UFSC aprova títulos a duas professoras por suas trajetórias de excelência e impacto social
O Conselho Universitário (CUn) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) realizou na tarde desta terça-feira, 28 de outubro, sessão especial – transmitida ao vivo pelo canal do CUn no YouTube – para apreciar duas concessões de títulos: Doutora Honoris Causa in memoriam e Professora Emérita -, ambas solicitadas pela Cátedra Antonieta de Barros: Educação para a Igualdade Racial.
Dora Lúcia de Lima Bertúlio
Em reconhecimento a sua trajetória e impacto, foi proposta a concessão do título de Doutora Honoris Causa in memoriam à docente Dora Lúcia de Lima Bertúlio, destacando sua relevância como jurista, ativista e intelectual na promoção da igualdade racial e na luta contra o racismo no Brasil. A relatoria foi da conselheira Maria Denize Henrique Casagrande.
O título de Doutor Honoris Causa é concedido pela UFSC “a pessoas eminentes, que não necessariamente sejam portadoras de um diploma universitário mas que se tenham destacado em determinada área (artes, ciências, filosofia, letras, promoção da paz, de causas humanitárias etc), por sua boa reputação, virtude, mérito ou ações de serviço que transcendam famílias, pessoas ou instituições”.
Dora Lúcia de Lima Bertúlio foi uma jurista, professora, ativista e intelectual catarinense, nascida em Itajaí, Santa Catarina, em 1949. Ao longo de sua vida, consolidou-se como uma referência na defesa da justiça social, na luta contra o racismo estrutural e na construção de políticas públicas voltadas à igualdade racial no Brasil. Graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Dora desenvolveu uma trajetória profissional e acadêmica marcada pelo compromisso com a democratização do acesso à educação e pela promoção da equidade racial no espaço jurídico.
Desde jovem, Dora demonstrou comprometimento com questões sociais. Aos 18 anos, foi aprovada em concurso público municipal e ingressou na Faculdade de Direito do Paraná, onde participou ativamente da militância estudantil. Durante a graduação, aprofundou seus estudos sobre questões políticas, mas o foco na questão racial só surgiu mais tarde, durante seu mestrado na UFSC. Nesse período, Dora começou a articular debates sobre raça e racismo, enfrentando com coragem a predominância da perspectiva de classe nos ambientes universitários. Sua dissertação, intitulada Direito e Relações Raciais: uma introdução crítica ao racismo, foi um marco na teoria crítica do Direito brasileiro, ao desafiar o pensamento jurídico tradicional e abordar as imbricações entre Direito, raça e racismo. A dissertação, defendida em uma sala repleta de pessoas negras que celebravam esse momento histórico, foi publicada como livro décadas depois, em 2019, consolidando seu impacto no campo jurídico.
Além de sua atuação acadêmica, Dora foi uma pioneira na implementação de políticas de ações afirmativas no ensino superior. Durante sua gestão como Procuradora Federal da Universidade Federal do Paraná, desempenhou um papel crucial na institucionalização das políticas de cotas raciais e sociais, tornando a UFPR uma das primeiras universidades brasileiras a adotar tais medidas. Essa atuação foi fundamental para a consolidação das ações afirmativas como instrumentos constitucionais e éticos no combate às desigualdades raciais no Brasil. Dora também colaborou com a Fundação Cultural Palmares, onde trabalhou na preservação e valorização das culturas afro-brasileiras, contribuindo para a formulação de políticas públicas voltadas à reparação histórica das comunidades negras.
Sua militância e compromisso com a equidade racial transcenderam o ambiente acadêmico e se manifestaram em diversas frentes. Dora participou da Conferência de Durban, onde assessorou a delegação oficial brasileira, e integrou a Comissão de Juristas instituída pela Presidência da Câmara dos Deputados, dedicada ao aperfeiçoamento da legislação contra o racismo estrutural e institucional. Sua atuação foi marcada por um profundo senso de responsabilidade e por uma visão interdisciplinar, que buscava unir o Direito à história, filosofia e outras áreas do conhecimento para compreender e enfrentar o racismo.
Dora também deixou sua marca como educadora e como fundadora de espaços de debate racial. Na Universidade Federal de Mato Grosso, criou, junto à professora Ana Maria Rodrigues Ribeiro, a Associação de Mulheres e Mulheres Negras, que mais tarde se transformou em um núcleo de estudos. Em Florianópolis, foi cofundadora do Núcleo de Estudos Negros (NEN), dedicado à promoção do letramento racial e à análise crítica das dimensões do racismo na sociedade brasileira.
Seu legado é marcado por sua capacidade de transformar suas experiências pessoais e profissionais em contribuições concretas para a luta contra o racismo. Dora enfrentou desafios, como a perda de suas pesquisas durante o doutorado, mas nunca desistiu de sua militância antirracista. Mesmo em seus últimos anos, continuou a influenciar a formulação de políticas públicas e o debate jurídico no Brasil. Dora Lúcia faleceu em 14 de fevereiro de 2025, aos 76 anos, mas suas ideias e contribuições permanecem vivas, ecoando nas universidades, tribunais e espaços de luta por justiça social. Seu nome é sinônimo de resistência, inovação e compromisso com a construção de um Brasil mais justo e igualitário.
Luzinete Simões Minella
O segundo título avaliado pelo Conselho Universitário foi a de Professora Emérita à Luzinete Simões Minella, a mais alta distinção honorífica concedida pela UFSC a docentes aposentadas que se destacaram por sua excelência acadêmica, por sua dedicação à causa pública e pelos relevantes serviços prestados à Universidade e à educação. A relatoria foi da conselheira Marlene Grade.
Luzinete Simões Minella é uma professora, pesquisadora e intelectual de destaque, cuja trajetória acadêmica, marcada pelo rigor científico e pela sensibilidade, consolidou sua importância no cenário nacional e internacional, especialmente nos campos dos estudos de gênero e feminismos. Graduada e mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), doutora em Sociologia pela Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM) e com pós-doutorado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Luzinete dedicou sua vida ao ensino, à pesquisa e à formação de novas gerações de cientistas sociais. Sua carreira acadêmica iniciou-se na UFBA, onde lecionou no Departamento de Sociologia entre 1975 e 1991. Posteriormente, transferiu-se para a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde atuou como professora do Departamento de Sociologia e Ciência Política e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política, contribuindo significativamente para a consolidação desses espaços como polos de excelência acadêmica.






























