Mesa sobre direitos e lutas das mulheres encerra colóquio internacional de gêneros
“Não existia tortura com roupa”. Foi com emoção que Maria Amélia de Almeida Teles, presa em 1972 pela Operação Bandeirante da ditadura militar, falou dos seis meses que permaneceu incomunicável, em poder do exército, no encerramento do I Colóquio Internacional Gênero, Feminismos e Ditaduras no Cone Sul, na noite de ontem. “Muita gente pensa que o Brasil não teve uma ditadura. Mas ela foi feroz e instituiu a tortura como estratégia política”, defendeu na mesa com o tema “Trajetórias de Mulheres na Luta contra as Ditaduras no Cone Sul “.
Filha de sindicalistas e ex-militante do PC do B, Amélia atuava no jornal “A classe operária”, editado pelo partido, e escrevia artigos sobre as mulheres. Foi na gráfica do periódico que os militares prenderam ela e o marido César, que, separados, passaram por diversas sessões de tortura para revelar nomes da direção do partido, o que ela afirma nunca terem feito. Além deles, Criméia Teles, irmã de Amélia, também foi detida e teve um dos filhos na prisão, em 1973. Em outubro do ano passado, a “família Teles”, como ficou conhecida, foi autora da primeira condenação de um militar do período a pagar indenização por sequestro e tortura, o coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra.
“Para os Direitos Humanos, colher depoimentos de testemunhas é fundamental, e foi assim que fizemos a ação”, conta Amélia, que destacou a importância do evento ser inédito e muito importante para “que histórias como essa sejam contadas”. Mesmo afirmando que não gosta de narrar as sessões de tortura, ela citou o dia em que os militares levaram os filhos para visitá-la, quando exibia uma série de marcas pelo corpo, resultado dos choques que havia tomado. “Meu filho olhou e perguntou: mãe, por que você está toda azul?”.
Coordenada pela professora Joana Maria Pedro, do Departamento de História da UFSC, a mesa aconteceu no auditório da reitoria da UFSC e também contou com a argentina Alejandra Ciriza, docente de Filosofia na Universidad Nacional de Cuyo, e Miriam Suarez, da Casa de la Mujer de Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia. “As mudanças que estão acontecendo na América Latina demonstram que toda a dor e o sofrimento de épocas ditatoriais não foram em vão”, avalia a boliviana. Mas ela alerta: “ainda há muito a se fazer, não conseguimos nos libertar”.
Por Júlio Ettore Suriano / Bolsista de Jornalismo na Agecom