Pesquisadores da UFSC fazem descoberta que pode contribuir com tratamento de infertilidade em homens

Estudo da UFSC avança na compreensão de células importantes para a fertilidade (Imagem de Daniel Reche por Pixabay)
Ao estudar a eletricidade das células de Sertoli, que dão suporte e nutrem os espermatozóides, uma equipe liderada pelo Instituto de Bioeletricidade Celular (Ibiocel) da Universidade Federal de Santa Catarina conseguiu entender com mais assertividade o que pode caracterizar a infertilidade masculina e como é possível enfrentar o problema com tratamentos em mecanismos que se relacionam a ela. A Organização Mundial da Saúde divulgou, em 2023, que uma em cada seis pessoas é afetada pela infertilidade em todo o mundo.
“Nós estudamos esse problema olhando diretamente para o pilar da alteração: as células envolvidas na produção de espermatozoides. Para isso, usamos a eletrofisiologia, uma técnica que mede com precisão como as ‘portas’ da célula — chamadas de canais iônicos, localizados na membrana celular — funcionam”, explica a professora Fátima Regina Mena Barreto Silva. O estudo Clinical Electrophysiology and Mathematical Modeling for Precision Diagnosis of Infertility foi publicado na revista suíça Biomedicines.
Combinando técnicas de modelagem matemática a este olhar detalhado para o comportamento da eletricidade na célula, cientistas conseguem entender de forma profunda o que pode atrapalhar a fertilidade. Isso pode “abrir caminho para novas soluções”, como informa a professora.
Dentre as principais descobertas da equipe está a confirmação de que algumas proteínas da membrana das células de Sertoli funcionam como espécies de interruptores. “Quando recebem estímulos de hormônios ou de agentes externos, elas disparam uma resposta imediata que muda o comportamento da célula em questão de milissegundos. Essa descoberta foi uma das maiores surpresas da pesquisa”, explica a professora.
O estudo buscou entender o comportamento dos hormônios Folículo-Estimulante (FSH), da tireóide, da testosterona, além da Vitamina A, e da 1,25-(OH)2 vitamina D3. No caso da D3, a pesquisa demonstrou uma ação rápida da sua forma ativa nas células de Sertoli. Na prática, ela promove mudanças elétricas para a secreção de substâncias e, consequentemente, para a fertilidade masculina
“Nosso trabalho mostra alvos bem específicos na superfície e dentro da célula que podem ser explorados tanto para diagnóstico quanto para criar medicamentos mais eficazes. Isso levanta a possibilidade de tratamentos personalizados para homens com infertilidade”, explica a professora.
Estas células, que ficam localizadas nos testículos, têm, conforme a pesquisa, um controle elétrico preciso, ajustando-se ao ambiente hormonal e nutricional para garantir um desenvolvimento saudável aos espermatozóides. É justamente a compreensão desses fenômenos que abre portas para diagnosticar e tratar a infertilidade masculina.
Tratamentos
A equipe da UFSC combina a modelagem matemática para garantir mais assertividade a potenciais tratamentos. “A eletrofisiologia mostra como a célula reage na prática, enquanto a modelagem matemática ajuda a prever e confirmar esses resultados”, diz Fátima. Enquanto a eletrofisiologia permite observar em tempo real como a célula reage a diferentes estímulos, como hormônios e nutrientes, com os dados coletados por meio desta técnica os pesquisadores criam modelos complexos em computadores, funcionando como um “simulador virtual”.
Conforme a pesquisadora, os experimentos servem para validar as simulações matemáticas. “Uma simulação validada permite testar mais de mil cenários em um mês, algo que exigiria um número enorme de horas de bancada e alto custo. Hoje, o padrão da pesquisa científica e do desenvolvimento tecnológico é combinar experimentos de laboratório com simulações em computador. Isso acelera e reduz custos na busca por novos medicamentos”, afirma.
De forma geral, a modelagem também permite a identificação de alvos moleculares específicos que podem estar alterados em doenças, com alta precisão. No caso do modelos desenvolvido com base no hormônio FSH, por exemplo, previu-se as mudanças elétricas causadas por ele com um erro máximo de cerca de 3% em comparação com os experimentos reais, demonstrando a acurácia da simulação.
Um exemplo já em uso apontado pela professora é o desenvolvimento de tecnologias nacionais para eletroquimioterapia, que combina campos elétricos com medicamentos no tratamento de alguns tipos de câncer. Além de poderem tornar o diagnóstico de infertilidade mais exato, as descobertas abrem caminhos para tratamentos personalizados baseados em necessidades específicas a partir dos “interruptores” elétricos identificados. “
No caso da reprodução, ainda não existem terapias baseadas nesses mecanismos iônicos — e justamente por isso nosso estudo é inovador: ele abre essa nova frente para melhorar a fertilidade masculina”, finaliza. O estudo contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação de Santa Catarina, a Fapesc, por meio do edital para laboratórios multiusuários.