UFSC participa de processo de indicação geográfica para alho roxo do Planalto Catarinense

12/04/2024 10:40

Registro de IG reconhece  qualidade e singularidade do alho catarinense. Foto: Divulgação/Epagri

O alho roxo do Planalto Catarinense está perto de obter o registro de Indicação Geográfica (IG), conferido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) a produtos ou serviços que são característicos do seu local de origem, com reputação e identidade próprias quando comparados aos seus similares disponíveis no mercado. A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) é uma das instituições participantes desse processo que representa mais do que uma mera certificação; é o reconhecimento da qualidade e singularidade desse alimento que tem suas raízes na região conhecida como “berço nacional da cultura do alho”.

A proposta é conquistar esse selo na modalidade de Denominação de Origem (DO), que é concedida quando as características do produto têm influência essencial ou exclusiva da região em que ele foi produzido, tanto por fatores naturais quanto humanos. A cor púrpura da película de proteção dos bulbilhos, o tamanho dos bulbos, os aromas e os componentes bioquímicos estão entre as distintas qualidades do alho catarinense – também denominado alho roxo nobre, devido à alta qualidade – para a requisição de uma IG. Atualmente, a sua área de produção abrange os municípios de Curitibanos, Brunópolis, Frei Rogério, Fraiburgo, Monte Carlo, Caçador e Lebon Régis. “Ele não é só produzido em Santa Catarina, mas também no Rio Grande do Sul, no Paraná e nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, mas o Planalto Catarinense é o berço”, afirma o professor Leocir Welter, do Departamento de Ciências Naturais e Sociais (CNS), do Campus de Curitibanos.

Segundo a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural do Estado (Epagri), a produção de alhos nobres em Santa Catarina começou no final da década de 1970, com o pioneirismo de Takashi Chonan. Até hoje, a variedade denominada “Chonan” é utilizada e mantida pelos produtores locais. O alho roxo candidato à indicação geográfica foi definido por sete cultivares deste grupo, denominados Chonan, Ito, Quiteria, Caçador, Contestado, Jonas e Ito HF. “Esse alho produzido no Planalto – que tem menos dentes e um bulbilho de cor vermelho ou roxa, por isso o nome – passou a ter uma importância muito grande para a região, especialmente entre as décadas de 1970 e 1990. Depois, com a entrada de alho chinês, ele começou a ter dificuldade de competitividade. Além disso, houve também uma migração desse produto (que, no início, era produzido exclusivamente aqui) para outras regiões”, conta Leocir.

Produção de alhos nobres em Santa Catarina começou no fim da década de 1970, com o pioneirismo de Takashi Chonan. Foto: Divulgação/Epagri

O professor Cristian Soldi, também do Campus de Curitibanos, explica que o registro de IG é dividido em duas modalidades: Indicação de Procedência (IP) e Denominação de Origem (DO). A IP está ligada ao nome geográfico de país, cidade, região ou localidade de seu território, que se tenha tornado conhecido como centro de extração, produção ou fabricação de determinado produto ou de prestação de determinado serviço. Já a DO é o nome da região que designa produto ou serviço cujas qualidades ou características se devem exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluídos fatores naturais e humanos. “No caso da Denominação de Origem, o produto ou serviço é oferecido de forma cultural, mas também se distingue de outros produtos semelhantes pelas condições climáticas da região. Então, está relacionado às condições de território, de solo, clima e do próprio fator humano”, explica Cristian.

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Para o docente, a obtenção do selo soma valor ao produto, por certificar que existe um certo regramento para determinada produção. “Isso traz garantias ao consumidor, que vai ter certeza de que o produto é daquela região e apresenta a qualidade esperada, e também ao produtor, que poderá se reunir a outros produtores interessados e, de certa forma, ampliar o mercado da mercadoria”, avalia Cristian. “Vai ser mais difícil alguém produzir o alho, por exemplo, no Paraná e dizer que é um alho roxo do Planalto Catarinense, pois tem essa questão da identidade, a certificação de que o produto é daqui”, salienta. O professor Leocir Welter complementa: “Criar uma indicação geográfica abre todo um novo cenário, uma valorização do produto, um reconhecimento da qualidade. Isso permite padronizar a produção e agregar valor ao alho produzido, viabilizando a atividade aqui na região”.

As condições climáticas de solo, altitude, radiação solar, isso tudo influencia no metabolismo das plantas. Assim, o alho produzido em diferentes regiões provavelmente terá também distintas qualidades. Leocir ressalta que a condição climática é um desafio para a produção do alho roxo. Enquanto há um lado ideal, com a condição de frio, de inverno, existe também a questão de muitas variações de temperatura, de precipitação, que acabam por dificultar o cultivo. Por isso, a produção em Santa Catarina – na região Sul, de uma forma geral – é menor quando comparada aos números de Sudeste e Centro-Oeste.

Cor da película, tamanho dos bulbos, aromas e  componentes bioquímicos distinguem o alho da região. Foto: Divulgação/Epagri

Por outro lado, é justamente o fator clima, responsável por gerar um alho com qualidade específica, que possibilita a oportunidade de criar uma Indicação Geográfica para produto proveniente da região. “A amplitude térmica, com dias mais quentes e noites mais frias, contribui para a qualidade do alho, até por uma questão aromática, de composição química. É uma composição química mais rica, que apresenta propriedades que são benéficas à saúde. Há também estudos que mostram que, em regiões de maior altitude, tem uma radiação ultravioleta maior. Esse conjunto de características, diante de um clima desafiador, acaba desafiando a planta para produzir. E essa planta acaba alterando um pouco o mecanismo, se defendendo dessas adversidades, fazendo com que gere um alho com uma qualidade superior, uma qualidade diferenciada nesse sentido”, descreve o professor Leocir.

Processo para obtenção de IG

O processo para obtenção da Indicação Geográfica teve início em 2021. É um esforço de um grupo de produtores, lideranças e instituições locais, preocupadas em preservar a origem das variedades roxas do Planalto Catarinense e proteger os produtores locais da concorrência de outras regiões. O acordo de cooperação técnica entre as entidades prevê: a descrição do processo de extração ou produção do produto; a descrição das qualidades ou características, para comprovação da influência do meio geográfico; a fundamentação acerca da delimitação da área geográfica apresentada, de acordo com a espécie da IG requerida; e a participação em atividades sobre o tema, como seminários, reuniões, workshops, entre outras.

A UFSC trabalhou nos estudos voltados à caracterização da genética do alho roxo, como também na análise de sua composição química e bioquímica. Além da Universidade, a frente envolvida neste processo conta com a participação da Epagri, da Associação Catarinense dos Produtores de Alho (Acapa), da Câmara Setorial do Alho e Cooperativa Regional Agropecuária do Meio Oeste Catarinense (Copar), do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), da Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (Cidasc) e da Secretaria de Estado da Agricultura. Também participam as prefeituras de Curitibanos, Frei Rogério, Fraiburgo, Brunópolis, Monte Carlo, Lebon Régis e Caçador.

Queijo serrano dos Campos de Cima da Serra é um dos produtos catarinenses que já contam com Indicações Geográficas. Foto: Divulgação/Epagri

O grupo realizou levantamentos do diagnóstico da região e do produto, da organização da governança, da confirmação do nome geográfico, passando pela elaboração e definição do caderno de especificações técnicas, além de pesquisas científicas da qualidade e da organização documental. Atualmente, o processo está na fase final da elaboração do dossiê, com a autorização da área geográfica. A expectativa é que neste mês de abril seja efetuado o depósito do pedido de registro no INPI.

Sete produtos catarinenses já contam com Indicações Geográficas: vinho dos vales da Uva Goethe, banana da região de Corupá, queijo serrano dos Campos de Cima da Serra, vinhos de altitude de Santa Catarina, mel de melato de bracatinga, maçã Fuji de São Joaquim e erva-mate do Planalto Norte catarinense.

Regulamentação

O marco legal das Indicações Geográficas no Brasil é a Lei da Propriedade Industrial (nº 9.279/1996), que regula os direitos e obrigações sobre propriedade industrial e intelectual no Brasil. Atualmente, sua regulamentação segue a Portaria INPI/PR nº 04/2022, que estabelece as condições para o registro das IGs, sendo o INPI a instituição que concede o registro legal no país.

O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) é uma das instâncias de fomento das atividades e ações para indicação de produtos agropecuários. No Mapa, o suporte técnico aos processos de obtenção de registro de IG cabe à Coordenação de Agregação de Valor (CAV), vinculada à Coordenação-Geral de Cooperativismo, Associativismo Rural e Agregação de Valor (CGCOAV), do Departamento de Desenvolvimento das Cadeias Produtivas e de Indicações Geográficas (Decap) da Secretaria de Inovação, Desenvolvimento Sustentável, Irrigação e Cooperativismo (SDI).

O Mapa conta com orçamento próprio para incentivar a valorização dos produtos agropecuários por meio da utilização de signos distintivos. O Ministério oferece cursos; organiza seminários, reuniões e workshops; distribui materiais de divulgação; mapeia os produtos com potencial de identificação e promove parcerias institucionais.

> Conheça o Catálogo Brasileiro de Indicações Geográficas

Maykon Oliveira | maykon.oliveira@ufsc.br
Jornalista da Agecom | UFSC

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