Controle de cinco fatores de risco prolonga vida em até 14 anos, aponta estudo com coautoria da UFSC

Tabagismo é um dos fatores de risco cardiovascular que, quando evitados na meia idade, podem levar a aumento na expectativa de vida
Pessoas que conseguem controlar cinco fatores de risco cardiovascular frequentes na faixa dos 50 anos de idade podem aumentar em até 14 anos sua expectativa de vida. A conclusão é de uma grande pesquisa global que envolveu dados de mais de 2 milhões de participantes, coordenada por um consórcio científico liderado pela Universidade de Hamburgo, na Alemanha, e que contou com a participação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) por meio do estudo EpiFloripa – Condições de Saúde de Adultos e Idosos de Florianópolis.
O artigo Global effect of cardiovascular risk factors on lifetime estimates, publicado no The New England Journal of Medicine (NEJM) em março de 2025, considera a relação entre aumento da expectativa de vida saudável e o controle de cinco fatores de risco cardiovascular: hipertensão arterial, hiperlipidemia, obesidade/sobrepeso, diabetes e tabagismo.
O principal resultado da pesquisa indica que a ausência desses cinco fatores de risco aos 50 anos está associada a uma expectativa de vida significativamente mais longa: são mais 13,3 anos adicionais de vida livre de doença cardiovascular, no caso das mulheres, e 10,6 anos para os homens. Os anos adicionais de vida total para quem controla os cinco fatores de risco na meia idade são de até 14,5 para mulheres e 11,8 para homens.
Para chegar nessa estimativa global, os pesquisadores harmonizaram dados de mais de 2 milhões de participantes em 133 coortes (tipo de pesquisa epidemiológica na qual os mesmos participantes são acompanhados por muito tempo), abrangendo 39 países e seis continentes, coletados e organizados por diferentes instituições de pesquisa científica.
Fatores de risco
A professora Eleonora d’Orsi, que atua no Departamento de Saúde Pública da UFSC e é uma das coautoras do artigo, explica que a contribuição do EpiFloripa para a pesquisa global corresponde aos dados de 1.700 participantes, todos acompanhados pelo estudo da Universidade. “Essa é uma iniciativa de muita potência em termos de saúde pública, não só em função do tamanho da amostra, mas porque consegue, respeitando a lógica de um desenho longitudinal de acompanhamento, realmente calcular o risco e a incidência desses eventos e ver o quanto esses fatores de risco são preditores”, destaca a professora. “E também dizer o quanto que mudar esses fatores pode fazer com que uma população ganhe tempo a mais de vida total e de vida sem um evento cardiovascular”, ressalta.
A descoberta reforça a ideia de que sempre vale a pena tanto prevenir quanto buscar tratamento para os fatores de risco. A análise das trajetórias de risco mostrou que a modificação de certos fatores entre 55 e 60 anos gerou o maior benefício. O controle da hipertensão arterial na meia idade foi associado ao maior ganho de anos de vida livre de doenças cardiovasculares. Já a cessação do tabagismo nesse mesmo período foi associada ao maior ganho de anos de vida livre de morte.
Prevenção e tratamento no sistema público
A existência do Sistema Único de Saúde (SUS), com abordagens preventivas e tratamentos para os cinco fatores de risco, é apontada pela professora Eleonora d’Orsi como uma grande vantagem do Brasil em relação aos outros países. “O Brasil tem um sistema de saúde que dá suporte para isso acontecer”, afirma. Ela ressalta que nos centros de saúde é possível fazer acompanhamento de indicadores metabólicos, exames laboratoriais que detectem índices altos de colesterol ou glicose e até tratamentos para cessação do tabagismo – e, quando necessário, medicamentos também são disponibilizados de forma pública. “Uma pesquisa como essa mostra que é importante continuar tendo a atenção básica, manter o foco em diminuir os níveis de pressão arterial, em melhorar o peso, em promover atividade física e alimentação saudável. E continuar insistindo para as pessoas pararem de fumar”, analisa.
Outro aspecto que a professora Eleonora destaca é a responsabilidade da sociedade como um todo para a garantia de um envelhecimento mais saudável da população. “Às vezes é difícil mudar um comportamento individual, porque ele depende também do que o nosso meio social faz em termos de alimentação, consumo de tabaco e álcool, prática de atividade física, e das oportunidades que a sociedade oferece para as pessoas aderirem a essas mudanças”, analisa.
Metodologia
O estudo publicado no NEJM – uma das publicações da área com maior fator de impacto – é um recorte da iniciativa Global Cardiovascular Risk Consortium (GCVRC), sediada na Universidade de Hamburgo, Alemanha. Para chegar a resultados com essa abrangência, os pesquisadores realizaram uma harmonização de dados de nível individual, o que é um ponto forte inédito do trabalho.
A pesquisa envolveu uma amostra de 2.078.948 participantes e uniu 133 pesquisas do tipo coorte – que acompanha os mesmos participantes por um longo período, permitindo medir a evolução das pessoas e dando mais potência para estudar causalidade e fatores de risco. Os dados vieram de 39 países e seis continentes. Para garantir a análise de incidência futura, foram excluídos os dados de pessoas que já tinham alguma doença cardiovascular no início do acompanhamento dos coortes. Para a professora Eleonora d’Orsi, esse é um dos grandes diferenciais do estudo epidemiológico.
EpiFloripa
A contribuição da UFSC para o GCVRC se deu por meio do estudo EpiFloripa, focado no envelhecimento da população de Florianópolis, coordenado pela professora Eleonora d’Orsi desde 2008, com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Em 2009/2010, o Epifloripa entrevistou 1.700 pessoas com 60 anos ou mais residentes na área urbana de Florianópolis, acompanhando-as a cada aproximadamente quatro anos desde então. Os dados foram enviados anonimizados para a pesquisa global, incluindo medidas de pressão arterial, peso, estatura, tabagismo, histórico de diabetes e dosagem sanguínea de lipídios. O estudo EpiFloripa continua em andamento, com a próxima coleta de dados prevista para 2026.
Ana Paula Lückman | ana.paula.luckman@ufsc.br
Jornalista da Agecom | UFSC






























