Marcha de mulheres pede casa-abrigo para vítimas da violência
Um cortejo silencioso de 60 mulheres, homens e tocadores de bumbo empunhando 12 andores com 5.760 balões vai atravessar Florianópolis nesta sexta-feira, dia 17 de agosto, para fazer com que o número de mulheres agredidas e mortas no Brasil deixe de ser apenas uma cifra despercebida. A quantidade de balões representa o número de mulheres agredidas por dia no Brasil, entre as quais 12 são mortas. Com início às 17h, saindo de pontos distintos da rua Conselheiro Mafra, a marcha seguirá até o pátio do Museu Cruz e Sousa, em protesto contra a morte de 57 mulheres mortas em Santa Catarina desde janeiro de 2011, quando o “Projeto 5760” realizou sua segunda manifestação. Organizado por um grupo de alunas do Curso de Artes Cênicas da UFSC e do Centro de Artes da Udesc, com apoio da Secretaria de Cultura da UFSC, do Governo do Estado, Prefeitura, o ato artístico-político marca o aniversário de seis anos de implantação da Lei Maria da Penha.
As mulheres caminhando em silêncio solidário, sob o toque surdo e triste de tambores da Bateria Africatarina querem compartilhar a dor e o sofrimento de todas as 43.486 que foram mortas ao longo dos últimos 10 anos, principalmente vítimas da violência doméstica. “O silêncio é um gesto de indignação contra a indiferença geral da sociedade”, afirma Ilze Korting, idealizadora e coordenadora da ideia. O projeto começou seu trabalho com o “Grupo de pesquisa em performance, Artes Cênicas e Tecnologia do Curso de Sociologia da UFSC, sob a orientação do professor Rodrigo Garcez, e se tornou um movimento de cidadania, cujo maior objetivo é conquistar a construção de uma Casa Abrigo em Florianópolis, para mulheres que sofrem violência doméstica, e ampliação do número de instituições em Santa Catarina. Hoje as mulheres totalizam somente quatro casas em todo o Estado. “Sabemos que só um abrigo pode salvaguardar a integridade física, psicológica e moral da mulher ameaçada de morte”.
Mas embora a própria OMS considere a violência contra a mulher prioridade de suas ações em saúde pública em todo o Mundo, muito se fala e pouco se faz para protegê-la, na avaliação de Ilze. Aluna do curso de Artes Cênicas da UFSC, Ilze encontrou na arte e na expressão corporal uma forma criativa de enfatizar os números vergonhosos da violência contra a mulher no Brasil. Na esteira dessa missão, o projeto segue um rol de objetivos: gerar debates e mobilizações; sensibilizar a sociedade; levar informação e cobrar melhores estruturas para acolher a mulher vitimada; divulgar telefones úteis e sites específicos de apoio a mulheres em situação de violência; cobrar com urgência a montagem da casa abrigo para a mulher em risco; levantar questões culturais que fomentam e estimulam a violência contra a mulher.
“Precisamos de gente que acompanhe o cortejo. Precisamos de gente para fazer parte da equipe que irá montar os andores e encher os balões. Precisamos de gente para distribuir flyers. Precisamos de gente que adote um balão. Precisamos de gente que não seja indiferente”, diz o material de divulgação do projeto.
Há uma semana, em horários e locais de grande circulação, o grupo está distribuindo folhetos e cartazes que são um convite para a performance e para a exposição de fotos “Projeto 5.760, a violência está no ar”, que ocorrerá em local ainda não divulgado. Durante cinco dias, a exposição reunirá fotos ampliadas das performances anteriores e todo o material artístico usado na manifestação, incluindo 12 bonecas de pano, os andores com os balões estourados, o sino com a tabuleta e o painel escrito pelo público. Alunos da Udesc e da UFSC farão cinco performances, uma por noite.
Os números da dor
A cada quinze segundos uma mulher sofre algum tipo de agressão no Brasil. Das 5760 mulheres agredidas diariamente, 3.600 sofrem agressão física e 12, em média, morrem diariamente. Entre 1997 e 2007, 41.532 mulheres foram assassinadas. Mesmo com as conquistas jurídicas introduzidas pela Lei Maria da Penha, as estatísticas mostram um aumento em mais de 217% da violência contra a mulher desde a sua implantação.
“Falta ainda muito para avançarmos em políticas públicas para minimizar o sofrimento das vítimas e para mudar os valores da nossa cultura, que ainda vê e trata a mulher como ser inferior, propriedade do homem, passível de punição e da própria morte”, analisa a militante. Infelizmente, acredita, ainda predomina a cultura da indiferença e da impunidade.
A performance
Trajando camisetas brancas com fotos das manifestações anteriores do projeto 5760, o cortejo é preparado com muitos meses de antecedência no hall do Centro de Comunicação e Expressão da UFSC. Atuam na encenação 24 mulheres sustentando os andores, 12 homens carregando bonecas, 12 tocadores de bumbo e pelo menos 20 pessoas na produção da performance e na distribuição de folhetos informativos sobre a violência. Os tocadores de bumbos dão o ritmo à marcha e compõem o único som do cortejo.
A marcha passará inicialmente pela área central da cidade, onde as mulheres interceptam 12 homens imóveis, vestidos com ternos pretos, luvas brancas, usando na face máscaras neutras e abraçados a bonecas de pano. Espalhados ao longo da Felipe Schimidt, seguirão uma dupla de mulheres, um por vez, arrastando a boneca de pano no chão pelo braço. Chegando ao pátio do Museu Cruz e Souza, as mulheres colocarão os andores ao chão e vão retirar das mãos dos homens as bonecas para acomodá-las lado a lado na escadaria do museu.
O ponto alto da performance será a leitura, ao final, do primeiro nome, a idade, a cidade, data e as circunstâncias da morte de todas as mulheres assassinadas em Santa Catarina entre 2011 e 2012. Para cada nome lido um balão será retirado de um andor. Ao término da leitura, os manifestantes pedirão um minuto de silêncio pelas vítimas. A seguir, os tambores tocarão o Hino Nacional e os balões alusivos às mulheres agredidas serão soltos um a um. Na entrada do museu, haverá um painel para que as pessoas possam deixar uma mensagem e ao seu lado um sino com uma placa com a seguinte inscrição: “Se conheces uma mulher vítima de violência toque o sino.”
Serviço:
O que: Performance 5760 “A dor está no Ar”
Quando: 17 agosto de 2012 / Inicio às 17h, saindo de pontos distintos da área central da cidade
Local: centro de Florianópolis até o Pátio do Museu Cruz e Souza
Tempo provável da performance: 60 a 90 minutos.
Mais informações: www.projeto5760.blogspot.com.br / ilzekorting@gmail.com
Raquel Wandelli / Jornalista da UFSC na SeCult
raquelwandelli@yahoo.com.br / (48) 3721-9459 / (48) 9911-0524