ESPECIAL PESQUISA: Consumo de medicamentos em comunidades indígenas é tema de dois estudos da UFSC

11/09/2007 15:36

Duas pesquisas coordenadas pela professora Eliana Diehl, do Departamento de Ciências Farmacêuticas do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da UFSC, pretendem mostrar como acontece o consumo de remédios industrializados em três comunidades indígenas de Santa Catarina. Através da abordagem conjunta de aspectos antropológicos e epidemiológicos, a professora procura traçar o perfil do consumo e as percepções que os próprios usuários têm sobre esse tipo de remédio.

Os projetos “Medicamentos no contexto local indígena Guarani (litoral de Santa Catarina)” e “Medicamentos nos contextos locais Kaingáng e Xokleng (Santa Catarina)” estão inseridos no Programa de Pós-Graduação em Farmácia e fazem parte do Grupo de Pesquisa “Medicamentos em Contextos Locais Indígenas”, do Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil, organizado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Liderado por Diehl, esse grupo procura desenvolver pesquisas que envolvem as percepções e usos de medicamentos por diferentes povos indígenas brasileiros, tendo como referenciais teóricos e metodológicos a antropologia e a saúde pública/epidemiologia. “Além de contribuir para as pesquisas nessa área, que são muito escassas, os dados coletados podem ajudar a melhorar o atendimento à saúde em comunidades indígenas”, explica Diehl.

Remédio da farmácia

Trabalhando com a perspectiva de que existem diferentes formas terapêuticas para tratar um mesmo problema, a pesquisa quer verificar de que forma os remédios industrializados são apropriados e utilizados por essas comunidades. “Eles reinterpretam os medicamentos a partir do uso cotidiano”, diz a professora. A existência desses medicamentos, entretanto, não resulta em desprezo pelo conhecimento tradicional. Diehl afirma que os índios “usam e gostam do ‘remédio da farmácia’, assim como também podem ir ao curandeiro e tomar ‘remédios do mato’”.

Em uma aldeia Kaingáng, a professora encontrou a ilustração perfeita da convivência entre os conhecimentos científico e tradicional. Em entrevista, um “curador” lhe descreveu o preparo de um remédio contendo algumas plantas, noz moscada, cravo, canela e Novalgina®. À receita aprendida com o pai, ele acrescentou o remédio industrializado por sugestão da mulher. “Ela teria se consultado em um hospital, quando alguém disse que esse remédio era bom para o coração e para os nervos.” O que era um analgésico e antitérmico foi então resignificado pela experiência e passou a ser entendido como um medicamento que “acalma o coração”.

Os projetos contam com as colaborações de Jean Langdon, professora do Departamento de Antropologia da UFSC, e do Núcleo de Estudos de Saúde e Saberes Indígenas (NESSI), do qual a professora Eliana faz parte. Para ela, essa interdisciplinaridade permite que, ao final do trabalho, tenha-se “um retrato farmacoepidemiológico contextualizado pela visão antropológica, contribuindo para a consideração de que são legítimos outros saberes no campo da saúde e não somente aqueles delimitados pelo saber médico oficial”.

Saiba Mais

Medicamentos no contexto local indígena Guarani (litoral de Santa Catarina)

Iniciado em 2006, o projeto tem a colaboração da mestranda Francielly Grassi, do Programa de Pós-Graduação em Farmácia. Já na segunda coleta de dados, a pesquisa está sendo feita na Comunidade Guarani do Morro dos Cavalos, que ainda não é uma terra indígena legalmente reconhecida. Financiado pela Fundação de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do Estado de Santa Catarina (Fapesc), o trabalho esteve presente na 6ª Semana de Ensino Pesquisa e Extensão da UFSC e voltará a ser apresentado em outubro, no 2º Congresso Brasileiro Sobre o Uso Racional de Medicamentos.

Medicamentos nos contextos locais Kaingáng e Xokleng (Santa Catarina)

Iniciada este ano, a pesquisa é uma continuidade da tese de doutorado da professora Eliana Diehl e tem a colaboração das estudantes de graduação Maria Carolina Bortolli e Fernanda Manzini, bolsistas voluntárias de Iniciação Científica. Financiado por um edital conjunto do Ministério da Saúde e do CNPq para pesquisas direcionadas ao estudo sobre saúde dos povos indígenas, o trabalho compara os resultados encontrados pela professora entre 1997 e 2001 com o contexto atual. Por enquanto foram recolhidos dados na Terra Indígena Xapecó, localizada nos municípios de Ipuaçu e Entre Rios, que possui 11 aldeias Kaingáng. Os resultados preliminares já foram apresentados no 4º Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, realizado em Salvador, e na 7ª Reunião de Antropologia do Mercosul, realizada em Porto Alegre. A pesquisa com os Xokleng, da região de Ibirama, deve começar no próximo ano.

Por Daniel Ludwich / Bolsista de Jornalismo na Agecom

Mais informações:

Eliana Diehl – elianadiehl@hotmail.com – 48 3721-5077

Francielly Grassi – franciellygrassi@hotmail.com – 48 3721-5077