Segundo debate institucional traz argumentações polarizadas sobre a Ebserh
A comunidade da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) reuniu-se, nesta segunda-feira, dia 10 de novembro, para debater a respeito da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). O segundo debate sobre a empresa foi promovido e voltado especialmente para a comunidade dos cursos do Centro de Ciências Biológicas (CCB), do Centro de Ciências da Saúde (CCS) e do Centro de Desportos (CDS).
O debate foi moderado pela vice-diretora do CCS, Isabela de Carlos Back Giuliano. Representando o Fórum Catarinense em Defesa do SUS e Contra a Privatização da Saúde, compuseram a mesa os debatedores Nelson Albuquerque de Souza e Silva, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Simone Hagemann; representando a Ebserh, Luiz Vicente Borsa Aquino, coordenador de Planejamento da Presidência da empresa, e Virmondes Rodrigues Júnior, ex-reitor da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Também esteve na mesa, representando o Hospital Universitário Polydoro Ernani de São Thiago (HU), o seu diretor-geral, Carlos Alberto Justo da Silva.
O início do debate foi marcado pela apresentação de dados históricos e informações atuais sobre o HU por parte da representante do Fórum, Simone Hagemann, e da vice-diretora do Hospital, Maria de Lourdes Rovaris.
Assim como no primeiro debate, realizado no dia 4, Hagemann apresentou o documento elaborado pelos membros da Comissão de Análise sobre a Ebserh, com um diagnóstico do HU e possíveis formas de solucionar problemas sem que haja a adesão à empresa. “A Ebserh não é a solução pro nosso HU. É uma empresa pública de direito privado. A contratação de pessoal é pela CLT; esse tipo de contratação é de alta rotatividade, precariza as relações de trabalho. A adesão não é obrigatória. Existem meios que possibilitam que a administração pública possa solucionar os problemas do HU”, salientou Hagemann. A representante do Fórum voltou a dizer que o Hospital não possui déficit financeiro e que, ao aderir à Ebserh, a Universidade passaria à empresa toda a execução do serviço de assistência, ensino e pesquisa. “É uma lógica mercadológica, em detrimento da formação crítica e de qualidade”, complementou.
Maria de Lourdes Rovaris trouxe dados sobre a gestão do Hospital e frisou que os problemas hoje vivenciados são históricos. “Houve dificuldades desde o projeto inicial do HU, demandando um esforço muito grande dos alunos e da administração ao longo desses 34 anos de fundação”, ressaltou a vice-diretora do HU. Rovaris argumentou que o número de leitos atuais – 317, sendo 214 ativos e 103 desativados – não corresponde ao que foi planejado para o Hospital em 1980. De acordo com a vice-diretora, ainda existem novos blocos planejados, com cerca de 130 leitos para serem acrescentados à capacidade instalada do HU. Dentre as demandas, a principal é a necessidade de contratação de profissionais, tanto da área da saúde como administrativa. Rovaris apontou que é preciso compensar exonerações, demissões, aposentadorias e óbitos de servidores, sem contar com as contratações para as novas alas. Segundo ela, são necessárias 1.050 contratações. Além disso, 120 servidores podem pedir a aposentadoria até 31 de dezembro deste ano. A questão financeira, explica a vice-diretora, tem sido controlada para cumprir com as obrigações do Hospital, mas com poucos recursos para investimentos. “Não podemos ter déficit. Temos sobrevivido com o nosso recurso de contratualização e com o REHUF (Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais). O Hospital tem como razão de existir a questão do ensino. Nossa capacidade instalada tem relação direta com a capacidade de poder ensinar. Nossa realidade, as dificuldades, sempre trazem reflexos no ensino”, argumentou Rovaris.
O segundo representante do Fórum Catarinense em Defesa do SUS e Contra a Privatização da Saúde a falar foi o professor emérito da UFRJ Nelson Albuquerque de Souza e Silva, que se concentrou na questão da autonomia universitária e na possível comercialização da saúde e da pesquisa com o advento da Ebserh. Silva ressaltou a necessidade de se analisar a natureza jurídica da Ebserh e o que isso pode significar para o futuro dos hospitais universitários. “Afeta os hospitais e as áreas de ensino e pesquisa, que são atividades-fins da universidade, as quais ela não deve terceirizar. Somos contra a criação de uma empresa de direito privado para reger os hospitais. A empresa pública de direito privado pressupõe comercialidade. Não se deve comercializar a saúde, que é um bem público, assim como a pesquisa. A Universidade é a única instituição que pode fazer pesquisa pelo interesse da população, e não pelo interesse da indústria”, apontou Silva. O debatedor também resgatou as políticas de governo desde os anos 1990, que trataram dos hospitais universitários e de saúde pública e voltou a frisar que é necessário que as universidades possam gerir seus hospitais. “A universidade não pode abdicar de sua autonomia, não pode ficar a mercê de políticas de governo contingenciais. Sobre a Ebserh, o governo deve voltar atrás e dar recursos para que as universidades se autogerenciem”, acrescentou.

Foto: Henrique Almeida/Agecom/DGC/UFSC
O ex-reitor da UFTM, Virmondes Rodrigues Júnior, apontou questões pertinentes à adesão do HU de sua universidade à Ebserh. Rodrigues ressaltou que concorda que a pesquisa seja isenta de financiamento privado e defendeu a autonomia universitária. Sobre a experiência à frente da UFTM quando da adesão à Ebserh, o ex-reitor disse que houve melhorias após o contrato com a empresa. “Nosso hospital não é muito diferente do hospital de vocês. Quando aderimos, havia vários leitos fechados e uma ala atendia pacientes privados. Trabalhamos para tornar esses leitos 100% SUS e hoje essa ala foi transformada em um centro para a saúde da mulher e maternidade pública que é referência na nossa região”, explicou Rodrigues.
O debatedor apontou que também existia resistência à Ebserh na UFTM, mas que esses receios não se concretizaram. “Está sendo um processo, não existe mágica dentro da universidade. Muitos dos receios que tivemos com a Ebserh também discutimos em audiências públicas. Muitas questões, como a subcontratação, a entrada de plano de saúde, salários abaixo do RJU, nada disso se concretizou. Muitas expectativas dramáticas até agora não se concretizaram. Se isso não aconteceu é porque a universidade não quer essas coisas, e a Ebserh não existe sem a universidade”, salientou. A UFTM assinou os primeiros contratos com a Ebserh em 2013. O ex-reitor informou que a adesão não passou pelo Conselho Universitário; no entanto, o contrato foi referendado pelo Conselho, que também autorizou que os funcionários contratados pela empresa pudessem participar da consulta pública para a escolha do próximo reitor. “Mais de 70% dos cargos da Ebserh no nosso hospital são de servidores técnicos e docentes da universidade, ou seja, a universidade mantém sua atuação dentro do hospital”, complementou. Rodrigues acrescentou, ainda, que o HU da UFTM tinha mais de 900 funcionários terceirizados, cujas demissões aconteceram com auxílio do Ministério Público do Trabalho.
O coordenador de Planejamento da Presidência da Ebserh, Luiz Vicente Borsa Aquino, defendeu a empresa com informações referentes aos atuais contratos. Aquino falou de sua experiência como gestor de um hospital universitário antes de trabalhar com a Ebserh e afirmou que o sucateamento dos HUs aconteceu por falta de investimento durante muitos anos. “A Ebserh veio para fazer a gestão dos hospitais de forma profissional. Quando ela foi lançada eu também tive uma série de dúvidas. Mas a proposta é atender 100% SUS. Vamos fechar 2014 com 11 mil profissionais e a previsão é que cheguem a 40 mil no ano que vem, todos contratados por meio de concurso público”, ressaltou Aquino. O coordenador apresentou as principais vantagens, que, segundo ele, a Ebserh pode oferecer. “A Ebserh luta pelo orçamento da saúde pública – essa é a diferença fundamental, o financiamento específico para os hospitais universitários. Além disso, podemos oferecer ferramentas de gestão que gerenciam também o aluno, em rede. A empresa oferece qualidade nas compras, com aquisições em lote, por meio de licitação nacional. Isso gera muita redução de preço dos equipamentos. Já são 27 dos 50 hospitais universitários federais que aderiram. Se o medo é privatizar, me citem um hospital desses 27 que atenda paciente com convênio”, argumentou.
Seguindo a metodologia estabelecida pelo CUn, após as apresentações e argumentações iniciais, foi disponibilizado tempo para que a plateia pudesse fazer perguntas e manifestar sua opinião. Pronunciaram-se estudantes, técnicos-administrativos em Educação e docentes, inclusive membros do Conselho Universitário (CUn).
O diretor-geral do HU, Carlos Alberto Justo da Silva, também se pronunciou ao final do debate. Ele salientou que o Ministério Público demanda do HU que demita, até 2015, todos os funcionários terceirizados, número que chega a 155 pessoas. “Esta não é uma decisão fácil – toda opção significa renunciar alguma coisa pra ter acesso a outras. Estamos em uma crise aguda, com mais de 100 leitos fechados, sem poder ampliar a residência médica. Não se trata de aderir a uma coisa por modismo. Todos queremos a mesma coisa: que os problemas sejam solucionados. Podemos discordar sobre como fazer; isso depende da vontade política de todos. Eu acho que a indignação faz parte do momento de angústia que estamos vivendo. Queremos uma resposta para o HU”, disse o diretor.
O terceiro debate acontece no Auditório do HU, na quinta-feira, dia 13, em dois horários: às 9h e às 14h. A consulta pública à comunidade universitária está prevista para abril de 2015. Confira, a seguir, o calendário de debates aprovados pelo CUn para os debates sobre a Ebserh.
Data | Debate | Local |
13/11 – 9h a 12h e 14h a 18h | 3º Debate: HU | Auditório do HU |
14/11 – 14h a 18h | 4º Debate: CED, CFH e CCE | Auditório do CCE |
17/11 – 19h a 22h | 5º Debate: CSE e CCJ | Auditório do CCJ |
18/11 – 14h a 18h | 6º Debate: CCA | Auditório do CCA (Itacorubi) |
25/11 – a partir das 19h | 7º Debate: Comunidade interna e externa, CTC, CFM (com transmissão via internet para os campi da UFSC) | Auditório Garapuvu (Centro de Cultura e Eventos) |
Documentos da comissão da Ebserh disponíveis para consulta
A comissão instituída pelo Conselho Universitário (CUn) para analisar as discussões sobre a Ebserh disponibilizou uma série de documentos sobre o tema. Atas das reuniões, relatórios, diagnósticos do HU, contratos, legislação, documentos do Ministério da Educação (MEC), do Tribunal de Contas da União (TCU), do Ministério Público Federal (MPF), além de outros textos, reunidos durante os mais de 12 meses de trabalho da comissão. O acesso aos documentos foi aberto a todos os interessados pelo link http://bit.ly/DocsEbserh.
Confira a cobertura do UFSC Cidade sobre o segundo debate:
Mayra Cajueiro Warren
Jornalista / Diretoria-Geral de Comunicação
imprensa.gr@contato.ufsc.br