Simpósio internacional discutirá pensamentos do escritor Mariátegui

05/06/2013 10:25

A atualidade de José Carlos Mariátegui para pensar os imensos dilemas e desafios do presente. É o que propõe o Simpósio Internacional Mariátegui no século XXI, organizado pelo Núcleo de Estudos de História da América Latina (NEHAL/UFSC), com o apoio do Instituto de Estudos Latino-Americanos, nesta quarta e quinta-feira, dias 5 e 6 de junho, no Auditório do Centro de Ciências da Educação (CED/UFSC). 

A conferência de abertura, às 18h30min, é sobre “Utopía y Educación em el pensamiento de José Carlos Mariátegui”, com a professora Sara Beatriz Guardia, da Universidad San Martin de Porres, do Peru. Autora de vários livros, entre eles, “Mariátegui en el siglo XXI: textos críticos”, este como organizadora, e “José Carlos Mariátegui. Una visión de gênero”, Sara La Guardia tem uma trajetória intelectual variegada. Seus livros contam o mundo das mulheres (“Mujeres que escriben en América Latina”,Las mujeres en la Independencia de América Latina”,  “Voces y cantos de las mujeres”), mas também falam de alimentos que nutrem o corpo na história (“La ruta de la papa de los Andes peruanos a Europa”,  ”Una fiesta del sabor. El Perú y sus comidas”). 

Na quinta, dia 6, às 9h, a conferência “José Carlos Mariátegui, La Revista Amauta y El Pensamiento Marxista Latino-americano” vai ser dada pela professora Monica Bruckmann, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), autora de “Mi sangre em mis ideas: Dialéctica y prensa revolucionária em José Carlos Mariátegui” (Editora El Perro y La Rana – Caracas, Venezuela). O lançamento de livros das conferencistas vai acontecer após a mesa-redonda das 18h30min, em que as duas, juntamente com Elvis Humberto Poletto, da UFSC, falam de “Mariátegui no século XXI”.

Nós mesmos, porque universais

O pensador, escritor, jornalista, ativista José Carlos Mariátegui é autor de um dos clássicos latino-americanos “Sete ensaios de interpretação da realidade peruana”, no qual o autor ensina, no seu sétimo ensaio, sobre a literatura, que a leitura é um processo. E é através da leitura, como diz Mariátegui, no finalzinho do último ensaio, que “pelos caminhos universais, ecumênicos, que tanto nos censuram, vamos nos aproximando, cada vez mais, de nós mesmos.”

Mas, para apreender o pensamento deste escritor peruano essencial para o pensamento crítico latino-americano, é importante conhecer alguns fatos de sua biografia. Uma vida de apenas 35 anos, mas surpreendente pela profundidade da obra que deixou como herança. Mariátegui foi um criador de ideias, um antiautoritário e sensível homem de ação que, em sua breve e intensa vida, conseguiu oferecer, no seu tempo, a obra mais original do marxismo latino-americano. Uma obra que ainda nos brinda pelo frescor das ideias e pela análise esperançosa.

Mariátegui abriu caminhos para uma reflexão própria do marxismo. Sua obra teórica – e sua visão sobre a formação social e étnica da Indo-América – influenciou desde a revolução cubana, Che Guevara, até os zapatistas de Chiapas, e segue inspirando movimentos que lutam pela liberdade e igualdade e pela emancipação da América Latina.

É um detalhe – que faz diferença – o fato de que este pensador seja um poeta e jornalista. Mariátegui cultivou desde cedo  o gosto pelos debates das vanguardas artísticas e a profissão de jornalista, no início da carreira, o levou a escrever sobre assuntos tão diversos quanto corridas de cavalo e notícias policiais. Publicou poemas, fundou revistas de humor e arte.

“Nosso juízo e nossa imaginação se sentirão sempre atrasados em relação à totalidade do fenômeno… por conseguinte, o melhor método para explicar e traduzir nosso tempo é talvez, um método um pouco jornalístico e um pouco cinematográfico”, ele escreveu.

Mariategui foi esquecido, depois recuperado. Tem sido também, muitas vezes, vítima de interpretações que, de alguma forma, despedaçam o pensamento científico revolucionário que brota do seu processo personalíssimo criação, o qual se nutre da investigação como processo para conhecer, explicar e transformar.

Editor da Revista Amauta, palavra quéchua que significa sábio, sacerdote – codinome com o qual acabou identificado – Mariátegui era um autodidata que nunca quis perder seu caráter extrauniversitário (e, talvez, até antiuniversitário, como diz num breve relato autobiográfico). “Estou profundamente afastado do espírito universitário”, diz também no texto de “Advertência” que abre seu livro “Sete Ensaios de interpretação da realidade peruana”.

Ele apresenta o grupo da revista Amauta como uma força beligerante e polêmica que não faria qualquer “concessão ao critério geralmente falaz da tolerância de ideias”. A intolerância de que falava era em relação ao que considerava ideias más.

Era um pensador que não se escondia nas trincheiras de uma ciência que se nega a fazer a relação com a política e a vida real: “Fazer política é passar do sonho às coisas, do abstrato ao concreto. A política é o trabalho efetivo do pensamento social; a política é a vida. Admitir uma quebra de continuidade entre a teoria e a prática, abandonar os realizadores a seus próprios esforços, ainda que lhes concedendo uma cordial neutralidade, é renunciar à causa humana. A política é a própria trama da história.”

“Meu pensamento e minha vida” – se declarava o escritor – “constituem uma coisa só, um único processo… E se existir algum mérito que eu espero e reclamo que me reconheçam é o de pôr todo o meu sangue em minhas ideias”.

Também provoca certo desconforto – para os que propõem avaliações mais dogmáticas – o fato de Mariátegui ter declarado a descoberta e leitura da América depois, ou durante, o período em que viveu na Europa (de 1919 a 1923): “A Europa me revelou até que ponto eu pertencia a um mundo primitivo e caótico; e ao mesmo tempo me impôs, me deixou claro o dever de uma tarefa americana”.

A crítica ao seu suposto europeísmo ele responde na mesma “Advertência” que introduz seus Sete Ensaios: “Não faltará quem me considere um europeizante, alheio aos fatos e aos problemas do meu país. Que a minha obra me faça justiça contra essa barata e interessada conjectura. Fiz na Europa o meu melhor aprendizado. E acredito que não haja salvação para a Indo-América sem a ciência e o pensamento europeus e ocidentais. Sarmiento, que é ainda um dos criadores da argentinidade, foi na sua época um europeizante. Não achou melhor maneira de ser argentino.”

Mariátegui buscava um lugar para a Nossa América, ao sul do mundo – como diz Alberto Aggio. E sua metodologia e perspectiva de ação se apresentam ainda hoje com vigor e atualidade no sentido de uma proposição de vocação universalista que se condensa naquilo que proclamou na apresentação de Amauta: “Todo humano é nosso.”

Mariátegui, por ele mesmo

Em uma carta de 1927, enviada ao escritor Enrique Espinoza, diretor da revista La Vida Literária, publicada em Buenos Aires, Mariátegui conta a si mesmo:

“Aunque soy un escritor muy poco autobiográfico, le daré yo mismo algunos datos sumarios. Nací el 95. A los 14 años entré de alcanza-rejones en periódico. Hasta 1919 trabajé en el diarismo, primero en “La Prensa”, luego en “El Tiempo”, finalmente en “La Razón”. En este último diario patrocinamos la reforma universitaria. Desde 1918, nauseado de política criolla me orienté resueltamente hacia el socialismo, rompiendo con mis primeros tanteos de literato inficionado de decadentismo y bizantinismo finiseculares, en pleno apogeo. De fines de 1919 a mediados de 1923 viajé por Europa. Residí más de dos años en Italia, donde desposé una mujer y algunas ideas. Anduve por Francia, Alemania, Austria y otros países. Mi mujer y mi hijo me impidieron llegar a Rusia. Desde Europa me concerté con algunos peruanos para la acción socialista. Mis artículos de esa época señalan estas estaciones de mi orientación socialista. A mi vuelta al Perú, en 1923, en reportajes, conferencias en la Federación de Estudiantes, en la Universidad Popular, artículos, etc., expliqué la situación europea e inicié mi trabajo de investigación de la realidad nacional, conforme al método marxista. En 1924 estuve, como ya lo he contado, a punto de perder la vida. Perdí una pierna y me quedé muy delicado. Habría seguramente ya curado del todo con una existencia reposada. Pero ni mi pobreza ni mi inquietud espiritual me lo consienten. No he publicado más libros que el que Ud. conoce. Tengo listos dos y en proyecto otros dos. He aquí mi vida en pocas palabras. No creo que valga la pena hacerla notoria; pero no puedo rehusarle los datos que Ud. me pide. Me olvidaba: soy un autodidacta. Me matriculé una vez en letras en Lima, pero con el solo interés de seguir el curso de latín de un agustino erudito. Y en Europa frecuenté algunos cursos libremente, pero sin decidirme nunca a perder mi carácter extrauniversitario y tal vez, si hasta anti universitario. En 1925 la Federación de Estudiantes me propuso a la Universidad como catedrático en la materia de mi competencia; pero la mala voluntad del Rector y, seguramente, mi estado de salud, frustraron esta iniciativa.”

Confira a programação completa do Simpósio Internacional sobre Mariátegui:

5 de junho

18h30 – Mesa de abertura

19h – Conferência “Utopía y Educación em el pensamiento de José Carlos Mariátegui”, com a professora Sara Beatriz Guardia – Universidade de San Martin de Porres – Peru.

6 de junho

9h – Conferência “José Carlos Mariátegui, La Revista Amauta y El Pensamiento Marxista Latino-americano”, com a professora Monica Bruckmann – Universidade Federal do Rio de Janeiro

18h30 – Mesa-redonda “Mariátegui no Século XXI

Professora Sara Beatriz Guardia – Universidade de San Martin de Porres – Peru

Professora Monica Bruckmann – Universidade Federal do Rio de Janeiro

Elvis Humberto Poletto – Universidade Federal de Santa Catarina

21h30 – Lançamento de livros

Mariátegui en el siglo XXI – textos críticos” – Org. Sara Beatriz Guardia – Librería Editorial Minerva – Lima,Perú, 2012.

Mi sangre em mis ideas: Dialéctica y prensa revolucionária em José Carlos Mariátegui” – Monica Bruckmann – Editora El Perro yLa Rana – Caracas, Venezuela

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Por Raquel Moysés – jornalista/Iela

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