Conferência na UFSC debate memória e cultura no III Fórum Nacional de Museus
Museus e memória são conceitos tão próximos que parecem se fundir. Uma das três conferências do III Fórum Nacional de Museus teve como tema ´Memória, Cultura e Sociedade`. Os conferencistas foram Ulpiano Bezerra de Menezes e Fernando Pinheiro, ambos da USP. O evento foi realizado na quarta-feira, dia 9 de julho, no auditório Garapuvu, no Centro de Cultura e Eventos da UFSC.

Ulpiano Bezerra de Menezes
Para Ulpiano, o compromisso social do museu é contribuir para a formação do espírito crítico. A memória funciona como uma possibilidade de se fazer projetos e se articula com a linguagem, permitindo a partilha da experiência, que por sua vez se significa através de objetos e valores.
Em sua opinião, memória, linguagem e artefato formam, portanto, um tripé essencial. A pergunta que se deve fazer é: como opera a memória? Quais os efeitos no sistema que a fazem circular? Para o professor, mais importante que a relação com o passado é a relação com o tempo, a temporalidade que varia de cultura para cultura e em cada época. Estas perspectivas têm realçado a importância do outro – componentes além da memória da linguagem, como a memória corporal, memórias corporificadas.
A memória terceirizada, industrializada é a que tem se propagado pela internet. A história do século XIX era política e foi transformada em história social para atender às novas perspectivas, depois se tornou etnográfica, depois cultural, até se desfazer nas migalhas da história: história dos negros, história das mulheres, história das minorias, dentre outras, o que gerou também um estilhaçamento da memória.
Houve o tempo em que os monumentos eram os representantes da memória. Na França houve o fenômeno da estatuomania. A cidade, hoje, não precisa mais disso. O monumento não é mais o espaço de convergência da cidade, porque as narrativas que o constituíam não são mais convergentes. As construções de monumentos, atualmente, são cada vez mais subjetivadas.
Sobre a memória x esquecimento o pesquisador contou que para se falar sobre o tema, costuma-se citar o conto de Borges sobre o indivíduo que era incapaz de esquecer, mas esta capacidade lhe tirava a humanidade, porque é característica do humano o esquecimento. O tema da amnésia social tem voltado à tona e para Ulpiano é fundamental destacar a memória trauma, a memória insuportável, da ferida que não cicatriza. Neste campo de estudo a memória está passando das questões cognitivas para as questões éticas: o conflito entre o dever da memória e o direito ao esquecimento.
As sociedades definem sua “memorabilidade” , isto é o mecanismos e critérios para a “dicibilidade” – o que pode ser dito e a visibilidade, o que pode ser mostrado, visto.
Para o conferencista um dos atos mais importantes desta anistia – que vem da mesma raiz da palavra amnésia – é o perdão como ato político, sublinhando que aí se vai até à raiz da palavra “perdone” – dar através de.O perdão constitui, por excelência do trabalho de memória enfrentar a perda, o luto, como na proposta primeira da psicanálise.É preciso que o luto seja vivido, maneira de não reprimir a perda, mas de resolvê-la.
Citou como exemplo os tribunais constituídos na África do Sul, pós apartheid que em vez de julgamento eram espaços em que algozes e vítimas contavam suas histórias. Para que isto aconteça é necessário politizar a memória.
Memória e história não se equivalem. A história é um procedimento cognitivo e intersubjetivo, mas é um procedimento indispensável para a formação crítica.
Por Alita Diana/jornalista da Agecom