UFSC coordena estudo interinstitucional de armazenamento de CO2 em aquíferos salinos

18/02/2025 08:55

Aquíferos salinos podem ser alternativa para o armazenamento de carbono decorrente de atividades industriais. Foto: Alexei Scutari/Unsplash

Ao longo dos próximos três anos, cientistas de cinco universidades se dedicarão a um estudo de caso em reservatórios de rochas para o armazenamento geológico de carbono, cujos resultados poderão apoiar projetos futuros focados em evitar a emissão de gases de efeito estufa. Com financiamento da Petrobras, que investe quase R$ 8 milhões no projeto, os pesquisadores irão propor modelos de reservatórios 3D para o armazenamento geológico de CO2 em aquíferos salinos da Bacia do Paraná, uma bacia sedimentar de grande extensão, em uma área próxima às regiões carboníferas do Sul de Santa Catarina e à Região Metropolitana de Porto Alegre.

Coordenado por Manoela Bettarel Bállico, professora do Departamento de Geologia e coordenadora do Laboratório de Geologia de Reservatórios da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o trabalho envolve pesquisadores, de diferentes áreas do conhecimento, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e das universidades federais do Ceará (UFC), do Rio Grande do Sul (UFRGS) e do Pampa (Unipampa). No âmbito da UFSC, também participa o Laboratório de Meios Porosos e Propriedades Termofísicas (LMPT), coordenado pelo professor do Departamento de Engenharia Mecânica Celso Peres Fernandes.

Aquíferos salinos são reservatórios de água subterrânea que acumulam, em seu interior, água salgada e, portanto, imprópria para o consumo. Por suas características geológicas e pela proximidade a grandes centros urbanos, esses reservatórios são alternativas promissoras para o armazenamento geológico de carbono decorrente de atividades industriais.

Há anos, a Petrobras já otimiza os seus campos produtores de óleo e gás, reinjetando CO2 nos reservatórios. O armazenamento em aquíferos salinos localizados em bacias sedimentares terrestres, no entanto, ainda não é feito no Brasil – apesar do destaque que os estudos da área vêm ganhando nos últimos anos.

Estudo de caso

No primeiro ano do projeto, a equipe do Laboratório de Geologia de Reservatórios vai se dedicar aos trabalhos de campo para aquisição de dados geológicos. Foto: arquivo pessoal

Manoela explica que a proposta é fazer um estudo de caso. “A ideia é a gente ter esse estudo de caso dentro de uma unidade da Bacia do Paraná e fazer toda uma modelagem desse reservatório.” Segundo ela, a bacia apresenta uma série de condições favoráveis para o armazenamento de carbono, como as características de suas rochas, uma profundidade mínima de 800 metros e a proximidade a grandes centros urbanos emissores de carbono, já que a logística de transporte do CO2 pode ser muito cara. A modelagem, contudo, é muito importante para se certificar da viabilidade do armazenamento.

O contrato com a Petrobras foi assinado em dezembro de 2024, e a primeira parcela do financiamento foi paga no final de janeiro. Agora, os pesquisadores se dedicam à contratação de bolsistas – de graduação e pós-graduação – e à compra de materiais e equipamentos. O primeiro ano do projeto será dedicado aos trabalhos de campo, para aquisição dos dados geológicos. As rochas coletadas nessa etapa serão analisadas em laboratório ao longo do ano seguinte.

O terceiro e último ano do projeto será dedicado à modelagem. Primeiramente, um modelo estático da bacia. “Vamos caracterizar sedimentologicamente e estratigraficamente essas rochas. Vamos ver rochas que são favoráveis, que são porosas, que poderiam receber esse fluido. E rochas que poderiam ser selantes, que vão aprisionar esse fluido, que não vão deixar esse fluido escapar, dos poros da rocha porosa”, esclarece Manoela. 

Posteriormente, a modelagem dinâmica contemplará a simulação dos fluxos de CO2 dentro do reservatório. “Aí tu já tens toda uma simulação do fluido mesmo, para ver como será o comportamento desse fluido a longo prazo. Porque não adianta a gente retirar o CO2 da atmosfera, inserir na rocha, e esse CO2 não ficar aprisionado ali e contaminar um aquífero, por exemplo”, conta a pesquisadora.

Petróleo, CO2 e aquíferos

Vinculado ao Centro Tecnológico (CTC), Laboratório de Meios Porosos e Propriedades Termofísicas também está envolvido no projeto. Foto: arquivo pessoal

Como geóloga da área do petróleo, especializada em reservatórios, Manoela destaca a importância de aplicar o conhecimento adquirido ao longo de décadas de estudos relacionados ao combustível fóssil para os novos desafios que se apresentam, como a mitigação das mudanças climáticas.

“Todo esse know-how que a gente adquiriu para extrair petróleo pode ser aplicado em outras coisas. Por exemplo, explorar a questão dos reservatórios não para extrair óleo, mas para armazenar CO2. É algo que pode ser colocado em prática e que vai auxiliar de certa forma essa questão das emissões. A gente pode conseguir ter uma mitigação, reduzir a quantidade de CO2 na atmosfera.”

Ao mesmo tempo, a cientista salienta que projetos como esse também são uma oportunidade para conhecer melhor nossos aquíferos. “Trazer esse olhar da análise desses reservatórios, de como se dá as heterogeneidades dentro desses reservatórios, para a questão dos aquíferos também é super importante.”

Mulheres na ciência

Entrevistada no Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, celebrado anualmente em 11 de fevereiro, Manoela faz questão de ressaltar a importância de dar visibilidade a estudos liderados por mulheres. “Porque as nossas meninas olham para quem? Quando tu te identificas, tu vais olhar para o teu par. Então é importante ver mulheres, ocupando essas posições, adquirindo projetos com esse valor, com esse orçamento, dentro da Universidade, porque isso é um exemplo. Eu me identifiquei muito com aquelas mulheres que já eram professoras mais antigas da casa, eu me senti representada por elas.”

Esse destaque, segundo ela, é ainda mais relevante em uma área formada majoritariamente por homens, como a Geologia. No Departamento de Geologia da UFSC, por exemplo, de 16 docentes efetivos, apenas quatro são mulheres. “É importante a gente ter esse reconhecimento e cada vez mais ocupar esses espaços. Eu vejo que é uma mulher que dá a mão para outra mulher. Foi por conta de mulheres que eu consegui este projeto e que a gente foi costurando. Sempre teve uma mulher importante fazendo algo importante para que a gente chegasse aqui e hoje tivesse esse recurso de quase oito milhões”, enfatiza Manoela.

 

Camila Raposo | camila.raposo@ufsc.br
Jornalista da Agecom | UFSC
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