Professor da UFSC assina estudo que identificou proteína envolvida na formação de tumores mais agressivos

17/12/2021 09:21

Resultados experimentais indicam que a LIN28B é criticamente importante para comportamento agressivo de células tumorais. Foto: Unsplash/National Cancer Institute

O pesquisador Edroaldo Lummertz da Rocha, do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia (MIP), do Centro de Ciências Biológicas (CCB) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), assina como segundo autor de um estudo que traz a descoberta do papel da proteína LIN28B no processo de metástase, que é a disseminação de células de tumores para outros órgãos. Atualmente responsável por mais de 90% das mortes associadas ao câncer, a metástase ainda permanece incurável.

Para o professor da UFSC, torna-se, portanto, crucial compreender os mecanismos biológicos fundamentais pelos quais células tumorais se espalham pelo corpo. “Tal conhecimento permitirá, um dia, o desenvolvimento de novos tratamentos para tumores altamente metastáticos que acometem adultos – como melanoma [câncer de pele] e câncer de mama – e crianças – como o neuroblastoma”.

O neuroblastoma é o terceiro tipo de câncer mais comum na infância e adolescência, ficando atrás somente da leucemia e dos tumores do sistema nervoso central. Apesar do que o nome parece indicar, não é um tumor no cérebro. Trata-se de um tumor sólido extracraniano, bastante comum em crianças, que acomete uma parte do sistema nervoso autônomo, responsável por controlar funções vitais fundamentais como a respiração, pressão arterial, batimentos cardíacos e a digestão. Conforme explica Edroaldo, a maioria dos neuroblastomas se desenvolve nas glândulas adrenais, que se localizam acima dos rins, no abdome ou nas células nervosas próximas da coluna espinhal.

Desenvolvimento do estudo

Em colaboração com pesquisadores do Boston Children’s Hospital e da Harvard Medical School, a pesquisa do professor da UFSC foi publicada na revista The Journal of Clinical Investigation. Utilizando um modelo animal de neuroblastoma, um câncer infantil altamente metastático e letal, os pesquisadores demonstraram que células tumorais com níveis de expressão mais altos da proteína LIN28B são significativamente mais metastáticas do que aquelas células que não a expressam. Por meio de abordagens genéticas no estudo, a remoção da proteína LIN28B reduziu substancialmente a propagação de células tumorais e, consequentemente, aumentou a sobrevida dos animais.

As análises de biologia computacional com dados de expressão de genes de mais de 450 pacientes com neuroblastoma foram utilizadas para determinar o grau de agressividade de células tumorais com ou sem expressão de LIN28B. As análises revelaram que células com altos níveis desta proteína são molecularmente similares a tumores de pacientes em estágios avançados da doença, já metastáticos. Enquanto isso, as células nas quais a proteína LIN28B foi deletada são molecularmente mais semelhantes a tumores menos agressivos, sem envolvimento de metástase.

Estudo desenvolveu análises de biologia computacional com dados de genes de mais de 450 pacientes com neuroblastoma

“A identificação da proteína LIN28B como criticamente importante para o processo de metástase pode levar ao desenvolvimento de novas terapias baseadas na sua inibição por meios farmacológicos, podendo levar ao desenvolvimento de novos tratamentos para tumores altamente metastáticos. Como o câncer metastático ainda representa um desafio clínico, o desenvolvimento de novos tratamentos é urgentemente necessário”, avalia Edrolado. “O nosso trabalho contribui para uma melhor compreensão da proteína LIN28B em neuroblastoma e, potencialmente, outros tumores agressivos. Compreender estes processos fundamentais que regulam o espalhamento de células tumorais pelo organismo é crucial para desenvolver terapias mais efetivas”, complementa.

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As análises de expressão gênica também evidenciaram que a alta expressão de LIN28B está associada com baixa sobrevida. Para generalizar estas observações para outros tipos de tumores, os autores analisaram dados de expressão gênica em 31 tipos diferentes de câncer (com um total de mais de 9.000 pacientes) e constataram uma correlação substancial entre LIN28B e o oncogene MYCN – o gene mais amplamente conhecido como responsável por causar neuroblastoma altamente agressivo, dando novamente suporte à observação dos autores de que a proteína está associada à severidade da doença. Para o docente da UFSC, estes resultados experimentais indicam que a proteína LIN28B é criticamente importante para o comportamento agressivo e invasivo das células tumorais em uma variedade de cânceres.

Da computação à biologia

A trajetória acadêmica do professor Edroaldo Lummertz da Rocha nem sempre esteve vinculada à área da saúde. Iniciou a graduação, em 2004, no curso de Ciência da Computação pela Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc). Em seguida, cursou o mestrado em Engenharia Elétrica e o doutorado em Ciência e Engenharia de Materiais pela UFSC. O contato com as instituições parceiras da pesquisa ocorreu no pós-doutorado realizado no Boston Children’s Hospital/Harvard Medical School.

Professor Edroaldo atua como coordenador do Laboratório de Biologia de Sistemas do MIP. Foto: acervo pessoal

Foi vencedor do Prêmio Capes de Tese, na área de Materiais, e do Grande Prêmio Capes de Tese Aziz Nacib Ab’Sáber, referente ao grupos das grandes áreas de avaliação Engenharias, Ciências Exatas e da Terra e Multidisciplinar – Materiais e Biotecnologia. No currículo, acumula experiência em biologia sistemas e genômica com resolução celular (single-cell genomics), com ênfase em análise de dados biológicos multidimensionais, reprogramação celular, hematopoiese e imunologia.

“A transição da área de ciência da computação para área de câncer (e também células-tronco, outra linha de pesquisa do laboratório em que atua) ocorreu devido à ocorrência da doença em familiares e amigos. Eu decidi, então, dedicar minha carreira científica para compreender os fenômenos pelos quais células normais se transformam em células tumorais”, revela o pesquisador. “Além disso, um dos principais motivos que me levaram a investir em biologia computacional foi a complexidade dos problemas da área biológica, que carece de métodos quantitativos e de modelagem para compreender os fenômenos subjacentes, responsáveis pelo surgimento de doenças como o câncer”.

Edroaldo atualmente é professor adjunto do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia (MIP). Atua como coordenador do Laboratório de Biologia de Sistemas do MIP, que desenvolve pesquisas em cânceres infantis, como neuroblastoma e leucemias, assim como em cânceres adultos, como o câncer de mama. Os estudos utilizam a biologia computacional de forma interdisciplinar para responder a perguntas biológicas nestas áreas. “O objetivo do laboratório é buscar melhor compreender estas doenças do ponto de vista da ciência básica da biologia e imunologia do câncer, mantendo-se focado em utilizar esses novos conhecimentos para guiar o desenvolvimento de novas terapias e tratamentos mais efetivos para tumores pediátricos e adultos”, explica o docente.

Maykon Oliveira/Jornalista da Agecom/UFSC

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