Pesquisadora francesa fala sobre experimentos com seres humanos

11/12/2012 13:49

Ilana Lowy falou sobre um experimento norte-americano que durou 40 anos e se tornou símbolo do tratamento desumano contra populações pobres e negras. Fotos: Henrique Almeida / Agecom / UFSC

Na sexta-feira, 7 de dezembro, o doutorado Interdisciplinar em Ciências Humanas da UFSC recebeu a historiadora de ciência e medicina Ilana Lowy, que ministrou a palestra “Ensaios Médicos com Seres Humanos”. Ilana é pesquisadora do Centre de Recherche, Médecine, Sciences, Santé et Societé (CERMES) de Paris.

A pesquisadora iniciou falando sobre o Tuskegee Experiment, um estudo conduzido pelo U.S. Public Health Service (PHS), o serviço de saúde pública dos Estados Unidos, na Universidade do Alabama, que observava pacientes com sífilis nos últimos estados da doença. O estudo que durou quarenta anos, de 1932 a 1972, tornou-se símbolo de tratamento desumano de populações pobres e, especialmente, populações negras.

Em seguida a pesquisadora apresentou o artigo “Paved with good intentions”, expressão inglesa que em português seria algo como “O caminho do inferno está cheio de boas intenções”. O artigo compara dois experimentos com seres humanos, o primeiro sobre o tratamento da febre amarela que aconteceu no Brasil, em 1903, e um estudo de sífilis conduzido na Guatemala, entre 1947 e 1948. Segundo a autora, os dois estudos apresentavam “boas intenções” no início, visando a ajuda às populações locais e transferência de tecnologia. Outra característica em comum nesses experimentos é que os médicos envolvidos não acreditam estar fazendo algo antiético, mesmo quando procuram maquiar as evidências.

Em 1903 o sanitarista Oswaldo Cruz foi nomeado Diretor-Geral de Saúde Pública no Rio de Janeiro com a missão de combater a epidemia de febre amarela. Como ex-aluno do Instituto Pasteur, o médico trouxe uma delegação da França para estudar a doença em Petrópolis. A pesquisa apresentou vários problemas, os já doentes não respondiam a aplicação das vacinas e a frequência de contágio natural pelo mosquito era muito baixa. Então a delegação começou a infectar deliberadamente pessoas saudáveis para testar o potencial preventivo da vacina. Este caso é relatado no livro de Ilana, “ Vírus, mosquitos e modernidade” (2006, Editora Fiocruz, disponível para download), que apresenta a história da febre amarela no Brasil.

O outro exemplo que a historiadora apresentou foi o ocorrido na Guatemala nos anos de 1947-48, sobre sífilis, também conduzido pelo PHS. Os experimentos começaram sendo testados em prisioneiros guatemaltecas, mediante consentimento destes. Prostitutas infectadas com sífilis eram contratadas para terem relações sexuais com os prisioneiros, mas como muitos homens seguiam sem ser contaminados, começaram a infectá-los diretamente com a bactéria. Em seguida o procedimento começou a ser aplicado em hospitais psiquiátricos. O objetivo do estudo era ver se a penicilina poderia prevenir a infecção depois da exposição a doença. Detalhes da pesquisa só foram descobertos em 2010, depois que o diário com anotações de campo do dr. John C. Cutler foi revelado.

Ilana também apresentou uma palestra sobre gênero e biomedicina no CFH, no mesmo dia. As atividades foram organizadas pelo Doutorado Interdisciplinar em Ciências Humanas Interdisciplinar em Ciências Humanas, Instituto de Estudos de Gênero, Núcleo de Estudos em Filosofia e Saúde (NEFIS) e Núcleo de Pesquisa em Bioética e Saúde Coletiva (NUPEBISC), Núcleo de Identidades de Gênero e Subjetividades (NIGS).

Patrícia Cim / Estagiária de Jornalismo da Agecom / UFSC
patriciacim@gmail.com

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