UFSC na Mídia: Pesquisadores denunciam banco por lucrar com contrabando de africanos no século XIX

03/10/2023 08:45

Pintura de Debret ilustra período de escravidão; imagem meramente ilustrativa

O pós-doutorando da UFSC Clemente Penna, que atua junto ao Laboratório de História Social do Trabalho e da Cultura, e a professora do departamento de História Beatriz Mamigonian integram um grupo de 14 pesquisadores da escravidão e do tráfico de africanos que subscrevem uma ação do Ministério Público Federal pedindo reparação pela participação do Banco do Brasil nos negócios da escravidão no século XIX. A iniciativa repercutiu na imprensa e foi pauta da BBC e do podcast O Assunto.

No texto produzido pela rede britânica BBC e publicado pelo G1, explica-se que a ação é inédita no país e pretende iniciar um movimento de cobrança por reparação histórica de grandes e centenárias instituições brasileiras – estatais e privadas – que de alguma forma tenham participado ou fomentado a escravidão no país. Onze universidades estão envolvidas com os estudos. “Eles descobriram, por exemplo, que entre os fundadores e acionistas do BB estavam alguns dos mais notórios traficantes de escravizados da época – entre eles José Bernardino de Sá, tido como o maior contrabandista de africanos do período”, relata a reportagem.

O pesquisador Clemente Penna foi um dos entrevistados do podcast O Assunto e afirmou que espera que essa ação e as pesquisas que a embasaram sirvam, de fato, para fomentar esse debate. “A gente não pensa em sistema financeiro e escravidão, isso é uma discussão que é até relativamente recente […] e é um processo de silenciamento que quase produz uma inércia”, disse. Entre outras coisas, a ação registra que ao longo dos anos de 1833 e 1859, numa amostra de 2.275 penhoras judiciais que correram pelas mais diversas varas da justiça carioca, 65% dos litígios tiveram pelo menos um ser humano escravizado apreendido por ordem da justiça para garantir o pagamento de dívidas.

O estudo indica ainda que “parece não haver dúvidas que boa parte do capital que constituiu o maior banco do Império era oriundo do tráfico e dos negócios da escravidão”. Acrescenta, ainda, que o acionista do Banco do Brasil Bernardino de Sá, evidenciava, com seu destaque no quadro societário, a transferência dos capitais do tráfico e da escravidão para o setor financeiro, num movimento amplamente citado pela historiografia, mas, ainda, pouco estudado.

Conforme a reportagem da BBC, no documento enviado ao Banco do Brasil, o MPF estipulou um prazo de 20 dias para a presidência da instituição responder a uma série de questões, entre elas a posição do banco sobre sua relação com o tráfico de pessoas negras escravizadas, informações sobre financiamentos realizados pelo banco e relação com a escravidão, informações sobre traficantes de pessoas escravizadas e sua relação com o banco e iniciativas do banco com finalidades específicas de reparação em relação a esse período.