UFSC é pioneira no cultivo em laboratório de ouriço-do-mar para aquicultura no Brasil

Juvenil de ouriço-do-mar com dois meses de cultivo, produzido no Laboratório de Moluscos Marinhos da UFSC. Foto: Divulgação/LMM/UFSC
Pela primeira vez no Brasil, pesquisadores conseguiram produzir em laboratório juvenis do ouriço-do-mar Echinometra lucunter, com objetivo voltado à aquicultura para consumo humano. A pesquisa, conduzida pelo Laboratório de Moluscos Marinhos (LMM) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis, resultou – de forma inédita no país – em aproximadamente 1.300 juvenis produzidos em condições controladas.
O projeto visa, através do desenvolvimento da tecnologia de produção em laboratório do ouriço-do-mar, o cultivo comercial da espécie, aliando sustentabilidade, geração de renda para comunidades costeiras e diversificação da aquicultura brasileira por meio de tecnologias inovadoras, confore o LMM/UFSC.
O trabalho está sendo coordenado pelo professor Cassio de Oliveira Ramos, especialista em aquicultura marinha, que avalia o feito como histórico, colocando Santa Catarina na vanguarda da maricultura nacional.
“Pela primeira vez no Brasil, estamos fechando todo o ciclo produtivo de uma espécie nativa de ouriço-do-mar com foco na aquicultura. Esse marco é um passo decisivo para a criação de uma nova cadeia produtiva na maricultura nacional, integrando ciência, economia azul e sustentabilidade, com alto potencial comercial e ambiental”, destaca o professor.
Sustentabilidade no centro do projeto

Reprodutor de Echinometra lucunter utilizado nos protocolos experimentais para o desenvolvimento da tecnologia de produção larval e juvenil em aquicultura. Foto: Divulgação LMM/UFSC
A espécie Echinometra lucunter, amplamente encontrada no litoral brasileiro, foi escolhida por suas características ideais para o cultivo sustentável: crescimento rápido, alta taxa reprodutiva, resiliência ao manejo em cativeiro e gônadas bem desenvolvidas — parte comestível valorizada na gastronomia e conhecida como “uni”.
O domínio completo de seu ciclo de vida em laboratório representa uma alternativa concreta à extração predatória e visa desenvolver seu cultivo em escala comercial no Brasil, conforme o LMM/UFSC.
O diferencial está no domínio completo do ciclo de vida da espécie em ambiente controlado — desde a fertilização, cultivo larval, assentamento, crescimento de juvenis até a maturação dos adultos — estabelecendo uma base sólida para produção sustentável.
Essa abordagem reduz drasticamente os impactos sobre o ambiente marinho e fortalece práticas de aquicultura que respeitam os ciclos ecológicos e promovem o uso responsável dos recursos oceânicos, conforme o professor Cassio.
Gastronomia, economia e conservação
Países como Japão, Chile e Itália já exploram comercialmente ouriços-do-mar há décadas, enquanto o Brasil ainda não dispunha de um projeto técnico-científico voltado à produção em escala comercial. Com o avanço promovido pela UFSC, o país poderá atender o mercado interno e futuramente os mercados internacionais de alto padrão, com um produto de origem sustentável e rastreável, conforme o LMM.
A espécie produzida pelos pesquisadores já apresenta boa aceitação no mercado gastronômico brasileiro e seu consumo, atualmente oriundo da pesca extrativista, cresce a cada ano especialmente em restaurantes especializados das regiões Sul, Sudeste e Nordeste.
Além do uso gastronômico, as gônadas de ouriço-do-mar também despertam interesse das indústrias cosmética, nutracêutica e farmacêutica, graças aos compostos bioativos presentes em sua composição. Isso amplia as oportunidades econômicas da espécie e reforça sua viabilidade como recurso multifuncional.
Tecnologia 100% nacional

Larva do ouriço-do-mar Echinometra lucunter com 10 dias de larvicultura, apresentando morfologia típica de plúteo com braços bem desenvolvidos. Foto: Divulgação LMM/UFSC
O LMM/UFSC, referência na produção de sementes de ostras e vieiras, aplicou sua expertise em larvicultura e sistemas de recirculação de água marinha para garantir o sucesso da primeira fase do projeto com os ouriços. Foram testados diferentes parâmetros ambientais — como temperatura, salinidade, densidade e alimentação — com foco na produtividade, qualidade da água e bem-estar animal, conforme o professor Cassio.
A pesquisa, dividida em três fases — cultivo larval e assentamento; crescimento de juvenis e adultos; e maturação gonadal — , já avança para sua segunda etapa. O LMM/UFSC concentrou seus esforços iniciais na primeira fase, a larvicultura, com resultados promissores.
Como parte das ações de cooperação e continuidade no desenvolvimento da tecnologia de cultivo de ouriços-do-mar, a próxima etapa da pesquisa será conduzida no Laboratório de Camarões Marinhos (LCM/UFSC).
Impacto ambiental positivo e novas oportunidades
Segundo o professor Cassio, “o cultivo de juvenis em laboratório é uma estratégia eficaz para reduzir a pressão sobre os estoques naturais. Além disso, abre novas frentes para geração de renda entre pescadores, maricultores e pequenos produtores, podendo ser integrado a sistemas multitróficos com ostras, macroalgas ou camarões, favorecendo o reaproveitamento de nutrientes, o controle biológico de resíduos e a melhoria da qualidade da água”.
Na avaliação dos pesquisadores, o pioneirismo do projeto responde diretamente às necessidades da Economia Azul, ao propor alternativas econômicas viáveis e ambientalmente responsáveis com base no uso inteligente dos recursos marinhos e fomentando economias costeiras resilientes e alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas.
Um novo futuro para a aquicultura brasileira
Após a produção dos primeiros 1.300 juvenis, a próxima etapa será expandir as pesquisas para todas as fases do ciclo, até alcançar a produção comercial em larga escala.
“Este é um feito que posiciona o Brasil entre os poucos países do mundo com tecnologia e conhecimento aplicados à produção sustentável de ouriços-do-mar”, conclui Cassio. “Mais do que ciência de ponta, estamos pesquisando soluções viáveis para proteger os oceanos, gerar renda e impulsionar a economia azul brasileira.”
Para saber mais
O avanço da tecnologia de cultivo do ouriço-do-mar e os bastidores da pesquisa podem ser acompanhados pelos perfis oficiais dos laboratórios do Laboratório de Moluscos Marinhos (LMM/UFSC) e de Laboratório de Camarões Marinhos (LCM/UFSC) no Instagram.