Dissertação defendida na UFSC é premiada pela Agência da ONU para Refugiados

23/10/2017 11:15

Da esquerda para a direita: María Eugenia Dominguez, Vítor Lopes Andrade, Letícia Cesarino, Karine de Souza Silva, Gláucia de Oliveira Assis (por vídeoconferência) e Carmen Silvia Rial. Foto: Arquivo pessoal

Em março deste ano Vítor Lopes Andrade defendeu, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a dissertação ‘Imigração e Sexualidade: solicitantes de refúgio, refugiados e refugiadas por motivos de orientação sexual na cidade de São Paulo’, obtendo o título de mestre em Antropologia Social (PPGAS). O ineditismo do tema fez com que o trabalho fosse premiado, seis meses depois, pela Agência da ONU para Refugiados (UNHCR/ACNUR) no III Concurso Nacional de Teses de Doutorado e Dissertações de Mestrado da Cátedra Sérgio Vieira de Mello.

O prêmio é importante no Brasil por tratar do debate em torno da área de refúgio, migração internacional e direitos humanos. Para Vítor, o tema é relevante porque faz uma conexão entre imigração, refúgio e sexualidade. “Existem muitas pesquisas feitas no Brasil sobre imigração e refúgio, entretanto, normalmente não há um enfoque conjunto. Por isso, é um tema de relevância acadêmica, pois foi o primeiro trabalho de pós-graduação defendido no Brasil sobre o refúgio por motivos de orientação sexual”, relata ele.

Além da importância acadêmica, a dissertação remete a um alerta social que demanda atenção. Segundo o pesquisador, faltam ações específicas e políticas públicas para esse público-alvo. “Há o desconhecimento acerca dessas pessoas por parte das instituições que trabalham com refúgio e das organizações LGBT. Essas duas áreas, do dia-a-dia, não trabalham conjuntamente: para as ONGs LGBT de São Paulo, todos/as os LGBT são brasileiros/as, e para as organizações que trabalham com refúgio, todos/as os/as refugiados/as são heterossexuais”, afirma Vítor.

A premiação pode ser uma forma de dar mais visibilidade ao tema, justamente no ano em que a Lei de Migração foi aprovada no Brasil. A legislação, que substitui o Estatuto do Estrangeiro de 1980, prevê princípios e garantias como a acolhida humanitária (inciso VI) e a promoção e difusão de direitos, liberdades, garantias e obrigações do migrante (inciso XII). Ou seja, a nova política migratória tem como foco os direitos humanos, o repúdio à discriminação e o acesso e tratamento igualitários.

“A minha esperança é, realmente, que a premiação sirva para dar visibilidade a essa temática e, assim, fazer com que as pessoas que trabalham com refúgio, seja na área governamental ou da sociedade civil, atentem-se a essa realidade e comecem a pensar nesse público”, menciona Andrade.

De acordo com dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em 2016 houve um aumento de 12% no número de refugiados reconhecidos no Brasil. Até o final de 2016, o país reconheceu um total de 9.552. Os países com maior número de refugiados reconhecidos no Brasil em 2016 foram Síria (326), República Democrática do Congo (189), Paquistão (98), Palestina (57) e Angola (26).

Segundo Vítor existem muitas pessoas que precisam fugir de seus países de origem pelo fato de que seus desejos afetivos e/ou sexuais não correspondem à norma heterossexual. “A nossa principal contribuição com essa pesquisa é dar visibilidade ao assunto. As relações sexuais consentidas entre adultos do mesmo sexo ainda são punidas não só socialmente, mas legalmente (pena de morte, prisão perpétua etc) em mais de 70 países ao redor do mundo. Uma parcela muito pequena desses/as sujeitos/as vem para o Brasil. Nosso país, apesar de todos os problemas, mostra-se como uma realidade muito mais favorável a essas pessoas. Entretanto, por medo de continuarem a ser perseguidos/as, muitos continuam escondendo suas sexualidades não-heterossexuais. Para que haja uma mudança significativa nas vidas dessas pessoas, para que elas se sintam seguras para expressar suas orientações sexuais da maneira que desejarem, é preciso um esforço conjunto entre governo, sociedade civil, ACNUR e a academia”, finaliza ele.

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A dissertação de Vítor Lopes Andrade foi orientada pela professora titular do Departamento de Antropologia da UFSC, Carmen Silvia Rial. Em 2016 ele publicou o artigo ‘Desafios no atendimento, acolhida e integração local de imigrantes e refugiados/as LGBTI’ em que analisa a situação atual e propõe ações que poderiam ser feitas a curto e longo prazo.

A dissertação de Vítor estará disponível até o final deste mês no site da UNHCR/ACNUR.

Conheça mais sobre a UNHCR/ACNUR e Lei de Migração.

Nicole Trevisol/Jornalista da Agecom/UFSC

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