Ciências forenses: o uso do método e do conhecimento científicos em investigações judiciais

14/09/2022 12:00

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Não são raras as vezes em que aquele seu seriado preferido de investigação começa com uma clássica cena: um detetive adentrando em um ambiente apinhado de peritos que fotografam, coletam amostras, fazem demarcações e simulações no local onde ocorreu um crime. A resolução de casos policiais sempre foi um assunto de grande interesse do público. Além de séries, é hoje objeto de livros, podcasts, webséries e tem até canal de TV dedicado exclusivamente ao tema.

Um dos pontos centrais da curiosidade da audiência é o desenrolar do processo de investigação, as técnicas, as ferramentas e os conhecimentos aplicados na tentativa de elucidar uma ocorrência. Para isso, entram em ação as ciências forenses – um conjunto de métodos e conhecimentos científicos necessários para esclarecer questões específicas que auxiliarão e darão suporte à justiça.

Engana-se quem pensa que esse tipo de ciência é utilizado apenas em casos criminais. Conforme explica Beatriz Barros, doutora pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), especialista em odontologia legal e antropologia forense, “as ciências forenses são utilizadas para desvendar não só crimes, como também variados assuntos legais: cíveis, penais, trabalhistas ou administrativos. O objetivo principal é contribuir com as investigações judiciais”.

As ciências forenses agregam especialistas dos mais diferentes campos. Crédito: Henrique Almeida | Agecom

Beatriz, no entanto, salienta que a realidade performada em filmes e séries é uma representação fantasiosa do trabalho do perito e das ciências forenses. “Nos laboratórios das séries de ficção é possível ver tecnologias superavançadas que, no cotidiano, não existem. Há também uma diferença fundamental no tempo real de resposta. Na ficção tudo se resolve em poucos dias, no mesmo capítulo ou episódio. Na vida real, as análises e seus resultados não são tão imediatos”, pondera.

Da esquerda para direita: as professoras Beatriz Barros e Elisa Winkelmann, e as estudantes Aline Assmann e Aline Jaques. Crédito: Henrique Almeida | Agecom

Ainda que a tecnologia disponível ainda não seja exatamente a exibida nas telas, a variedade de profissionais envolvidos em uma investigação é real. O campo forense agrega peritos das mais distintas áreas. É considerado interdisciplinar por envolver física, química, biologia, antropologia, medicina, odontologia, engenharia, contabilidade, linguística, genética, entomologia, tecnologia da informação – enfim, uma lista extensa e não taxativa.

UFSC cria primeiro laboratório no Sul

A UFSC foi pioneira ao criar o primeiro laboratório dedicado às ciências forenses no sul do país em uma instituição de ensino superior. O Laboratório de Antropologia Forense (Lanfor) começou suas atividades em março de 2017, por iniciativa da professora de anatomia Elisa Winkelmann, neurocientista especializada em sistema nervoso central.

Incentivada por um aluno que havia cursado especialização em antropologia na Universidade de Coimbra, em Portugal, Elisa passou a se dedicar à análise de ossos, a participar de congressos na área e a contatar docentes com interesse na prática forense.

No início, as atividades do Lanfor eram desenvolvidas em diversos laboratórios pertencentes ao Departamento de Ciências Morfológicas. Desde março deste ano, entretanto, o grupo passou a ter um espaço próprio, no prédio do Centro de Ciências Biológicas (CCB), instalado no bairro Córrego Grande, em Florianópolis. O Lanfor conta atualmente com 15 integrantes, entre professores e alunos, que se reúnem às segundas-feiras, ao meio-dia. Os encontros alternam-se: em uma semana há a realização de seminário para apresentação de artigos ou trabalhos no auditório do CCB, sempre em sessões abertas ao público; e, na outra, são realizadas atividades práticas de análise e montagem de esqueletos.

Professor e arqueólogo Marcelo Balvoa (à esquerda) em atividade de escavação de sepultamentos no Rio Vermelho, em Florianópolis. Crédito: Lanfor/UFSC

Dois workshops já foram promovidos pelo laboratório da UFSC. O primeiro foi voltado a profissionais do Instituto Geral de Perícia e o segundo a alunos com interesse na área forense – neste último, as vagas esgotaram-se em seis minutos. Em um dos workshops, em 2018, um dos temas tratados foi a estimativa do perfil biológico de um indivíduo. Na ocasião, os participantes vivenciaram uma demonstração prática, capitaneada pelo professor Marcelo Balvoa, em que os alunos conheceram as técnicas de escavação arqueológica.

A professora Elisa destaca que uma das propostas do laboratório é montar uma coleção de esqueletos identificados. “E, para isso, o foco não é saber o nome da pessoa, mas aplicar o conhecimento para outros tipos de identificação, como estatura, idade, sexo e ancestralidade. Por meio do estudo dessas ossadas, podemos averiguar a compatibilidade com as tabelas que já existem na literatura”, ressalta.

A supervisora do Lanfor, contudo, observa que um dos maiores obstáculos na atividade de identificação humana é a falta de parâmetros nacionais e o consequente uso de tabelas estrangeiras (europeias, americanas e australianas, principalmente) para se estimar as características do indivíduo. Outro problema recente enfrentado pela equipe do Laboratório foi o fim do convênio com a Polícia Científica do Estado de Santa Catarina, antigo Instituto Geral de Perícias (IGP). O acordo entre o órgão estadual e a UFSC garantia a doação de cadáveres para o desenvolvimento de pesquisas na Universidade.

Expertise de inúmeras áreas

São diversos os campos do conhecimento que podem ser empregados na resolução de crimes ou outras situações legais. A botânica, por exemplo, já detectou livros literalmente venenosos, encadernados no século XIX com um tecido imbuído em arsênico. Essa ciência contribuiu ainda para resolução do famoso sequestro do bebê de Lindbergh, em 1932, quando a anatomia da escada usada pelo criminoso e abandonada no local facilitou o veredito dos jurados. Um especialista conseguiu provar que a escada havia sido construída com o mesmo material que estava faltando no assoalho do sótão da casa em que morava o acusado, conforme revelou o padrão de crescimento dos anéis da madeira. O julgamento foi o primeiro caso em tribunal em que a botânica forense foi admitida como prova nos Estados Unidos.

Escada utilizada no rapto do bebê de Lindbergh. Crédito: murderpedia.org

Um tipo de análise também bastante comum é a hematologia, que realiza a avaliação de manchas de sangue formadas durante um crime violento. Um perito especializado pode ajudar a entender a posição e a localização da vítima na hora do crime, o ângulo e a força com que ela foi atingida pelo golpe ou objeto que a matou, bem como a arma utilizada de acordo com padrões formados pelas manchas de sangue.

Outra ciência que colabora com o trabalho investigativo é a tricologia, o estudo dos pelos. A importância desse tipo de material no estudo forense reside na sua resistência à decomposição e, logo, na vantagem de ser extremamente durável. Essa característica é atribuída à cutícula, formada por células achatadas ricas em enxofre que dão forma ao cabelo e que o protegem de choques físicos e agentes químicos potentes. Entre as drogas e substâncias que podem ser verificadas pela medicina forense em amostras estão anfetaminas, anticonvulsivantes, benzodiazepínicos, canabinoides, cocaína, antifúngicos, morfina, níquel, hormônios sexuais e minerais.

> Confira algumas áreas das ciências forenses, como elas podem contribuir em investigações e casos notórios já solucionados com o uso do conhecimento científico

 

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14ª Sepex: Você sabe o que é Entomologia Forense?

12/11/2015 16:32

O Laboratório de Transmissores Hematozoários (LTH) do Departamento de Microbiologia e Parasitologia do Centro de Ciências Biológicas da UFSC está com um estande (89) de Entomologia Forense na 14ª Sepex. O LTH desenvolve projetos de pesquisa de animais utilizados em estudos de caso de Entomologia Forense, que é a área da ciência responsável por aplicar a biologia dos insetos e outros artrópodes em investigações legais. Ela pode ser dividida em três áreas: médico-legal, de produtos e alimentos estocados e entomologia urbana. A equipe do LTH montou uma “cena do crime” em forma de maquete e com bonequinhos para explicar como funcionam os processos. Há dois microscópios em que se podem observar insetos, e estão expostas também as fases de desenvolvimento de alguns deles. Dois estudantes de Biologia explicam os processos e esclarecem as dúvidas: Guilherme Maia, da 10ª fase, que está fazendo seu Trabalho de conclusão de curso (TCC) no LHT, e Isabela Farias, da 4ª fase, voluntária no mesmo laboratório. Muito interessante para crianças e adultos, ensinando de forma lúdica e inserindo a ciência no cotidiano. Vale a pena visitar!

Microscópios e 'cena do crime', no estande de Entomologia Forense- Foto Jair Quint/Agecom/DGC/UFSC

Microscópios e ‘cena do crime’, no estande de Entomologia Forense- Foto Jair Quint/Agecom/DGC/UFSC

Conheça os três ramos da Entomologia Forense (informações contidas no banner fixado no estande nº 89)

. –Entomologia Médico-Legal Baseado nos conhecimentos do ciclo de vida de insetos e outros artrópodes úteis nas investigações legais aplica-os como evidência em casos de assassinato, suicídio, estupro, abuso físico e até contrabando. Geralmente envolve insetos que vivem em contato com animais em decomposição ou restos humanos, estudando-os para estimar o intervalo pós-morte (IPM).

-De produtos e alimentos estocados Estuda a relação entre a infestação de produtos estocados – como arroz, feijão, chá e até chocolates, utilizando esse conhecimento para decidir como controlar as pragas. Outro uso é  o de resolver problemas judiciais de contaminação  de alimentos comercializados, através da estimativa de desenvolvimento desses animais. Pode-se, então, por exemplo, nesses casos determinar se o problema da contaminação veio do produtor e ou vendedor ou do consumidor que estocou o produto de maneira incorreta

. – Entomologia Urbana Estuda a interação entre os insetos e os imóveis (e outros bens estruturais pertencentes ao ser humano) que podem sofrer infestações agressivas ou recorrentes. Por meio dos estudos entomológicos é possível resolver esses problemas ao elucidar tratamentos apropriados  para pestes como cupins ou baratas e também pode esclarecer se um imóvel ou um móvel  já estava infestado previamente à aquisição ou o fato aconteceu posteriormente.

Professor responsável: Carlos José de Carvalho Pinto ( carlospinto@ccb.ufsc.br) Alita Diana/Jornalista da Agecom/DGC/UFSC alita.diana@ufsc.br

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