Projeto de extensão da UFSC oferece treinos de goalball para pessoas com deficiência visual

29/05/2023 16:06

Goalball é a única modalidade paralímpica criada originalmente para pessoas com deficiência visual (Fotos: Robson Ribeiro / Secom)

Levar o nome da instituição e do Estado para as competições. Esse é o lema de Cheila Aguiar dos Santos, uma das alunas do projeto de extensão de treinamento de goalball para deficientes visuais, oferecido pelo Centro de Desportos (CDS) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), no Campus da Trindade, em Florianópolis.

A competidora conta que, antes de começar a participar dos treinos, sentia muita dificuldade para dormir devido à insônia. Com o incremento da atividade física na rotina semanal ela conseguiu melhorar a qualidade do sono, ganhar mais força e resistência. Além do benefício para a saúde, junto à equipe Cheila alcançou também o pódio e hoje coleciona ao menos oito medalhas. A última foi conquistada na Copa Sul de Goalball, disputada na cidade de Xanxerê, em 25 e 26 de março. “Eu nem acreditei que iríamos chegar em segundo lugar, porque foi somente um mês de treino, então para mim foi bem gratificante”, afirma.

Ao todo, neste semestre, além do goalball, são ofertadas à comunidade universitária com algum tipo de deficiência outras quatro modalidades: handebol, tênis, natação e atletismo. Crianças com autismo também podem participar das atividades de iniciação esportiva em práticas corporais. As ações são uma parceria entre a Universidade e a Associação Catarinense de Esportes Adaptados (Acesa).

Goalball: a única modalidade paralímpica que não é adaptada

Cheila (com a bola) percebeu melhora na qualidade do sono e no condicionamento físico com a prática da atividade

O goalball foi criado após a Segunda Guerra Mundial, em 1945, pelo alemão Sepp Reindle e pelo austríaco Hanz Lorezen. Para além de atividade desportiva, o objetivo era reabilitar veteranos que haviam ficado cegos, estimulando as habilidades de concentração e motora. Por isso, a modalidade não é uma adaptação de um esporte convencional.

O esporte é praticado em quadra com uma bola que possui um guizo em seu interior para orientar os jogadores. A partida é dividida em dois tempos de 12 minutos e cada equipe é formada por 3 atletas, com mais três reservas. O objetivo é arremessar a bola com as mãos e marcar pontos na baliza, uma espécie de gol, com 9 metros de largura, no campo do adversário.

“É um jogo bem estratégico porque você tem que identificar onde é que estão os jogadores e as lacunas de espaços do outro time para tentar enfiar a bola”, afirma a professora Bruna Seron, que coordena as aulas de goalball na Universidade. Segundo ela, a bola pode chegar a 100 km/h quando arremessada.

Em 2020, o esporte foi destaque nos jogos paralímpicos de Tóquio, no Japão. Na competição, os atletas da seleção masculina trouxeram uma medalha de ouro inédita para o Brasil, que já acumulava a prata de 2012, conquistada em Londres, e o bronze no Rio de Janeiro, em 2016. No total, entre as 22 modalidades disputadas no torneio de Tóquio, os competidores brasileiros trouxeram para casa 72 medalhas.

O silêncio durante a partida é fundamental para a boa desenvoltura dos atletas. Em quadra, só quem tem permissão para fazer barulho é o guizo da bola. “Se tem muito barulho no local, como de carros e motos, já se torna um pouco mais difícil, porque o atleta precisa prestar atenção no barulho que a bola faz”, afirma Cheila. Ela explica que é preciso se adaptar, já que durante a semana o espaço de treino é dividido com a prática de outras modalidades.

Inclusão por meio do esporte

Guilherme Becker (em pé) é monitor de uma das turmas de goalball

Na UFSC, os atletas são preparados para campeonatos estaduais, regionais e nacionais. Cheila faz parte do time feminino, que foi retomado em 2023 depois de seis anos de interrupção. Nesse momento, a equipe se prepara para o Regional Sul de Goalball, que vai acontecer em Porto Alegre entre 31 de maio e 4 de junho. Além disso, estão previstos para acontecer no segundo semestre os Jogos Abertos Paradesportivos de Santa Catarina (Parajasc) e o Campeonato Brasileiro de Goalball.

Para Cheila, o espaço aberto pela Universidade é fundamental para o seu desenvolvimento, já que outros locais não oferecem a mesma estrutura. “Para as pessoas com deficiência o esporte é muito importante, principalmente o esporte adaptado. Se tem o deficiente e não tem o esporte adaptado, como é que a pessoa vai jogar se ninguém quer se propor a fazer algo e a se adaptar para ter o esporte?”, questiona a competidora.

De acordo com os dados sobre estudantes com deficiência coletados pela Coordenadoria de Acessibilidade Educacional (CAE), ao todo 597 estudantes da UFSC se declararam com algum tipo de deficiência no segundo semestre de 2022, sendo 395 na graduação e 202 na pós-graduação.

Segundo a professora Bruna, a prática de Goalball, além de trazer benefícios para os atletas, como maior autonomia, confiança e noção de espaço, é uma forma de inclusão. “As pessoas com deficiência são excluídas de várias formas, tanto na educação, quanto no trabalho. Então aqui é um espaço em que eles conseguem ter esse senso de comunidade e pertencimento”, afirma.

Um laço entre ensino, pesquisa e extensão

Leonardo Goulart (E) conheceu a modalidade ainda na graduação, em 2013, e hoje é treinador da equipe da UFSC

Os treinos de goalball também contam com a participação de estudantes da Licenciatura em Educação Física. “A aproximação dos alunos com o método de ensino para as pessoas com deficiência é essencial para a formação acadêmica”, destaca Bruna. Além de ter contato com o esporte, os alunos aplicam na prática o conteúdo aprendido em sala de aula.

Para Guilherme Becker, monitor de uma das turmas do goalball, a participação tem sido enriquecedora. “É um retorno bem positivo tanto na orientação quanto na parte de participação. A gente consegue perceber que eles gostam do esporte e, por exemplo, quando está faltando atleta no dia de treino eles começam a chamar gente para participar, então existe a noção de tentar sempre manter o goalball ativo”, destaca.

A experiência adquirida com a monitoria vai além da Universidade, é uma oportunidade de levar o esporte para a vida. Foi o que fez Leonardo Goulart. Ele conheceu a modalidade ainda na graduação, em 2013, quando ingressou no projeto de extensão como monitor. Após a formatura, inspirado por um de seus professores, decidiu continuar se dedicando ao goalball e hoje é treinador da equipe da modalidade na UFSC há um ano.

“Além de atletas, eu tenho grandes amigos aqui dentro, então hoje o que de fato me motiva é gostar tanto de competição quanto dessa modalidade específica. Algo que eu até costumo falar para os alunos é que se fosse só preparar o treino e vir dar aula seria muito fácil, mas eu não faço só isso. A gente tem essa parceria tanto dentro como fora da quadra, de correr atrás e fazer dar certo”, diz com orgulho.

Maurício Aparecido pratica o goalball há 20 anos e sonha em ver a equipe da UFSC campeã brasileira

Hoje o maior sonho de Maurício Aparecido, que pratica o goalball há 20 anos, é ver a equipe conquistar o brasileiro da Série A, o título mais importante da modalidade. “Nós nos preparamos o ano todo e mesmo que eu não esteja no elenco, quero ver a UFSC e a Associação Catarinense de Esportes Adaptados com essa parceria conquistar o brasileiro”, conta. E o sonho do atleta está mais perto do que parece. Isso porque o Brasil é uma das grandes forças do esporte. Atualmente o time masculino lidera o ranking mundial e a seleção feminina é a sexta melhor do mundo, segundo a Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais (CBDV).

Robson Ribeiro/Estagiário da Secretaria de Comunicação/UFSC

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