os da via verde, porém os autores consideram que na atual fase de transição, repositórios seguem sendo mais viáveis econômica e estrategicamente. Ademais, a última recomendação da Budapest Open Access Initiative (BOAI, 2012), ressalta a importância dos repositórios na disponibilização de resultados de pesquisa de acesso aberto: “Cada instituição de ensino superior deve ter um repositório AA, participar de um consórcio com repositório AA consorciado, ou organizar um serviço terceirizado de repositório AA”.

Os artigos citados no parágrafo acima fazem parte de uma publicação recente de autoria de Rosângela Rodrigues, professora do Departamento de Ciência da Informação, do Centro de Ciências da Educação da  UFSC, e Ernest Abadal, profesor da Facultad de Biblioteconomía y Documentación de la Universitat de Barcelona , Espanha, que traça um panorama do modelo de publicação do acesso aberto no Brasil e na Espanha analisando os periódicos destes países indexados nas bases Web of Science (WoS) e Scopus segundo os aspectos do formato da publicação – online ou impresso – , o tipo de acesso – aberto ou por assinatura – e a plataforma tecnológica utilizada.

Muitos países em desenvolvimento não possuem uma estrutura de publishers comerciais, e a maioria dos periódicos de qualidade não tem fins lucrativos, sendo operados com recursos públicos por sociedades científicas e intuições de pesquisa. Por outro lado, países do Sul da Europa têm poucos publishers comerciais e menos recursos quando comparado a países líderes na região. Apesar disso, ambos desenvolveram modelos bem sucedidos de acesso aberto. Este post traça um perfil destes programas e as razões do seu sucesso.

O modelo de acesso aberto considera o conhecimento científico como um bem público global e uma forma justa de prestar contas à sociedade sobre a pesquisa financiada com recursos públicos. Para países em desenvolvimento este modelo é especialmente importante, por promover a equidade e aumentar a capacidade de pesquisadores em avançar nas pesquisas. Ademais, no modelo por assinatura, além de pagar pela pesquisa, as universidades devem pagar novamente pelo acesso aos periódicos onde esta pesquisa é publicada. Neste sentido, a “Declaração de Salvador sobre o Acesso Aberto: a perspectiva dos países em desenvolvimento”, assinada em 2005 pelos participantes do International Seminar on Open Access, realizado durante o ICML9 e CRICS7, constitui um marco no movimento global do AA.

Em suas respectivas regiões, Brasil e Espanha possuem o maior potencial no campo da publicação acadêmica e ambos têm perfil dominante em produção científica em suas áreas geográficas.

No Brasil o número de periódicos indexados em bases de dados internacionais como WoS e Scopus era incipiente até 2005. A partir de então, impulsionado pelo programa SciELO, os periódicos foram adquirindo visibilidade e maior qualidade, perpetuando um círculo virtuoso até os dias de hoje. A vasta maioria (90%) dos periódicos brasileiros na WoS e Scopus também fazem parte da coleção SciELO e é editada em AA por sociedades científicas ou instituições de pesquisa e ensino, não tem fins lucrativos e seus editores são concomitantemente pesquisadores respeitados e produtivos em suas áreas de atuação. O uso da plataforma Open Journal System(OJS) provida pelo Instituto Brasileiro de Informação Científica e Tecnológica (IBICT) também contribui para apoiar editores na gestão e operação de periódicos por meio de recursos online e atividades de capacitação. Dez por cento dos periódicos brasileiros operam com taxas de publicação usadas para cobrir os custos de editoração que variam de US$ 60 a US$ 500 por artigo.

As publicações da Espanha têm sido estudadas por muitos autores. No mais recente artigo, Rodríguez-Yunta e Giménez-Toledo (2013) ressaltaram a baixa representatividade de periódicos de país na área de humanidades e ciências sociais, os quais têm baixo impacto e representatividade, possivelmente por gestão inadequada. Outro estudo analisou 30 artigos presentes no JCR, com foco no tipo de publisher, presença internacional no corpo editorial, impacto e perfis de citação. Na época, a pesquisa mostrou predomínio de 60% na área da saúde, com 40% deles geridos por publishers comerciais. Uma pesquisa sobre periódicos administrados por universidades na Espanha (25% do total) mostrou que são necessárias inúmeras iniciativas para melhorar a qualidade, visibilidade e impacto dos mesmos.

O objetivo do estudo de Rodrigues e Abadal é obter uma visão geral dos periódicos científicos indexados na WoS e Scopus em 2011 de ambos os países, e analisar os modelos de distribuição adotados.

A questão que se coloca diante dos dados deste estudo é como a quase totalidade dos periódicos de alta qualidade e impacto do Brasil e mais da metade dos da Espanha publicam seus conteúdos em acesso aberto?

No caso do Brasil, a explicação reside em seis stakeholders principais que tomaram um conjunto de medidas econômicas, políticas e tecnológicas, além de treinamento em editoração para promover e fortalecer os periódicos:

SciELO – o programa SciELO teve início em 1998 com 10 periódicos do Brasil. Quinze anos depois presente em 16 países, 11 destes com coleções certificadas, e mais de mil títulos (julho de 2013). O SciELO opera com padrões internacionais de qualidade e contagem de métricas de impacto científico; como indexador, com critérios estritos de inclusão e permanência; e como plataforma tecnológica para a publicação e acesso às coleções nacionais e temáticas de periódicos.

CNPq – O órgão governamental vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia dispõe de um orçamento anual de US$ 3 milhões divididos entre aproximadamente 200 dos melhores periódicos.

Universidades – As instituições são responsáveis pela publicação de 47% dos periódicos considerados neste estudo, provendo recursos financeiros e humanos para a gestão e editoração, além de espaço físico em suas instalações e infraestrutura tecnológica. A quase totalidade dos editores no Brasil é formada por docentes e pesquisadores renomados e produtivos em suas áreas de atuação.

Qualis CAPES– O Qualis é um sistema de classificação de periódicos em cada área do conhecimento desenvolvido e coordenado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). A classificação dos cursos de pós-graduação tem como um dos principais componentes a avaliação dos periódicos onde são publicados os resultados das pesquisas. Por sua vez, a posição dos periódicos no ranking determina seu prestígio e infuencia a quantidade e qualidade dos trabalhos submetidos.

IBICT – O Instituto oferece treinamento em editoração e apoio à publicação em AA, e à plataforma OJS.

Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC) – A associação oferece cursos e promove eventos em editoração científica para editores e publishers.

Na Espanha, as ações em prol do AA concentraram-se em desenvolvimento tecnológico, treinamento e recomendação, porém sem financiamento direto destinado à publicação de periódicos. As iniciativas mais relevantes estão relacionadas a seguir:

Marco legislativo e regulatório – As leis espanholas, assim como a regulamentação das universidades são favoráveis ao AA, por exemplo, a Lei em Ciência, Tecnologia e Inovação de 2011, que inclui um artigo sobre AA. A exemplo de instituições em países Europeus e os Estados Unidos, as universidades criaram mandatos para auto-arquivamento em repositórios institucionais. Estas medidas levaram à conscientização sobre o AA por parte de autores e publishers.

Fundação Espanhola para Ciência e Tecnologia (FECYT) – Agencia governamental que apoia a publicação científica por meio de programas que incluem capacitação e prêmios para qualidade em publicações científicas.

Universidades e Institutos de Pesquisa – Estas instituições são responsáveis pela publicação de 39% dos periódicos da Espanha considerados nesta publicação, provendo financiamento e suporte tecnológico, de forma a incrementar a qualidade e facilitar a publicação em AA.

Índices de avaliação de periódicos – Com a finalidade de aumentar a representatividade de periódicos que não estão presentes na WoS ou Scopus, foram criados índices alternativos de impacto científico na Espanha.

Leia o texto completo em: Estudo destaca os modelos de publicação em periódicos científicos do Brasil e Espanha. SciELO em Perspectiva

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