
Encontro proporcionou a troca de experiências entre professores e alunos, que relataram suas práticas de jornal laboratório
A mesa comprida dispunha diversas publicações, enchendo os olhos com cores impressas em papel jornal: Zero, Quatro, O Quinto, Cobaia, Primeira Pauta, Fato & Versão, Contato, Extra, Ênfase. O 5º Encontro de Jornais Laboratório de Santa Catarina tinha essa pretensão: misturar experiências, compartilhar vivências, discutir práticas e debater limites e intersecções entre a pedagogia e o mercado. O evento aconteceu durante toda a sexta, 09/12, no Centro de Cultura e Eventos da UFSC, reunindo docentes e estudantes de Comunicação.
Raquel Wandelli, professora da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), abriu o evento fazendo uma retrospectiva dos encontros passados, defendendo o espaço dos jornais laboratório como essenciais ao ensaio do fazer jornalístico. “O homem contemporâneo perdeu a capacidade de experimentar o mundo. O ensino do jornalismo priva o jovem dos perigos necessários desse caminhar quando tende a esgotar a vida, aderindo facilmente aos formatos e linguagens já esgotados no lugar de dizer a esses jovens que se esgotem de viver”.
Dos doze cursos de Jornalismo do Estado, nove se inscreveram no evento. A partir das diretrizes curriculares nacionais, aprovadas pelo Ministério da Educação (MEC), todo curso de jornalismo deve editar seu jornal laboratório. Os coordenadores dos jornais Zero (UFSC), Contato (Estácio de Sá), Ênfase (SATC), Extra (Unisul-Tubarão), Primeira Pauta (Ielusc), Cobaia (Univali), O Quinto (Ibes/Sociesc) e Fato & Versão (Unisul Pedra Branca) apresentaram suas publicações, comentando os processos de confecção dos jornais.

Zero está sempre em busca de novas identidades
Zero – um dia inteiro de dedicação
O Zero é o jornal laboratório mais antigo de Santa Catarina; surgiu em setembro de 1982. O professor coordenador Rogério Christofoletti explicou que o jornal possui disciplina própria, hoje também associada à de Edição II, ministrada por Samuel Pantoja Lima. “Como as duas disciplinas têm seus horários na segunda, os alunos acabam passando o dia em função do jornal”, esclarece.
Christofoletti ressaltou a necessidade de estar sempre reinventando e buscando outras identidades para a publicação, lembrando que a trajetória do Zero é oscilante mas também premiada em oito ocasiões – já conquistou o I Prêmio Foca do Sindicato dos Jornalistas de SC em 2000, como Melhor Jornal Laboratório; foi considerado o 3º melhor Jornal Laboratório do Brasil na Expocom de 1994 e também a melhor peça gráfica Set Universitário da PUC-RS nos anos de 88 a 92 e também em 1998.
O professor ainda destacou a obediência ao deadline (tempo limite para entrega de materiais e finalização do trabalho) e a integração entre estudantes experientes e novatos. “Fazemos os alunos assumirem papéis com mais responsabilidade: temos os editores seniores – que revisam os textos -, e os editores juniores – que legendam fotos, titulam matérias e fecham as páginas”.
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Contato já deu espaço à publicidade
Contato – encarte e publicidade somando-se ao processo pedagógico
Billy Culleton, coordenador do Contato, da Estácio de Sá, relatou que já deu espaço à publicidade em uma das edições. “Aproveitamos a presença de uma aluna que trabalhava com a venda de anúncios; primeiro, para podermos financiar a impressão do jornal, e depois para que os estudantes tivessem a oportunidade de acompanhar a comercialização dos espaços, e foi uma experiência exitosa”. O professor relembrou também o ano de 2008, quando a publicação conquistou grande visibilidade ao ser encartada no diário Notícias do Dia. Hoje o jornal tem tiragem de mil exemplares a cada edição.
Billy ainda destacou o perfil dos alunos de instituições particulares – que tendem a trabalhar durante o dia, estudando no período noturno, o que dificultaria o encontro com os entrevistados, por exemplo. “As matérias acabam sendo feitas apenas com informações vindas da internet. Esquecem eles que ainda não se criou uma tecnologia que dialogue com os cinco sentidos. Os estudantes se baseiam apenas no Google, que hoje terceiriza a nossa memória e o nosso conhecimento; ouvem mais do que falam, não sabem conversar com todas as pessoas”.
O professor entende que a utilização da internet, em detrimento do contato direto com as fontes, produz jornalismo de baixa qualidade. “Quando se exercita a conversação, se percebe como ser desconfiado sem ser ofensivo; como, simplesmente, dialogar. Sem sair às ruas, produzimos pautas burocráticas. Por enquanto, as mídias sociais ainda não são utilizadas por motoristas de ônibus, porteiros, cozinheiros, desempregados, agricultores, que tanto têm de conhecimento para nos passar”.
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Ênfase traz cotidiano de vários municípios
Ênfase – foco no empreendedorismo
O Ênfase, produzido pela faculdade de Jornalismo da Associação Beneficente da Indústria Carbonífera de Santa Catarina (SATC) está em seu quarto ano de publicação e já teve oito edições impressas. A coordenadora do jornal, Marli Vitalli, explica que a proposta editorial engloba assuntos locais, sugeridos pelos acadêmicos. “Muitos estudantes acabam escolhendo temas de cidades vizinhas, onde moram, originando matérias que falam sobre Balneário Rincão e Araranguá, por exemplo”.
A professora relatou que o curso tem avaliado a possibilidade de publicar o jornal – que atualmente imprime mil exemplares – apenas na internet, e destacou ainda a produção disponibilizada no portal SATC. “É a primeira página que aparece quando se pede por SATC. Temos hoje 95% das matérias feitas pelos alunos. São textos produzidos em outras disciplinas, e até os acadêmicos que trabalham em assessorias de imprensa conseguem publicar materiais no portal”.
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Secretaria do Meio Ambiente quer Extra em seu portal
Extra – privilegiando a humanização das matérias
“Como falar sobre ações sustentáveis? Temos que facilitar o processo de conscientização, tornando as informações agradáveis. Vamos contar as histórias das pessoas que trabalham com sustentabilidade”, defende a professora Cilene Macedo, da Unisul de Tubarão.
O Extra tem 17 anos, e a primeira edição do jornal que ela assumiu – com tiragem de 500 exemplares – foi feita neste semestre de 2011/2, focando a sustentabilidade através de um viés mais humanizado. “Apesar da resistência em procurar pelas fontes fora do horário de aula, todos acabaram se envolvendo, e o resultado já é reconhecido fora da Universidade: a Secretaria de Meio Ambiente de Tubarão já no solicitou o arquivo em formato PDF para disponibilizá-lo em seu site”, contou Cilene.
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Primeira Pauta pede coesão ao unir repórter e fotógrafo
Primeira Pauta – semelhanças e diferenças entre o jornal laboratório e o jornalismo diário
Amanda Miranda também assumiu o Primeira Pauta neste semestre, e utilizou de sua experiência com jornalismo diário para guiar os passos dos alunos na confecção da publicação. “Insistimos para que repórter e fotógrafo saíssem sempre juntos, a fim de dar maior coesão às matérias, e fomos bastante rigorosos com os prazos de entrega”.
A professora relatou ainda que a etapa de revisão, que é uma das últimas, não deve ser considerada menos importante, e que, a escolha das pautas também buscava fugir dos assuntos abordados pela mídia tradicional.
O Primeira Pauta é editado desde 1998 – ano de fundação do curso de Jornalismo da Associação Educacional Luterana Bom Jesus (Ielusc) – e é feito nas disciplinas Jornal Laboratório I e II, das quarta e quinta fases, com tiragem de 3 mil exemplares.
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Cobaia garante espaço a imagens do curso de Fotografia
Cobaia – outro foco para as pautas
“Nunca furamos a grande mídia, mas sempre tentamos olhar de um jeito diferente para as pautas. O objetivo é vivenciar o jornal laboratório”, atesta Sandro Galarça, coordenador do Cobaia, da Universidade do vale do Itajaí (Univali).
O professor relembrou das dificuldades que encontrava quando o Cobaia não era atrelado a uma disciplina. “Baixar o jornal era unicamente problema meu. Agora não: todo o processo está vinculado à nota do semestre”.
O Cobaia também serve de espaço de experimentação para os alunos de Publicidade, que podem publicar seus anúncios, e para os do curso de Fotografia, que sempre têm a última página reservada às melhores imagens produzidas no semestre.
Galarça junta-se a Billy quando analisa a atuação dos estudantes. “Tem aluno que pesquisa por ´sugestão de pauta para outubro`, e não percebe que há gente tão ou mais interessante fora da internet. Como diria García Marquez, dessa forma, o aluno acaba não sentindo “o cheiro da notícia”.
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O Quinto: estudantes valorizam a experiência
O Quinto – pressão como forma de crescer
Com uma edição por semestre – já que o curso destina duas horas aula para a confecção do jornal – O Quinto, do Instituto Blumenauense de Ensino Superior (Ibes/Sociesc) já mudou muito de nome e de coordenador. Hoje a publicação privilegia matérias voltadas à comunidade e o professor Fabrício Wolff também já permitiu que anúncios fossem comercializados para ajudar a custear a formatura de uma das turmas.
“Temos muitas dificuldades relacionadas ao aluno não conseguir contato com a fonte. Mas depois que o jornal sai, eles valorizam a experiência, não tanto pelo resultado final, mas porque foram pressionados e conseguiram se superar nesse processo”, atesta o coordenador.
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Fato & Versão: projeto gráfico privilegia autoria dos alunos
Fato & Versão – vivências contra a piedade
Raquel Wandelli conta que o Fato & Versão da Unisul Pedra Branca “busca experiências que possam encantar, ou ainda, reencantar o aluno com a profissão”. Valoriza-se, assim, o encontro presencial dos estudantes com as fontes, principalmente através das vivências – quando os estudantes costumam passar mais tempo com as pessoas que entrevistam. Por esse caminho, foram feitas edições temáticas sobre moradores de rua, comunidades indígenas e populações carcerárias, sempre privilegiando o olhar humanizado e deixando de lado o retrato piedoso que a grande mídia costuma enfatizar.
O projeto gráfico tem mudado bastante. “Penso que vale a pena sacrificar aquilo que se tem como algo mais estético para que esse processo de afirmação, de autoria dos alunos ganhe espaço”.
No segundo semestre de 2011 foi lançado o site Comversão, apresentado pela professora Giovanna Flores. “É aberto a todos os alunos do curso. As edições do Fato também estão disponíveis”.
“Acredito que um dos pontos mais dramáticos no ensino do jornalismo é fazer perder o medo do outro. E o jornal laboratório é lugar privilegiado para fazer acontecer esse encontro”, defende Raquel.
O próximo evento será realizado em 2012, na Universidade do Vale do Itajaí (Univali).
Por Cláudia Schaun Reis/ Jornalista na Agecom
Fotos: Wagner Behr/ Agecom