Aluno da UFSC com doença degenerativa defende tese sobre uso de física nuclear para descrição de estrelas

23/08/2022 10:08

A tarde do último dia 17 de julho foi especial para Kauan Dalfovo Marquez, estudante do Programa de Pós-Graduação em Física (PPGFSC) na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A data marcou o dia da defesa de sua tese de doutorado, com um trabalho que investigou o uso da física nuclear para descrição de estrelas de nêutrons – objetos astronômicos super densos que surgem com a “morte” de algumas estrelas.

Atualmente com 27 anos, Kauan recorda do interesse desde a infância pelas disciplinas de ciência, em especial pela Física. O recém-doutor tem uma doença neurodegenerativa chamada atrofia muscular espinhal (AME tipo 2) e, devido à condição, precisava passar longos períodos afastado da sala de aula e estudar em casa por meio dos materiais e atividades enviados pelos professores. “Nesse período, passei a me interessar muito por Matemática. Então, quando houve a possibilidade de cursar Física na cidade em que eu morava, decidi que assim seria”, afirma.

Natural de Rio de Sul, no Alto Vale do Itajaí, o estudante cursou licenciatura em Física pelo Instituto Federal Catarinense (IFC) em um campus no município. A trajetória na UFSC começou em 2016, quando ingressou no mestrado. Somando o tempo de doutorado, foram seis anos na instituição onde hoje é bolsista de pós-doc e membro do grupo de pesquisa em Física Hadrônica nas Matérias Nuclear e Estelar, que desenvolve pesquisas com aplicações na descrição de remanescentes estelares.

A vida acadêmica

A AME tipo 2 é uma condição bastante severa, que causa a morte gradual dos neurônios motores, responsáveis por levar os comandos de movimentos do cérebro para os músculos. “Me faz ser praticamente tetraplégico hoje”, explica Kauan. Ainda assim, o estudante afirma que a deficiência não afetou diretamente a vida acadêmica. “Claro que eu preciso de adaptações para que eu possa acompanhar as atividades, mas são só maneiras diferentes de fazer as mesmas coisas (por exemplo, poder realizar as provas no computador). Para isso, eu sempre tive bastante apoio dos professores que encontrei, bastava uma conversa”, recorda.

O pesquisador reconhece, no entanto, que existem outros desafios. Por conta das limitações físicas, ele explica que tem menos horas úteis num dia e seu organismo é mais vulnerável a doenças pulmonares, algo que ocasionalmente o fazia perder uma aula. Ressalta ainda que a falta de transporte e de acessibilidade adequada também se mantém como um grande obstáculo. Para enfrentá-los, Kauan destaca o apoio da família: “Embora eu sempre tenha sido tratado com boa vontade por todos na Universidade, que sempre prestaram todo apoio possível, tenho consciência de que não seria possível desenvolver minhas atividades se não fosse o envolvimento direito da minha família, principalmente minha mãe. Isso é um privilégio, eu sei”, avalia.

“Viver como alguém que tem necessidades especiais ‘treina’ a pessoa a fazer as adaptações necessárias para a própria vida, e grande parte das dificuldades pode ser resolvida tendo abertura para o diálogo com a universidade. Eu sou otimista, sei que não é fácil (e que não precisava ser tão difícil), mas percebo que ao menos esses assuntos são cada vez mais discutidos e isso é bom”, pondera.

Em seu período na UFSC, o pesquisador publicou sete artigos e já possui mais um em fase de revisão. Fez estágio na Universidade de Coimbra, em Portugal, e ajudou na revisão do livro de Física Nuclear e de Partículas da sua orientadora, a professora Débora Peres Menezes, presidente da Sociedade Brasileira de Física (SBF).
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