Revisão de 181 artigos científicos revela situação alarmante da poluição por plásticos no oceano
Uma revisão de 181 artigos científicos que abordaram a poluição na costa Sul-Americana do Oceano Atlântico revelou a distribuição, as características e os impactos dos detritos plásticos no mar, além de examinar as políticas e iniciativas legais para combater essa ameaça ambiental. O trabalho, realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), concluiu que o nível de poluição na região é equivalente ao dos oceanos mais poluídos do mundo.
O estudo A review of plastic debris in the South American Atlantic Ocean coast – Distribution, characteristics, policies and legal aspects foi publicado na revista Science of the Total Environment em maio deste ano por integrantes do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Ambiental (PPGEA/UFSC) e do Laboratório de Pesquisas em Resíduos Sólidos (LARESO/UFSC). De acordo com o primeiro autor do artigo, o mestrando Igor Marcon Belli – orientado por Armando Borges de Castilhos Junior e coorientado por Davide Franco, ambos professores do PPGEA –, a pesquisa é a primeira análise regional que avalia tanto macro quanto microplásticos em águas costeiras, sedimentos e fauna marinha, apontando as áreas mais afetadas e as características desses materiais. O estudo também identificou as legislações e iniciativas não governamentais para combater a poluição por plástico na região.
“As principais organizações internacionais sobre o meio ambiente afirmam que a presença de materiais plásticos nos mares e oceanos já se estabeleceu como uma questão ambiental crítica. Macroplásticos, que incluem itens do dia a dia como sacolas, garrafas, canudos e outros recipientes descartáveis, frequentemente acabam em ambientes marinhos devido à gestão inadequada em zonas urbanas ou como resultado de atividades no mar. Com o tempo, esses materiais podem se fragmentar em partículas menores conhecidas como microplásticos, representando um desafio crescente para a saúde dos ecossistemas marinhos”, afirma Belli.
O estudo mostrou que o impacto dos plásticos na fauna marinha é significativo. Em um período de apenas 7 anos – de 2010 a 2017 – houve um aumento em 10 vezes na ingestão desses detritos por tartarugas, peixes, aves e mamíferos marinhos. O material se acumula no sistema digestivo, levando à fome e à desidratação. Os macroplásticos também podem causar asfixia e limitação de movimentos, quando se emaranham aos corpos desses animais – situações que sempre geram muito sofrimento.
Dentre as tartarugas examinadas, o estudo revelou que a tartaruga verde (Chelonia mydas), que está ameaçada de extinção, apresentou uma taxa altíssima de ingestão de detritos plásticos: entre os indivíduos da espécie encontrados na costa brasileira, 93% ingeriram detritos plásticos. Entre os itens mais frequentemente ingeridos estão as sacolas plásticas, que podem ser confundidas com comida.
“É importante enfatizar que a área em questão está excluída do Programa Marítimo Regional da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Este programa é dedicado à preservação dos ecossistemas marinhos e costeiros globais. Além disso, os países da região reciclam apenas uma pequena fração dos resíduos plásticos que produzem”, explicou Belli.
O estudo identificou que, em média, os plásticos representam 70% dos resíduos coletados nas praias. A quantidade desses materiais tende a ser maior em praias de fácil acesso e aumenta com a proximidade de áreas urbanas. “Atividades de lazer podem ser responsáveis por cerca de 63,6% dos plásticos presentes, enquanto a pesca contribui com 34%. Portanto, combinar o gerenciamento de resíduos, a educação ambiental e a melhoria das infraestruturas nas praias pode reduzir a poluição por plásticos.”
Os plásticos mal gerenciados das cidades e a descarga de esgoto doméstico nos mares foram apontados como as principais fontes de poluição. A área mais preocupante é o estuário de Bahía Blanca, na Argentina. No Brasil, a Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, e a Baía de Todos os Santos, na Bahia, foram os locais que apresentaram as maiores concentrações de microplásticos.
Nas áreas examinadas, as microfibras azuis se destacaram como a morfologia mais frequentes, enquanto o polietileno e polipropileno foram os polímeros mais abundantes. Segundo Belli, os microplásticos se apresentam em uma diversidade de formas: pequenas esferas conhecidas como “pellets”, fragmentos rígidos e irregulares, ou fibras. “As microfibras encontradas no mar são uma consequência da lavagem frequente de roupas. Embora as estações de tratamento de esgoto consigam reter a maior parte dos microplásticos, uma quantidade considerável ainda é lançada por meio de efluentes no ambiente aquático. O desgaste do material de pesca também contribui para essa poluição, à medida que as fibras plásticas se fragmentam e se espalham.”
O polietileno e polipropileno são geralmente utilizados na fabricações dos plásticos descartáveis. “O polietileno está presente em sacolas, embalagens de alimentos, frascos de shampoo, caixas de leite, etc. O polipropileno é comum em embalagens de salgadinhos, potes de sorvete, tampas de garrafas, etc.”
Quanto ao desenvolvimento de pesquisas científicas sobre o tema, o Brasil foi identificado como o líder em estudos na região. No entanto, fica atrás da Argentina e Uruguai nas políticas públicas para reduzir plásticos nos oceanos. “Mesmo com o Plano Nacional de Combate ao Lixo no Mar, o Brasil ainda precisa de regulamentações concretas que abordem os microplásticos e a redução do uso de plásticos descartáveis, que são os mais comuns nos ambientes marinhos. É essencial também iniciar a aplicação da responsabilidade compartilhada pelos produtores de materiais plásticos. Assim, existe a necessidade imediata de uma legislação brasileira para esse problema, inspirada em sucessos internacionais”, explicou Belli.
O artigo está disponível na íntegra aqui.