Palestra mostra como buracos negros são importantes para estudo da arquitetura do universo

17/04/2009 14:04

Após a palestra, 1h20min de perguntas

Após a palestra, 1h20min de perguntas

Buracos negros deixaram de ser um fenômeno curioso. Passaram a ser vistos como parte das galáxias, influenciando e sendo influenciados por sua evolução. Atualmente são focos da astronomia em que o conhecimento vem evoluindo e se mostrando como chave para o estudo da arquitetura do universo.

Essa é uma das mensagens que o professor João Steiner, do Instituto Astronômico e Geofísico da Universidade de São Paulo (IAG-USP), deixou na palestra ´Buracos negros, cemitérios cósmicos`, ministrada na UFSC na segunda-feira (13/4), dentro da série de encontros comemorativos ao Ano Internacional da Astronomia. Sua fala teve duração de cerca de uma hora – e se prolongou por mais 1h20min, para atender aos questionamentos da platéia, formada não apenas por físicos e astrônomos, mas por professores e estudantes de ciências biológicas, engenharia, letras e economia, entre outras áreas, além de pessoas da comunidade.

Steiner mostrou, com o cuidado de se fazer entender pelo público variado, que a idéia de buracos negros surgiu em 1905, com o trabalho sobre a Teoria da Relatividade Geral, de Albert Einstein (a abordagem sobre espaço e tempo está na base que permitiu supor a existência de buracos negros). A construção desse conceito teve também a colaboração do astrônomo Karl Schwarzschild, que propôs fórmulas matemáticas para as teorias de Einstein. Schwarzschild demonstrou, em equações, que se a massa de uma estrela estiver concentrada em uma região suficientemente pequena, ela gera um campo gravitacional tão grande na superfície que nem mesmo a luz conseguirá escapar.

“Surgiu nessa época a idéia de que quando a matéria é muito densa há uma ocorrência estranha, uma singularidade que faz com que ao seu redor ocorra uma aceleração infinita”, explicou o professor, lembrando que nessa época tudo estava somente no plano teórico. Era apenas uma solução matemática. Einstein e muitos físicos não acreditavam que esse fenômeno pudesse acontecer na natureza.

“Mas alguns astrofísicos começaram a achar que essa singularidade poderia ocorrer. Outros objetos muito densos já haviam sido detectados, como as estrelas anãs brancas, ou as estrelas de nêutrons, corpos celestes muito densos”, contou o professor, que em sua palestra falou sobre o que são os buracos negros, como se formam e qual a influência que exercem sobre outros corpos celestes.

Para explicar a formação dos buracos negros, lembrou que estrelas morrem e se transformam, e que a astronomia já há algum tempo tem domínio sobre esse ciclo. “O Sol está queimando há cinco bilhões de anos. Deve levar outros cinco para morrer. Hoje sabemos com clareza o que vai acontecer com as estrelas”, destacou.

No caso de estrelas de massa pequena, como o Sol, a tendência é de que a parte central colapse e se forme uma anã branca, com densidade da ordem de um milhão de vezes a da água – dimensão admirável para nossos padrões, mas pequena para o contexto astronômico.

”Quando a estrela tem massa de 8 a 10 vezes a do sol ela não morre dessa maneira. Ela explode de forma muito violenta. A matéria é ejetada a 10 mil quilômetros por segundo e brilha tanto quanto uma galáxia inteira, que é formada por cerca de 100 bilhões de estrelas. Aí então forma uma supernova”, explicou o professor. Estas estrelas supermassivas podem levar a uma outra forma de morte cósmica: a formação de uma estrela de nêutrons. Esse corpo celeste tem densidade de 100 trilhões de vezes a da água, e elétrons e prótons não “sobrevivem”, apenas os nêutrons.

“Então vimos que há duas categorias de estrelas mortas: as anãs brancas e as estrelas de nêutrons. A terceira são os buracos negros, corpos celestes ainda mais densos do que as estrelas de nêutrons e que permitem que aconteça a singularidade de Schwarzschild: a aceleração em torno da estrela é infinita e a luz não consegue sair”, detalhou o professor, complementando que a astronomia capta esse fenômeno a partir do que acontece em sua vizinhança – pois a força é tão violenta que pode sugar estrelas.

O primeiro caso foi descoberto em 1973. E o palestrante lembrou que sua dissertação foi direcionada ao estudo desse buraco negro, propondo um modelo teórico para explicá-lo. “No início imaginamos que iríamos achar milhares de buracos negros. Não foi bem assim. Na Via Láctea, nossa Galáxia, que tem 100 bilhões de estrelas, foi encontrada meia dúzia de buracos negros em 30 anos de pesquisas”, informou.

Sua palestra mostrou como a pesquisa vem evoluindo e permitindo um entendimento cada vez maior sobre estes corpos celestes. Hoje se sabe, por exemplo, que a maioria das galáxias de grande massa (1 trilhão de vezes a massa do sol) têm um buraco negro no seu centro. E se até poucos anos atrás os estudos indicavam que todos os buracos negros estavam no centro das galáxias, hoje se sabe que não é bem assim. “Estudo recente do IAG, com imagens do telescópio Gemini, mapeou um buraco negro que não está no centro. Supõe-se que houve canibalismo entre galáxias, deslocando o buraco”, explicou o professor. Foram também documentadas, a partir de 2007, evidências de fusão de buracos negros e de sua presença fora das galáxias.

Mas muitas questões são incertas, frisou Steiner. Segundo ele, a evolução do conhecimento no campo da astronomia permite que se vislumbre a possibilidade de que durante o Big Bang se formaram buracos negros e estes serviram de sementes para as galáxias. Outra linha de pensamento propõe que o aparecimento destes corpos celestes está relacionada à morte e colisão de milhares de estrelas – e daí a escolha do título da palestra: ´Buracos negros, cemitérios cósmicos`.

O palestrante

João Evangelista Steiner é pesquisador reconhecido no país e também internacionalmente por sua contribuição para a astronomia. Entre 1993 e 1997 foi membro do grupo internacional envolvido no projeto Gemini, que permitiu a construção de observatórios no Havaí e no Chile. De 1996 a 1997 esteve na vice-presidência desse grupo. Foi também, de 1996 a 2004, membro do conselho diretor do consórcio que construiu o telescópio SOAR, um dos mais modernos do mundo. Entre 2003 e 2004 respondeu pela presidência desse conselho.

Especialista em astrofísica estelar, galáxias, quasares e astronomia óptica, tem 83 artigos publicados em revistas internacionais. Seu currículo inclui passagens pela direção do Instituto de Estudos Avançados da USP; pela presidência da Sociedade Astronômica Brasileira; secretaria geral da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência; direção de Ciências Espaciais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e do Laboratório Nacional de Astrofísica. Foi também secretário de coordenação das unidades de pesquisa do Ministério de Ciência e Tecnologia.

Este ano coordena um projeto contemplado no programa Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia, para implantação de um Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Astrofísica. A missão do grupo que agrega pesquisadores de diversas universidades brasileiras é inserir o Brasil no futuro da astronomia mundial.

Próximo encontro

A próxima palestra do ciclo será realizada no dia 13 de maio, no auditório da Reitoria da UFSC. O convidado é o professor Renan Medeiros, do Departamento de Física Teórica e Experimental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, fala sobre ´Os Novos Mundos do Cosmos`. A organização do ciclo é do professor Antônio Kanaan, do Grupo de Astrofísica, ligado ao Departamento de Física da UFSC.

Mais informações sobre o ciclo de palestras: astro@astro.ufsc.br / fone 3721-8238

Por Arley Reis / Jornalista da Agecom

Fotos: Paulo Noronha / Agecom

Acompanhe a agenda:

Março / 30/03 Jorge Quilffeldt – Instituto de Biociências / Universidade Federal do Rio Grande do Sul – ´Astrobiologia : Água e Vida no Sistema Solar e além`

Abril / 13/04 João Steiner – Instituto Astronômico e Geofísico da Universidade de São Paulo (IAG-USP) – ´Buracos negros, cemitérios cósmicos`

Maio / 13/5 Renan Medeiros – Departamento de Física Teórica e Experimental da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (DFTE/UFRN) – ´Os Novos Mundos do Cosmos`

Junho/ Carlos Wuensche – Divisão de Astrofísica / Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)

Agosto Guillermo Tenório-Taglia

Setembro Augusto Damineli – Instituto Astronômico e Geofísico da Universidade de São Paulo (IAG-USP) – “Procura de vida fora da Terra”

Outubro Kepler Oliveira – Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IF/UFRGS)

Novembro Laerte Sodré – Instituto Astronômico e Geofísico da Universidade de São Paulo (IAG-USP) – “Sosias da Via-Lactea”

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