Físico Marcelo Gleiser fala da raridade da vida e da nova ética cósmica

Marcelo Gleiser falou sobre a importância da imperfeição para a evolução do Universo. Foto: Jair Filipe Quint / Agecom / UFSC
O físico Marcelo Gleiser esteve em Florianópolis nesta semana para ministrar a palestra “Criação imperfeita buscando por significado na era ciência”. Gleiser era um dos três convidados do ciclo de conferências “Fronteiras do Pensamento Santa Catarina 2013” e falou, para um auditório lotado na Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), sobre astronomia, ciência, curiosidade, criatividade, ética cósmica, entre outros assuntos. Ao final da palestra, o debate teve a participação do presidente do Grupo de Estudos de Astronomia (GEA) da UFSC, professor Adolfo Stotz.
Marcelo Gleiser falou que, longo da história da humanidade, firmou-se a ideia de que o universo tende ao ordenamento e à simetria, como as órbitas dos planetas e o ciclo de gestação podem nos levar a pensar. Assim, eventos inesperados, como cometas e terremotos, dão a sensação de perda de controle, de que o inesperado não é bom. “No entanto, é de eventos inesperados que surgem as mudanças e a evolução”, afirma.
Para Gleiser, todas as diferentes culturas humanas desenvolveram uma história para explicar a criação do mundo e a origem da vida. “A cada mudança na visão cósmica, há uma desorientação espiritual das pessoas”, explicou Gleiser, exemplificando com os diferentes modelos que buscavam explicar o universo, como o geocêntrico, o heliocêntrico, o de uma única galáxia e o de múltiplas galáxias. “Um dos objetivos da ciência moderna é entender esse mundo, quem somos nós nessa imensidão e por que a vida existe”, afirma Gleiser.
Dos 200 bilhões de estrelas da nossa galáxia, 160 bilhões têm planeta, mas o Universo não favorece a vida, o que torna o planeta Terra um oásis, um local raro. “Diante da imensidão do Universo, podemos nos considerar insignificantes; mas proponho outro ponto de vista: nós importamos porque somos raros”, afirma. “Para todos os efeitos, estamos sozinhos e somos os únicos seres a pensar sobre si mesmos; somos, portanto, a consciência do Universo”, ressalta Gleiser, destacando a importância de entender a nossa raridade, a preservação da vida, da casa onde moramos. “Essa é a nova ética cósmica que vem da ciência”, completa.
Ao final, no debate, Marcelo Gleiser respondeu a perguntas sobre o Bóson de Higgs, o Big-Bang, e também o conceito de “nada”, do princípio da incerteza e do emaranhamento quântico. Falou ainda do debate sobre ciência e religião, astrologia, a ida do homem à Lua, a razão e a emoção. “Acho que não existe a separação entre razão e emoção; estamos sempre misturando os dois, tornando-os uma coisa só”.
Gleiser destacou também o quanto ainda precisamos aprender sobre o Universo. “Somos cercados pelo mistério. Esse engajamento com o desconhecido é profundamente espiritual e religioso. É o que chamamos de espiritualidade científica: o amor pelo natural que nos faz transcender”, e finalizou alertando sobre nossa responsabilidade no planeta. “A Terra é grande, mas é um planeta finito, e nós vivemos nele como parasitas. Precisamos conscientizar-nos e agir, produzir menos lixo, consumir menos energia e água. Cada um tem o seu papel”.
Leia alguns trechos da palestra:
“Para Bernard le Bovier de Fontenelle (1686), toda filosofia é baseada em apenas duas coisas: miopia e curiosidade. O dilema é que queremos ver alem do que enxergamos. Ou seja, nós conseguimos enxergar uma fração ínfima do que realmente está acontecendo, mas o que nos move é a curiosidade”.
“Nas várias culturas humanas, todas têm uma história sobre a crianção do mundo, que busca explicar a origem da vida. Essas são perguntas tão antigas quanto a história da humanidade e que ainda nos fazemos”.
“É trabalho do adulto mostrar para as crianças, que são cientistas por natureza, com uma curiosidade constante, sempre perguntando sobre as coisas, com o frescor da mente. Este esforço pode começar em casa. Por isso, compre livros, fale sobre os diferentes temas, essa é uma maneira de começar a conversa”.
“Por trás dos processos da natureza, nota-se a importância da imperfeição. Isso porque o que é perfeito não muda. O desequilíbrio é necessário para as coisas acontecerem.”
Assista ao vídeo com o qual Marcelo Gleiser abriu a palestra:
Laura Tuyama / Jornalista da Agecom / UFSC
laura.tuyama@ufsc.br
Foto: Jair Filipe Quint / Agecom / UFSC