UFSC é co-autora de projeto de Centro Cultural Indígena na baía sul em Florianópolis

16/05/2024 18:20

Terminal de ônibus nunca ativado na baía sul é utilizado por indígenas. Foto: Arquiteturas del Sul/Divulgação

O Laboratório de Projetos do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) vai entregar, nos próximos dias, o resultado de um trabalho que uniu o conhecimento acadêmico às necessidades e ao conhecimento dos povos indígenas: o estudo preliminar para a construção do Centro Cultural Indígena junto ao terminal do Saco dos Limões, em Florianópolis. O projeto terá sua última etapa nesta sexta-feira, 17 de maio, em reunião programada para as 16h na Justiça Federal.

O estudo foi mediado por uma decisão judicial a partir de uma ação do Ministério Público de Santa Catarina e envolveu a UFSC pelos trabalhos que já eram realizados pela instituição junto às comunidades indígenas. Segundo o professor Ricardo Socas Wiese, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo, o projeto foi desenvolvido em parceria com a Prefeitura de Florianópolis, com participação dos grupos interessados, tais como a comunidade indígena e representantes comunitários do bairro Saco dos Limões.

O histórico para a elaboração do Centro Cultural, que popularmente é chamado de “casa de passagem”, é extenso e envolve uma série de conflitos judiciais. Mas em outubro de 2023 houve uma determinação para que o município encontrasse uma solução para receber indígenas dos povos Kaingang, Xokleng e Guarani, da região Sul do país, que passam pela Capital em busca de melhores condições de vida.

O professor explica que essa passagem tem vínculos culturais, já que famílias se movem para a comercialização dos artesanatos, traço importante da cultura e da atividade econômica dos povos indígenas. Essas relações com o artesanato também contam a história das comunidades, bem como a forma como os ensinamentos são transmitidos às crianças. Ele lembra que, sem a garantia de uma hospedagem segura, famílias inteiras ficavam expostas em acampamentos em áreas urbanas, reféns da insegurança, preconceito e violência.

Atuação da UFSC começou em 2021

A UFSC atua nesta frente desde 2021. Em 2023, junto dos professores Fernanda Machado-Dill, da Universidade Federal da Fronteira do Sul (UFFS), e Fábio Ferreira-Lins Mosaner, da Universidade Federal do Pernambuco (UFPE), Wiese publicou o artigo Casa de Passagem Indígena em Florianópolis: projeto participativo e ações do Estado. No texto, os pesquisadores apresentam algumas das bases que originam o projeto, com enfoque nas estratégias projetuais e nas alterações da proposta diante das ações do Estado e participação da comunidade indígena.

A importância da presença indígena na cidade, a luta constante dos povos originários por espaços físicos e simbólicos na sociedade e o papel social de arquitetos e urbanistas diante destes desafios são alguns dos temas abordados em um estudo que teve uma elaboração coletiva de diretrizes e proposta arquitetônica.

Além da universidade e da Prefeitura de Florianópolis, fazem parte do processo representantes do Ministério Público, da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), da comunidade do Saco dos Limões e lideranças indígenas.

De ocupação a Centro Cultural

O projeto toma como área o Terminal do Saco dos Limões (TISAC), edificação que não chegou a ser utilizada pelo Sistema Integrado de Mobilidade, inaugurado em 2003, e permaneceu sem uso desde a sua construção. A localização é considerada adequada pela proximidade com o centro e com o acesso às praias, ponto de interesse dos indígenas para a comercialização dos artesanatos. Os indígenas já vinham utilizando o espaço nos últimos anos, mas sempre sob tensão e conflitos com o poder público.

Historicamente, a UFSC já realizava projetos de extensão com a comunidade que permanecia no terminal. As atividades proporcionaram aos acadêmicos a interação com os povos indígenas, em um processo de projeto participativo, e de conhecerem as condições de permanência destas famílias na cidade.

“O envolvimento com demandas reais da comunidade, somado às questões étnico culturais dos povos originários envolvidas na casa de passagem e às disputas políticas que definem o contexto trouxeram grandes desafios ao processo de projeto, mas também contribuíram para enriquecer o processo de aprendizagem dos estudantes”, assinalam os professores em um outro artigo, de março de 2024.

Foi essa expertise que fez com que a Justiça enxergasse a Universidade como a parceira ideal da Prefeitura de Florianópolis para executar aquilo que já era uma determinação: oficializar o TISAC como o local onde os indígenas teriam habitação adequada e o direito de se organizarem como comunidade.

“Desenvolvemos um projeto para contemplar a diversidade dos povos, em um processo participativo. Ele conta com os alojamentos, mas também prevê a cozinha e os espaços de integração, diversificado e rico”, explica o professor. Uma horta urbana também foi pensada para unir a comunidade indígena à comunidade local. “O objetivo é que seja um espaço de valorização da cultura indígena, também de turismo, que as pessoas possam visitar e conhecer”.

A UFSC irá entregar ao poder público o projeto preliminar, executado em parceria com a prefeitura, que tem como resultado gráficos, plantas e imagens 3D. Após a homologação, quem irá executar as demais etapas é a prefeitura. Segundo o professor, o saldo do trabalho é positivo, já que, durante as reuniões de trabalho, foi possível consolidar versões do projeto adequadas a todas as partes envolvidas.

Amanda Miranda | amanda.souza.miranda@ufsc.br
Agecom | UFSC

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