Novo ensaio no blog Ciência para Todos.
Biografia de um Copo Plástico, por Fredric M. Menger, Emory University, USA
C. Cell queria saber mais sobre como são feitos os objetos de plástico e o que acontece com eles depois que não são necessários. Depois de investigar o tema, ele contou sua história para o Dr. Menger.
Esta é a história da vida de um copo de plástico. Um copo de plástico? Quanto interessante pode ser isto? Muito interessante. Leia mais e descubra como algumas gotas de petróleo do Iraque finalizaram, com o copo como um intermediário, no estômago de uma ave marinha do Havaí.
A existência deste copo começou em um campo de petróleo perto de Kirkuk, no Iraque. Nesse momento havia uma guerra, e este campo de petróleo teve seu gasoduto explodido apenas um dia depois do copo, ou mais precisamente o material do qual era para ser feito, surgiu do solo. O material do copo tinha conseguido escapar, por pouco, da incineração abrupta em fumaça gordurosa preta enchendo o ar do deserto. Obviamente, as poucas gramas de petróleo bruto relevantes para esta história vinham acompanhadas por enormes quantidades adicionais de petróleo, mas essa história é apenas sobre o que aconteceu com o óleo que eventualmente foi transformado em um copo de plástico. Muito do óleo restante tem sua própria história especial. Foi convertido em gasolina, asfalto, parafina, tecidos, detergentes e outros produtos da civilização.
Depois de ser armazenado em um tanque, enquanto o oleoduto danificado era reparado, o óleo foi bombeado 600 milhas a oeste até o porto de Ceyhan, na Turquia, no Mar Mediterrâneo. Esta foi uma carona precária para nosso “futuro copo”. Viajando a 16 quilômetros por hora acima do solo, em um tubo de aço de 2 metros de diâmetro, o petróleo bruto podia, em qualquer tempo ou lugar, começar a vazar devido à corrosão, terremotos, ou danos feitos pelo homem. Na Nigéria, por exemplo, um oleoduto com vazamento de petróleo explodiu, matando 1.200 moradores.
Mas, felizmente, a amostra de óleo, cuja história está sendo rastreada aqui, só tinha de suportar uma série de bombeamentos necessários para empurrar o petróleo para frente. Quando chegou à beira-mar, o óleo foi carregado em um navio-tanque para uma viagem longa, mas tranquila para Port Arthur, no Texas, EUA. Embora o nosso “copo” possa parecer muito viajado nesse momento (tendo viajado por quase metade do caminho de uma volta ao mundo), estas andanças foram apenas o começo, como veremos em breve.
O petróleo bruto é uma mistura horrível. Em uma refinaria de Port Arthur, o petróleo foi passado através de torres de destilação que separou-o em seus vários componentes. Um desses componentes é chamado de “hexano”, um hidrocarboneto com seis carbonos em cadeia. O hexano foi então “reformado” (a 500o, com um catalisador de platina) em benzeno (um anel de seis carbonos). Após prender mais dois carbonos no anel de benzeno, os engenheiros químicos converteram o benzeno em um líquido amarelado chamado de “estireno”. E finalmente (para acabar com essa parte química da história do copo), milhares de moléculas de estireno foram todas ligadas entre si para formar um material sólido, chamado de “poliestireno”. Poliestireno, pertence à classe de materiais chamados “polímeros”, é o principal material usado para fazer aqueles familiares copos de café de plástico branco.
O poliestireno é fabricado na forma de pequenos grânulos de em torno de um milímetro de diâmetro. Estes grânulos, inclusive os destinados a se tornarem nosso copo, foram enviados de trem para Califórnia, na costa oeste dos EUA, e de lá de barco até um grande país da Ásia. Do Iraque para Turquia para Texas para Califórnia para Ásia….uma aventura global! Desta forma os grânulos acabaram em uma fábrica perto de uma grande cidade. É aqui que as gotas foram fundidas e depois expandidas até dez vezes o volume original (por gás injetado na mistura) para formar um plástico leve e delicado. O poliestireno expandido, em seguida, foi moldado em copos brancos, e os copos foram vendidos em toda Ásia. Finalmente, depois da complicada viagem e tecnologia, nosso copo fez a sua aparição modesta como um objeto reconhecível. Em homenagem ao evento, o nosso copo será designado como “o Copo”.
O Copo, junto com muitos companheiros, foi levado num pequeno caminhão e entregue no depósito de um hotel caro na região central de uma metrópole asiática. Uma semana depois, um rico empresário recebeu o Copo, quando ele pediu um lanche na tarde em seu quarto de hotel. Aconteceu que, o empresário, que queria seu chá em uma xícara apropriada de cerâmica, desgostoso jogou o Copo, não utilizado, em um cesto de lixo. O Copo posteriormente foi levado do cesto de lixo do hotel para a maior coletora de lixo da cidade por um homem que amarrou um enorme saco de lixo descartado em sua bicicleta, um emprego como transportador que o ajudava a sustentar uma família de seis pessoas.
Aconteceu que o depósito de lixo não estava longe da cidade porque, como em muitas partes do mundo, os depósitos de lixo estão “convenientemente” localizados nas proximidades. Centenas de moradores de favelas ganham a vida coletando itens específicos nas toneladas de plástico, papel, metal e outros descartes da vida da cidade que chegavam diariamente à pilha de lixo. Filas de pessoas, cada uma com um saco de itens coletados da pilha de lixo, reuniam-se para vender o produto do trabalho do seu dia de trabalho a um atacadista de lixo. O atacadista de lixo separava todos os itens de plástico e os vendia a um homem que, por sua vez, empregava gente para examinar as bolsas, brinquedos, embalagens, garrafas e copos e enquanto coletavam iam organizando-os de acordo com a qualidade e cor. E é aqui onde o nosso Copo, que já está com uma desagradável cor marrom, mas por outro lado, ainda intacto, fez sua última aparição. O Copo, juntamente com uma montanha de plásticos, foram vendidos a uma pequena empresa que moia os plásticos, transformando-os em flocos que foram lavados, derretidos e transformados em bolinhas.
As bolinhas, compostas agora por vários plásticos incluindo aquele do Copo, foram vendidas para um fabricante local que fazia baldes para exportar para Estados Unidos. Baldes desta empresa eram orgulhosamente anunciados como “biodegradáveis” porque eram construídos incorporando as bolinhas em um plástico biodegradável à base de celulose (as bolinhas em si não são biodegradáveis). Outra característica atraente dos baldes era o fato de que eles podiam ser vendidos mais baratos que baldes feitos nos Estados Unidos. O corante, usado para colorir os baldes de vermelho, era a principal despesa; os custos de mão de obra contribuíam com apenas um mínimo para o custo total.
Assim, o Copo, na forma de balde, voltou a Califórnia. Um pescador por esporte, comprou o balde numa loja de ferragens, levou-o a bordo de seu barco de pesca para manter vivas as iscas. Depois de servir a este propósito, durante cerca de um ano, o balde rachou-se no fundo, durante uma viagem de pesca. Estando agora inútil, o balde foi esmagado pelo tacão da bota do pescador, e as peças foram atiradas, sem pensar, no Oceano Pacífico.
As peças do balde foram levadas pelo mar para uma área conhecida como a “Grande Mancha de Lixo do Pacífico”. Correntes que circulam confinam o lixo em uma área enorme do oceano do tamanho do Texas (o tamanho exato deste assim chamado “giro” está em debate). Firmemente presos na terrível região contaminada, o plástico de celulose começou a degradar e a liberar as bolinhas. Uma ave marinha infeliz comeu algumas das bolinhas de plástico (em inglês denominadas “nurdles”) após confundi-las com ovos de peixe. Mas, claro, ao invés de ovos de peixes, eram esferas de poliestireno do Copo. Quem teria imaginado que algumas gotas de petróleo do Iraque iriam acabar na garganta de uma das aves marinhas no Havaí? Neste caso, a ave marinha teve muita sorte porque não comeu o suficiente para o plástico bloquear fatalmente seu intestino. Em vez disso, as bolinhas de plástico foram depositados no alto de um penhasco havaiano onde permanecem até hoje. As bolinhas de plástico (“Nurdles”) são para sempre.
O Blog Ciência Pra Todos
A ação de popularização da ciência tem apoio de pesquisadores do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Catálise e Sistemas Moleculares e Nanoestruturados, com sede na UFSC.
Brevemente teremos também ensaios adicionais discutindo Alcaloides: Presentes da Natureza e Fluorescência em plantas.
Abraço e boa leitura,
Faruk Nome / Departamento de Química da UFSC
INCT Catálise e Sistemas Moleculares Nanoestruturados