Escola reproduz práticas de discriminação, diz pesquisadora

Joana Célia dos Passos, Patrícia de Moraes Lima, Antonella Maria Imperatriz Tassinari e Julice Dias participam da mesa “Educação e infância: contribuições das Ciências Sociais”.
A escola como instância que reproduz práticas de discriminação racial no Brasil foi o tema da palestra da professora Joana Célia dos Passos durante a mesa redonda “Educação e infância: contribuições das Ciências Sociais”, realizada na manhã desta terça-feira, dia 15, dentro da programação do Seminário Internacional de Educação Infantil e Contribuições dos Estudos da Infância, que vem sendo realizado no Centro de Cultura e Eventos da UFSC. Militante de organizações sociais e do movimento negro, ela disse que sente no dia a dia o problema do racismo porque tem um filho de 10 anos que reporta as diferenças de tratamento dado a crianças negras e brancas na escola onde estuda.
Em sua fala, Célia manteve a plateia atenta ao fazer um histórico da discriminação no país desde que, em 1869, um regimento imperial vetava a presença de crianças negras na escola formal – mesma condição que atingia
os portadores de moléstias contagiosas. No início do século XX, predominava na intelectualidade brasileira a ideia de que no passado o país fora negro, naquele momento era mestiço e seria branco no futuro. “O mestiço era
sinônimo de desenvolvimento, com base nas teorias eugenistas”, destacou. “Tais crenças, reforçadas por figuras como Silvio Romero e até Gilberto Freyre, influenciam até hoje as políticas sociais e educacionais”.
Mesmo com a constatação feita no período posterior à Segunda Guerra, por pesquisadores como Roger Bastide, Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso e Otávio Ianni, de que o Brasil não é modelo de democracia racial, e de que biologicamente não existem diferenças entre as raças, as relações sociais continuaram racializadas. E isso se estendeu – e permanece vivo – na escola, nos livros didáticos, na mídia, na propaganda e no mercado de trabalho. Para a pesquisadora, também foram importantes os avanços na área da pesquisa educacional.
“Descobriu-se que as crianças pequenas já têm noção de pertencerem a um grupo étnico-social discriminado”, afirmou Célia. “Esse tratamento nem sempre é verbal e pode se dar pelo tom de voz, pela distribuição desigual
do afeto, pelos cuidados e pelo silêncio dos professores. Assim, elas passam a ter muito cedo uma imagem negativa de si mesmas. As consequências são a rejeição ao grupo social, a baixa autoestima e, em alguns casos, a
recusa de continuar estudando. Em pleno século XXI, a escola continua oferecendo a alunos brancos e negros oportunidades muito diferentes”.
“Atualmente, há instrumentos normativos e ordenamento jurídico para tratar da questão, mas o formato curricular avança lentamente, assim como os projetos pedagógicos e a própria academia”, disse a pesquisadora.
Outras palestras – Na programação da manhã, a professora Patrícia de Moraes Lima, do Departamento de Metodologia de Ensino da UFSC, falou das relações de poder na escola e da consolidação das políticas de proteção à infância no Brasil, sobretudo a partir do início dos anos 90. “Hoje, penso a infância não como algo distante, mas como algo de mim mesma”, ressaltou. A mesa redonda foi encerrada com a palestra da professora Antonella Maria Imperatriz Tassinari, do Núcleo de Estudos sobre Povos Indígenas, que abordou a questão da infância sob o ponto de vista da Antropologia.
Por Paulo Clóvis Schmitz, jornalista da Agecom. Fotos: Wagner Behr.