De branco, a UFSC pede paz

16/04/2003 10:01

foto Jones Bastos

foto Jones Bastos

Um dia de paz na UFSC. Um dia marcado por bandeiras brancas, faixas brancas e mais de 2500 balões brancos espalhados por toda a universidade. Entre os mastros das bandeiras do Brasil, do Estado e da universidade, uma bandeira preta destoava. Era a lembrança amarga das milhares de mortes de iraquianos e iraquianas, provocadas pela arrogância de um único país. Um país que mentiu ao mundo e foi à guerra, destruindo tudo a sua volta, inclusive a idéia de

“liberdade”. E foi para repudiar a guerra e saudar a paz que as entidades da UFSC, em parceria com a administração, deram as mãos e realizaram juntos um momento único de reflexão e denúncia.

O público foi pequeno, poucas coisas são capazes de tirar os estudantes das aulas, os professores dos laboratórios, os técnico-administrativos das salas refrigeradas. Mesmo a guerra, o terror, as mortes, a destruição não tiveram força para mover as forças vivas da UFSC, que a cada dia perdem mais o seu contato com a realidade. Mas, quem veio para a frente da Concha Acústica pode ouvir palavras de dor, tristeza, repúdio e principalmente de esperança.

O professor do departamento de Direito, Paulo Roney Ávila Fagundes, lembrou que não basta falar de paz sem que haja um gesto concreto para isso. “Queremos paz mas fazemos a guerra. A universidade mesma não contribui para a paz quando fragmenta saberes, quando permite o exercício do poder sobre o saber. A paz vem de uma cultura da ética e da tolerância. A violência vem da casa, vem da medicina descolada da vida, da distância da filosofia e da ética das coisas reais”.

Paulo ainda fez questão de frisar que a questão principal é a educação. “Bush estudou em Havard, mas lá se ensina para o mercado, não forma seres éticos capazes de interagirem com a natureza. É uma escola de monstros. Nós precisamos de uma escola que eduque para a paz, que respeite o equilíbrio entre a sombra e a luz. Não dá para falar de paz se ainda comemos cadáveres e não respeitamos a natureza”.

A professora do departamento de Filosofia, Sônia Felipe, trouxe um pouco da história dos direitos humanos. Ressaltou que tanto os estadunidenses quanto os franceses quando fizeram sua independência e declaração de direitos, o fizeram em nome da igualdade sim, mas a igualdade deles, para eles, homens, brancos, iguais. Nunca pensaram em igualar mulheres, negros, índios, animais. Por isso, hoje fazem a guerra ainda em nome desses ideais. Não são direitos universais, que valem para todos, são particulares. Tanto que fazem a guerra em nome da paz, deles. Os que mandam. Sônia deixou claro que a intolerância, a violência, a guerra não vão terminar enquanto os seres humanos não forem capazes de distribuir de forma igualitária os bens sociais primários, enquanto não reconhecerem que a igualdade não diz respeito só aos seus iguais na cor ou na origem, mas a toda espécie, sem distinção.

O pastor Luiz Sabanay falou de seu próprio conflito, já que a cristantade a qual representa também tem causado tanta dor e violência ao longo dos anos. Lembrou que vivemos num mundo cuja cultura dominante impede a paz. “Como fazer quando a entrada na universidade por exemplo se dá por competição? A nossa cultura parece que não sabe existir na paz. Só agora, neste momento, existem, além da guerra no Iraque, mais de 90 focos de guerra no mundo. Por isso

precisamos de gestos concretos pela paz”.

Apesar de toda a dor que um conflito como esse do Iraque causa, Sabanay vê a esperança caminhando. “Este é um momento único. Há uma resistência inconformada contra a guerra em todo o planeta, na qual a pessoas gritam que não querem viver nesse mundo. Isso pode mudar toda uma cultura. É um momento de transformação. E cada um de nós tem que encontrar o gesto, a alternativa de mudar isso tudo. Fazer nossa parte e aprender a conviver com as pessoas e a natureza”.

Logo após as falas, a Concha foi tomada pela música e aí o pequeno público pode vibrar na energia da paz e ligar, amorosamente, suas mentes com o resto dos milhões de seres humanos que estão nas ruas do mundo gritando contra a guerra, contra o absurdo do ataque estadunidense ao Iraque, contra a cultura do terror.