Pesquisadora da UFSC Blumenau estuda como cidades podem se recuperar de desastres
Usar indicadores para compreender as cidades e pensar em formas de torná-las mais resilientes e preparadas a possíveis desastres. As pesquisas da professora da UFSC Blumenau Franciely Velozo Aragão podem ajudar a orientar municípios para questões cada vez mais importantes em tempos de emergências climáticas. A mais recente delas foi publicada no International Journal of Disaster Risk Reduction, com pesquisadores da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). O estudo foi liderado pelas professoras Daiane Maria de Genaro Chiroli e Fernanda Cavicchioli Zola, da UTFPR.
A equipe usou como ponto de partida a norma técnica ISO 37123, que trata das cidades e comunidades sustentáveis, com indicadores para cidades resilientes. “Resiliência é a forma que uma cidade tem de reagir a possíveis riscos ou possíveis eventos catastróficos que ela possa sofrer. Então, para que a cidade seja resiliente, a gente sempre fala que ela precisa ser inteligente, porque ela precisa usar dados para conseguir prever esses possíveis riscos”, contextualiza a professora.
Esses dados podem ser obtidos e construídos a partir de variáveis estipuladas para possibilitar que a recuperação diante de desastres ocorra de uma forma rápida e sem prejuízos maiores. O grupo de pesquisadores reuniu estudos internacionais para mapear a evolução das pesquisas na área e identificar como essa questão é tratada pela comunidade científica do mundo todo.
“Para uma cidade ser resiliente, ela tem de ser inteligente também. Então, eu não consigo prever possíveis riscos se eu não tenho a capacidade de gerar e monitorar esses dados.Para ser inteligente, a cidade precisa conseguir captar dados e fazer com que gerem informações eficazes para prever possíveis desastres e se antecipar em relação a sua recuperação”, pondera Franciely.
Nos estudos analisados pelo grupo, há destaque para exemplos práticos. É o caso das cidades de Nova York e Taiwan. Na cidade dos Estados Unidos, por exemplo, pesquisadores indicam que, por estar muito exposta a interesses das elites, a cidade tem a sua infraestrutura verde condicionada às decisões dos residentes sobre pagar mais impostos por espaços resilientes e sustentáveis.
Em Taiwan, em contrapartida, estudos indicam que mesmo a região sendo suscetível a terremotos, a população não confia nas previsões e não se mostra disposta a pagar mais impostos pela política de redução do risco sísmico.”Hoje a gente tem muitas cidades ao redor do mundo que vem utilizando de muita tecnologia para fazer a antecipação desses desastres e o monitoramento de possíveis riscos dessas possíveis variáveis”, contextualiza a professora.
Tecnologia e indicadores como aliados
Ela explica que esses estudos levantados por seu grupo de trabalho tratam principalmente da utilização de tecnologias, como softwares e programas computacionais, para trabalhar no monitoramento das variáveis. “Dessa forma, é possível comunicar a população de forma praticamente imediata. Isso mostra que cidades ao redor do mundo, principalmente cidades que sofrem muito com desastres, estão utilizando dessa inteligência para se precaver e proteger a população”.
A pesquisadora também destaca o papel da sustentabilidade, já que, quando há características sustentáveis bem norteadas em um determinado espaço, as de resiliência urbana também costumam ser bem definidas. Para entender esses aspectos de forma sistemática é que se recorre aos indicadores. “Nós temos muitas cidades que se dizem sustentáveis e resilientes, mas muitas vezes elas não monitoram esses indicadores. E aí se tornam falhas”, pondera.
A norma técnica ISO 37123, foco do estudo do qual a professora participou, é a primeira que abrange um conjunto de indicadores voltados à cidades resilientes. Os pesquisadores explicam que ela surgiu em 2019, para auxiliar nos esforços de planejamento. “Este padrão internacional transmite definições precisas e referências avaliativas que padronizam os resultados esperados em relação às cidades resilientes e comunidades, fornecendo uma estrutura estruturada para dissecar os atributos de sistemas resilientes”, explicam, no artigo da International Journal of Disaster Risk Reduction.
Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que adaptou a norma à realidade brasileira, o objetivo principal da certificação é ajudar a atrair investimentos e impulsionar o desenvolvimento econômico com dados comparativos globais. O processo facilitaria a troca de informações e projetos através do compartilhamento de dados, permitindo comparações por meio de uma vasta gama de medidas de desempenho.
De acordo com a professora, diferentes cidades e regiões possuem diferentes problemas que podem ocasionar desastres ambientais. No caso do Sul, tanto as secas quanto as cheias costumam prejudicar as cidades e exigir respostas imediatas. “Essa alteração climática que provoca esses desastres ambientais acaba impactando de forma muito rápida as pessoas mais vulneráveis socialmente. Por isso, o foco desses estudos é prever e planejar como essas cidades precisam se tornar resilientes”.
Segundo o estudo, os próprios indicadores propostos na norma técnica são um caminho que as cidades podem percorrer para assumirem o compromisso com a resiliência baseada em dados. Articulando o eixo ambiental, social e econômico, a partir de indicadores relacionados desde ao planejamento urbano até o fornecimento de água, a pesquisa pode contribuir para que os municípios empreguem uma nova lente para se tornarem inteligentes, resilientes e sustentáveis.
Atualmente, o grupo de Franciely está desenvolvendo uma ferramenta de avaliação da maturidade das cidades com foco na sua sustentabilidade, inteligência e resiliência. “Essa ferramenta já está pronta e já foi testada em algumas cidades, então a gente vem estudando fortemente, principalmente com os alunos, em forma de pesquisa e criação de tecnologias”. Para os pesquisadores, conforme exposto na conclusão do estudo, “é necessário mais investimento para desenvolver a resiliência, particularmente na prevenção e recuperação de desastres, destacando os eixos sociais e ambientais do tripé da sustentabilidade e incentivando a participação da população nas decisões públicas”.
Amanda Miranda, jornalista da Agecom/UFSC
Imagem de Kammy27 por Pixabay
Imagem de Tomislav por Pixabay