“Paredes Pintadas”, documentário sobre mulheres guerrilheiras, estreia na TV UFSC

29/07/2010 09:58

Nesta quinta-feira, às 20h30, a TV UFSC exibe ‘Paredes Pintadas’, documentário que traz a história de quatro guerrilheiras brasileiras que lutaram contra o regime militar vigente no país. Mais de 40 anos depois, Dulce, Sonia, Renata e Damaris contam suas lembranças dos dias em que se uniram à Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) na luta contra o governo das Forças Armadas. (Assista ao trailer no youtube).

Em seus depoimentos, elas lembram da constante tensão dos dias em que viviam escondidas, na ilegalidade, utilizando nomes falsos e sem poder voltar para casa. Contam das ações e planos contra o governo, das torturas e ameaças sofridas na prisão e do exílio após a derrota do movimento.

O vídeo, produzido pelo jornalista Pedro Santos, é atração no Primeiro Plano, programa de reportagens e documentários feitos por alunos do curso de Jornalismo da universidade.

Pedro fala um pouco sobre a produção de Paredes Pintadas e sobre os motivos que o levaram à escolha do tema e dos personagens de seu Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado no primeiro semestre deste ano.

Como se deu a escolha do tema?

Em 2008, eu tive a oportunidade de fazer um intercâmbio para a cidade de Córdoba, na Argentina. Ali, tive oportunidade de conhecer e cobrir diversas organizações de Direitos Humanos, como as Abuelas de Plaza de Mayo, as Madres, a organização H.I.J.O.S., Familiares de Desaparecidos y Detenidos por Razones Políticas, entre outras. Comecei a tomar contato com uma série de movimentos para a preservação da memória. Cobri, para a revista eletrônica Ponto-e-Vírgula (www.revistapontoevirgula.com), o julgamento de um ex-comandante do Exército na época da ditadura argentina (1976-83), Benjamín Menendez. Enfim, fui tomando conhecimento das histórias da época e de toda a mobilização dos jovens de hoje para não esquecer tudo o que aconteceu naquele período. Então comecei a me perguntar: e no Brasil? Quando voltei, estava decidido a fazer um trabalho que trouxesse à tona certas histórias, detalhes, versões, pessoas que viveram aquele período da ditadura no Brasil. A partir disso, optei por retratar mulheres, guerrilheiras, que se engajaram para combater algo pelo qual elas achavam que valia a pena lutar.

Por que a escolha do suporte vídeo?

Sempre quis trabalhar com documentário e essa era uma área que eu tinha explorado pouco no decorrer das disciplinas do curso de Jornalismo da UFSC. Era um desafio tratar o tema que eu escolhi a partir de imagens. Acho que esse é um documentário de palavras. De como a memória se dá, com o passar dos anos e a partir fatos traumáticos, como ela se reconstroi pelo tempo e como ela é expressada na hora em que a pessoa fala, se lembra, olha, respira, os gestos… Me interessava fazer com que as pessoas tivessem, de algum modo, principalmente os jovens que não viveram naquela época, uma experiência audiovisual sobre uma história de quatro mulheres que lutaram contra um regime autoritário. Daí a opção de integrar a fala delas, as palavras, com imagens de arquivo, uso de imagens mais subjetivas, que evocassem passagem, tempo, exílio, memórias passadas, mas nunca perdidas, além do escuro, da tela preta, dos sons agudos… Tudo para compor uma experiência para o espectador a partir da história pessoal daquelas mulheres.

Por que falar do regime militar pelo olhar dessas quatro mulheres?

Basicamente porque as mulheres nos anos 60 viviam um auge de emancipação, de liberação de pensamento, revolução sexual, modo de pensar diferente de como pensavam as mulheres de gerações passadas. Tudo isso em uma sociedade machista, muito mais machista do que é hoje. Elas lutaram muito para conquistar os direitos que elas possuem hoje. E me chamou a atenção a forma como aquelas mulheres, as mulheres que eu entrevistei, lutaram como outros militantes da luta armada, mas ainda mais pelo fato de serem mulheres, de desafiarem um pensamento corrente na sociedade da época, enfim. Era como ser mulher, o simples fato de ser do sexo feminino, já fizesse com que tivessem que nascer lutando, pelo direito de pensar, de viver, de acreditar. E isso as fez, aparentemente, mais fortes do que muitos homens que também lutaram em organizações de luta armada. Vários dos que eu entrevistei chamaram a atenção para o fato de que muitas mulheres eram mais fortes do que eles, principalmente no campo emocional e psicológico. Mas isso, essa escolha, só foi possível para mim porque, na minha vida, eu sempre tive figuras femininas muito marcantes, mulheres lutadoras, dispostas a lutar pelo que acreditam. Particularmente minha mãe, minha irmã e minha namorada, que são as mulheres para quem eu dediquei o documentário. Como você as achou? Como entrou em contato com elas? Quando você começa a pesquisar muito um tema – e comigo a parte da pesquisa foi bem extensa e cansativa – nomes começam a surgir e você vai conhecendo muitas histórias. Depois disso, o trabalho é de garimpar e escolher. Cheguei nos nomes a partir de pesquisas para o documentário. Selecionei as quatro mulheres que participavam da mesma organização, a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e que se conheciam entre si. Aí, com a ajuda de pessoas mais experientes no tema, como amigos jornalistas, uma professora da História, Mariana Joffily, entre outros, consegui os telefones e contatos pela internet.

Quais foram as maiores dificuldades enfrentadas por você durante a realização do trabalho?

Alguns eventos imprevistos quase comprometeram o resultado final. A começar pelas chuvas do final do ano, quando já estavam marcadas as primeiras filmagens na cidade de Cunha, interior de São Paulo. As chuvas destruíram a cidade, a estrada foi bloqueada e minha entrevistada, a Dulce, não pôde nos receber para a gravação. Tive que esperar alguns meses para voltar. Depois, alguns dos entrevistados mudavam muito a agenda de filmagem, por conta de imprevistos e outros afazeres. No Rio de Janeiro, viajávamos eu e Caroline Santos (fotografia) quando ocorreu aquela chuva que destruiu parte da cidade. Chegamos em Niterói e estava tudo alagado, intransitável, não tinha nem como sair da rodoviária. A única opção era pegar o ônibus de volta. Enfim, alguns outros imprevistos fizeram com que a produção tivesse que se refazer a todo momento. E isso foi interessante porque em qualquer produção independente você está sempre sujeito a essas mudanças bruscas, que te fazem ter que repensar e retrabalhar todo o cronograma, o orçamento, etc. Foi uma grande lição de como produzir projetos.

O que você mais gostou no documentário?

É muito difícil falar do próprio trabalho. Se eu tivesse que escolher, eu diria que o mais bacana foi a trilha sonora. Eu estava sem música, já muito preocupado em encontrar uma voz, uma música, alguma melodia que fosse. Foi aí que entrei em contato com Leonardo Netto, assessor de Marisa Monte. Foi bem por acaso, eu escrevi pra ele e ele respondeu. Fui bem cara de pau e perguntei se a Marisa topava gravar uma música para a trilha sonora. Daí ele respondeu que ela estava afastada de atividades profissionais, mas que cederia uma ou outra canção dela para usarmos no documentário. Passei a madrugada escutando a discografia da Marisa Monte até chegar na música “Pelo Tempo que Durar”, que era a ideal para a cena do exílio, quando as entrevistadas falam das mudanças, das novas perspectivas, de novas descobertas. Em alguns dias veio um contrato da EMI, gravadora do Rio de Janeiro, e acertamos que eles cederiam os direitos da canção para ser usada no documentário. Foi muito legal!

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Fonte: Tadeu Sposito(tadeusposito@gmail.com) – TV UFSC.