Fazendo Gênero 10 desenvolve uma inovadora política de acessibilidade

23/09/2013 10:22

O Fazendo Gênero 10, um dos maiores eventos feministas existentes, desenvolveu uma inovadora política para garantir o acesso das pessoas com deficiência, não apenas como público mas também como produtoras de conhecimento. O Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (FG10) foi o primeiro grande evento científico do Brasil que, sem ter como foco o debate da deficiência, priorizou a eliminação de barreiras arquitetônicas, comunicacionais e atitudinais a fim de garantir a efetiva inclusão das pessoas com deficiência, não apenas como ouvintes mas também como protagonistas na produção de conhecimento feminista.

Com o tema “Desafios atuais dos feminismos” e cinco mil participantes envolvidos nos debates, o seminário que finalizou na sexta-feira, 20 de setembro, em Florianópolis, ofereceu uma programação de excelência, com intervenções de pesquisadores nacionais e estrangeiros, integrados em 115 simpósios temáticos, 28 mesas-redondas, 14 minicursos e oficinas e três conferências magistrais.

Promovido pelo Centro de Filosofia e Ciências Humanas, o Centro de Comunicação e Expressão e outros centros da UFSC, em parceria com o Centro de Ciências Humanas e da Educação da UDESC, o evento conta pela primeira vez com uma comissão de Acessibilidade que, além da oferecer aos participantes com deficiência condições mínimas de acessibilidade, pretende fortalecer uma opção teórico – política: garantir a inserção da deficiência como categoria de análise dos feminismos contemporâneos; ou também, incorporar a perspectiva dos estudos de deficiência nos estudos de gênero.

Uma das inovações desta edição do FG foi a elaboração de um Guia de Orientações Básicas sobre Gênero, Deficiência e Acessibilidade que, entre outros serviços, oferece dados concretos sobre as características de acessibilidade de cada prédio da UFSC, como quantidade de banheiros adaptados, vagas de estacionamento, rampas e elevadores para facilitar a locomoção. A elaboração da cartilha demandou um amplo e detalhado mapeamento das características arquitetônicas de todos es edifícios da UFSC, o que permitiu colocar em evidência os déficits que ainda existem para a garantir a circulação de todas as pessoas.

O Guia também inclui um capítulo com “boas práticas de acessibilidade”, destinadas a mudar as práticas cotidianas no âmbito universitário, altamente estruturado pela corponormatividade compulsória e pelo capacitismo. Uma das várias práticas recomendadas aos coordenadores das atividades e aos palestrantes – válidas para este e muitos outros eventos – é lembrar, antes de iniciar uma fala, de perguntar ao público se há alguma pessoa com deficiência na sala e quais os procedimentos que podem tornar o evento mais acessível.

As pessoas com deficiência auditiva que fazem leitura labial precisam, por exemplo, que os palestrantes evitem colocar o microfone na frente da boca. Entretanto, as pessoas com deficiência visual podem ter necessidade de que os coordenadores descrevam verbalmente as imagens dos slides e vídeos exibidos, e incluso a caracterização dos palestrantes. Outras boas práticas são usar sempre apresentações com letra grande e clara, e levar cópias impressas das apresentações para que pessoas surdas ou com deficiência intelectual possam acompanhar as ideias.

A comissão de Acessibilidade do FG10, integrada por Anahi Guedes de Mello, Denise Siqueira, Felipe Fernandes, Marcelo Spitzner, Melina Ayres, Ringo Bez de Jesus e Venicios Cassiano, conseguiu algo pouco frequente nos eventos acadêmicos: tradução em Braille e audiodescrição na mostra de fotografias que integra a programação do evento. Também, intérpretes da língua brasileira de sinais (Libras) para aqueles surdos que necessitam ter essa forma de comunicação e legenda em tempo real para as pessoas surdas que se comunicam através da fala.

No Hall de entrada do Centro de Cultura e Eventos da UFSC houve, durante toda a semana, uma Tenda da Acessibilidade para o atendimento do público do FG – especialmente das pessoas com deficiência – para dar sugestões, pedir auxílios, buscar informação ou simplesmente tirar dúvidas em relação à acessibilidade do evento como um todo. Na Tenda havia, também, exemplares da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que é o mais importante documento da legislação brasileira nessa área.

Além de resultar útil para que as pessoas com deficiência usufruam serviços e participem das atividades, a Guia é uma lição antidiscriminação. Ela explica que junto com as categorias de raça, classe ou geração deveria ser incluída também a categoria de deficiência como mais um marcador social da diferença. Nesse sentido, as mulheres com deficiência, por exemplo, enfrentam uma peculiar situação de vulnerabilidade e estão sujeitas a uma discriminação múltipla. “Garantir a acessibilidade às pessoas com deficiência é um desafio dos feminismos que, desde sua emergência como teorias contemporâneas, se mostram engajados com a luta pela justiça social e contra a exclusão de sujeitas e sujeitos por suas condições de vulnerabilidade”, diz Anahi, militante feminista e LGBT, surda e mestranda em Antropologia Social pela UFSC.

A concepção geral do evento que se realiza cada dois anos considera que, apesar dos avanços obtidos por meio das inúmeras lutas travadas pelas mulheres, muitos obstáculos persistem, alguns se reconfiguraram, outros emergiram, exigindo por isso mesmo o debate em torno dos “Desafios atuais dos feminismos”, os quais incluem, entre outros, a baixa participação das mulheres nas instâncias de poder político; as desigualdades de gênero no âmbito do trabalho e da distribuição de renda; as dificuldades enfrentadas no âmbito das lutas pelo direito ao aborto; as violências domésticas e institucionais de gênero; a grave situação das mulheres, principalmente de baixa renda, nos contextos pós-coloniais e transmodernos; as iniquidades em saúde; as contramarchas nas lutas pelos direitos LGBT e os efeitos de subordinação das interseções de gênero, classe, gerações, raça/etnia e deficiência.

Considerando que nas universidades brasileiras a trajetória das pessoas com deficiência esteve historicamente repleta de dificuldades por causa das barreiras arquitetônicas, comunicacionais, pedagógicas, etc. e considerando também que o princípio de acessibilidade tem no Brasil status constitucional, o propósito dessa inovadora política do FG10 foi mostrar que não há corpos inferiores, incompletos ou passíveis de reparação senão padrões hegemônicos funcionais que precisamos revisar e corrigir para combater o capaciticismo e a discriminação.

Serviço:

O quê: Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 – Desafios atuais dos Feminismos

Quando: de 16 a 20 de setembro

Onde: Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

Site: www.fazendogenero.ufsc.br/10

Facebook: www.facebook.com/FazendoGenero10

Fonte: CComunicação FG10

Fone: (48) 9111 6794 (Jimena)
Tags: Deficiência e AcessibilidadegêneroGuiaSeminário Internacional Fazendo Gênero 10UFSC