“Nosso problema com a Ponte Hercílio Luz”, por Salma Ferraz
Por Salma Ferraz /professora do Departamento de Língua e Literatura Vernáculas da UFSC
Nunca antes na estória desta Ilha se ouviu e viu tanto absurdo com dinheiro público: 180 milhões serão gastos para tornar novamente a ponte Hercílio Luz trafegável. Sem falar que uma montanha de dinheiro público já foi gasto para sua construção. O Projeto de dois engenheiros norte-americanos Robinson e Steinmann foi iniciado em 1922 e concluído em 1926. Para sua construção o então Governador Hercílio Luz fez um empréstimo que dava quase dois orçamentos anuais do estado de Santa Catarina. O pagamento do empréstimo junto aos bancos norte- americanos levou exatamente 50 anos para ser concluído. O valor final pago sobre é controverso, mas fala-se em 14 milhões 478 mil 107 contos e 479 réis. Cacau Menezes já chamou isto de “Indústria da Ponte”.
Temos uma relação mal resolvida com as pontes nesta Ilha. As Pontes aqui são Pontes para muito Ouro… Geralmente muita água e muito ouro passam debaixo destas pontes e o ouro não volta nunca mais…
Argumenta-se que a Ponte Hercílio Luz tem que ser recuperada porque é cartão postal da Ilha. Sim ela é linda, mas existem dezenas de praias exuberantes que se apresentam com cartão postal. Dizem que é símbolo da Ilha? Que tal elegermos a velha e centenária Figueira, que afinal está na IIha há mais tempo que Ponte, para símbolo da Ilha? Não sou agrônoma, mas creio que com uns 50 mil reais por ano daria para manter a velha Figueira em pé. Afinal Num pedacinho de terra/belezas sem par!/Ilha da moça faceira,da velha rendeira tradicional/Ilha da velha figueira, tantas coisas saem mais em conta do que a Ponte…
Sim, podem argumentar que a Ponte é Patrimônio Cultural de Santa Catarina. Mas o que justifica manter um Patrimônio Cultural ao preço camarada de 180 milhões de reais? Quantas casas populares poderiam ser construídas com este dinheiro? Quantas cestas básicas poderiam ser distribuídas entre a população carente? Quantas escolas básicas com computadores poderiam ser instaladas nos morros? Quantas barreiras de proteção nas encostas dos morros poderiam ser levantadas evitando desabamentos e catástrofes? Quantos postos de saúde poderiam ser implantados aqui. Que tal utilizarmos parte deste dinheiro para a implantação de um Instituto de ponta sobre tragédias climáticas em Santa Catarina com instrumentos de última geração? Isto para prevenir tantas tragédias ocorridas por aqui. Outra parte poderia ser usada para comprar medicamentos e vacinas para pessoas carentes. Ou ainda investir na desfavelização dos morros. Gastar 180 milhões num monumento que pode desabar a qualquer momento…
Patrimônio Cultural para mim é o povo com a barriga cheia e o cérebro ocupado com coisas acima de Rebolation e mulheres frutas.
Proponho um plebiscito entre o povo Ilhéu, explicando o que poderiam comprar com 180 milhões, para tornar mais inteligível o valor de tantos zeros. O plebiscito poderia se chamar Salve a Ponte ou Salve o Mané. Lanço aqui a campanha!
O povo deve ser esclarecido que este dinheiro vai sair dos cofres do Estado e da Prefeitura. Busca-se parcerias, mas precisamos de parceria para tantas outras coisas mais racionais e urgentes.
Quem nos garante que este dinheiro vai resolver o problema da estrutura da ponte, uma vez que suas duas irmãs norte-americanas já estão devidamente enterradas: a Silver Bridge desmoronou em 1967 e matou 46 pessoas. A outra St. Marys foi demolida em 1971, para evitar que caísse. Porque só nós não somos práticos e pragmáticos e insistimos numa sandice destas?
A Ponte foi tombada como Patrimônio Histórico pelo Município pelo Decreto 637/92. Em 1997 pelo Estado pelo Decreto 1830, pela União através da Portaria n. 75 de Maio de 1997. Se o problema é jurídico – a questão de manter um patrimônio cultural- há de se achar uma saída legal: a lei ter que estar a serviço do ser humano e não o ser humano a serviço dela.
Maior Patrimônio Cultural desta Ilha, além das praias e a Velha Figueira é o povo desta Ilha, o ilhéu, nosso querido manézinho, este sim precisa ser preservado e para isto é preciso saúde, educação e moradia!
Salve o Mané, não salve a Ponte!
Por Salma Ferraz /professora da UFSC
NUTEL
Núcleo de Estudos de Teologia e Literatura
ALALITE
Associação Latino Americana de Teologia e Literatura.
UFSC